Internacional
De olhos bem fechados
Dissidente tem o mau gosto de morrer bem no dia em que Lula chegou a Cuba. Mas, se tivesse avisado antes, o presidente "teria pedido para ele parar a greve de fome"
Ricardo Stuckert/PR |
JUVENTUDE SOCIALISTA Lula afaga Fidel: bem de saúde e no pleno domínio do notório saber econômico. |
Lula foi visitar os irmãos ditadores, Fidel, o afastado, e Raúl Castro, o ativo no comando. Ao receber o presidente e sua sorridente comitiva, Raúl, ao contrário de Lula, não culpou o morto. De quem foi a culpa? Dos americanos. "Isso se deve à confrontação que temos com os Estados Unidos. Aqui não houve nenhuma execução extrajudicial." Mais sorrisos, mais alegria.
A morte de Zapata já era esperada por seus companheiros de oposição. Ele estava tão exaurido que não haveria mais retorno. Mesmo assim, tentaram se comunicar por carta com o visitante ilustre para pedir ajuda. Mas cometeram um grave erro de etiqueta. As declarações do presidente Lula a respeito: "As pessoas precisam parar com o hábito de fazer cartas, guardar para si e depois dizer que mandaram para os outros. Quando uma pessoa manda uma carta para um presidente, no mínimo, só pode dizer que o presidente a recebeu se protocolar a carta".
O autor da carta em questão é o economista cubano Oscar Espinosa Chepe. Preso em 2003 com Zapata, foi solto mais tarde, por problemas de saúde. Chepe consultou 42 prisioneiros políticos e escreveu um apelo ao presidente brasileiro. Na quinta-feira, dia 18, ligou para a Embaixada do Brasil em Havana e apresentou o pedido de uma reunião com o embaixador para entregar a carta. "Nossa política é de não receber dissidentes cubanos", disse a secretária, segundo seu relato. "Eu achei que Lula, por ter sido um trabalhador preso injustamente, iria se solidarizar conosco. Sua reação foi uma surpresa para todos", disse Chepe a VEJA.
Adalberto Roque/AFP |
ZAPATA VIVE Oposicionista morre depois de 85 dias de greve de fome. |
Quando querem ser acolhidos, os dissidentes cubanos sabem que precisam bater na porta da Embaixada dos Estados Unidos ou de países da União Europeia, mesmo ao custo de serem rotulados de agentes do imperialismo. A ideia de que qualquer um que se oponha ao eixo cubano-venezuelano seja um servo dos interesses americanos tem uma história longa no arsenal de ofensas destinadas a desqualificar, por princípio, qualquer adversário. Veja-se o que o PT, através do documento "A política externa do governo Lula", tem a dizer a respeito: "A política externa implementada pelo governo Lula é uma política de estado. Mas parcela da classe dominante brasileira rejeita os fundamentos desta política, conferindo reduzida importância à integração regional, desejando menor protagonismo multilateral e preferindo maior subordinação aos interesses dos EUA".
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http://veja.abril.com.br/030310/olhos-bem-fechados-p-084.shtml
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