E a opinião pública?
Correio Braziliense [Editorial] - 08/05/2009 |
Em meio a tantos escândalos no Congresso Nacional, é emblemático e perigoso o desabafo do deputado Sérgio Moraes (PTB-RS) em relação ao processo de cassação por quebra do decoro parlamentar que relata no Conselho de Ética da Câmara contra o colega Edmar Moreira (sem partido, MG). Para quem não se lembra, o político mineiro é o dono do castelo de R$ 25 milhões que usou verba indenizatória para pagar R$ 230,6 milhões a empresas de segurança de propriedade dele mesmo. Pois, para defendê-lo, Moraes não titubeou em declarar que esta se “lixando para a opinião pública”. Depois dos atos desabonadores cuspidos nos últimos meses do Poder Legislativo federal como larvas de um vulcão prestes a explodir, as palavras do deputado gaúcho soam estridentes como o estopim de um tiro disparado contra a democracia. São uma pá de cal na desmoralização da representação parlamentar em andamento na atual legislatura. Corroboram para a cristalização do sentimento de que essa é uma postura generalizada no Legislativo. Carecem, portanto, de resposta dos seus pares à altura. O que, convenhamos, tarda. A sociedade espera mais do que uma ou outra reação dispersa. É a instituição que deve reprovar, clara e inequivocadamente, a fala de um dos seus encarregados pela ética. Sérgio Moraes é marinheiro de primeira viagem na Câmara dos Deputados, mas está longe de ser estreante na política. Ao contrário, faz carreira tradicional. Começou em 1982, como vereador de Santa Cruz do Sul, reeleito em 1989. Na sequência, conquistou dois mandatos de deputado estadual e dois de prefeito do município, até ganhar o palco de Brasília, em 2007. Tamanho sucesso tem dimensão proporcional ao da folha corrida, que inclui uma condenação, com a mulher, por favorecimento à prostituição. Graças a acordo na Justiça, escapou de ser condenado também por agressão, além de se livrar, por falta de provas, de processos por lenocídio e receptação. Se o eleitorado do Rio Grande do Sul não deu importância a tal currículo, os deputados federais não poderiam ignorá-lo um ano atrás, quando tiveram a audácia de entregar a Moraes a Presidência do Conselho de Ética da Câmara. Mas não só o fizeram, como ainda alçaram Moreira, o do castelo, à Segunda Vice-Presidência e ao cargo de corregedor da Casa. Pior: como agora, fizeram ouvidos moucos quando o encarregado de julgar os pares disse em alto e bom som, tão logo tomou posse, ser contra o julgamento de parlamentares pelos próprios colegas, assumindo que deputados “têm o vício da amizade”. Nesse contexto, a pergunta que não quer calar é se não estão todos ali se lixando para a opinião pública. É trágico que a incipiente democracia nacional seja bombardeada justo por aqueles que a deveriam escudar. Mas a sociedade não esperará sentada por uma resposta. Antes, a indignação já toma o vulto de comoção nacional, de resultados imprevisíveis. De um lado, há a esperança — utópica, vez que se eterniza — de que o mau cheiro da podridão presente acompanhe o eleitor até as urnas em 2010 e o desperte para a responsabilidade da escolha. De outro, é grave o temor de que o desprezo não chame o brasileiro à consciência, tenha efeito bumerangue e se volte contra a instituição. A única saída é extirpar cada um dos muitos tumores malignos que infestam a Casa. Se o Congresso não parece disposto a cortar a própria carne, as entidades organizadas do país devem se apressar a dar sua colaboração. --------------------- (*) Nenhuma relação com o compositor baiano Moraes Moreira, ex-integrante do grupo musical ''Novos Baianos''. ------------ |