'Se expressar artisticamente é fundamental para o jovem'
O secretário da Cultura do Estado de São Paulo, João Sayad, gosta de música erudita, mas não gosta de hip hop. Aprova o grafite, mas não gostaria de ver a casa grafitada. Ele fala sobre preferências e trabalho ao JT
João Sayad, secretário da Cultura do Estado de São Paulo, não é muito de dar entrevistas. O homem que já foi ministro do Planejamento no governo José Sarney, secretário de Finanças e Desenvolvimento Econômico e da Fazenda na Cidade, é de poucas palavras. Só agora, durante o anuncio de um investimento de quase R$ 50 milhões na criação da São Paulo Companhia de Dança e na construção do Teatro de Dança de São Paulo, aceitou receber a reportagem do JT. Falou sobre projetos da pasta, revelou que só gosta de música erudita, que tem restrições em relação ao grafite e que não confia na atual administração do MASP. Tudo sem largar o inseparável charuto.
Como justifica a necessidade de um investimento de quase R$ 50 milhões em dança? Eu justifico da mesma forma que se justifica a Osesp (Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo). A política cultural se preocupa com expressões artísticas que não se viabilizam pela ausência de mercado, por não representar um modismo ou pelo próprio funcionamento da indústria cultural. Sem apoio público, a dança não se viabilizaria. Além do mais, a Companhia de Dança de São Paulo será importante não só para o Estado, mas para o Brasil.
Em que medida a construção de um teatro de dança no coração da Cracolândia pode colaborar com a revitalização do Centro? Será um impacto importante na região. Serão criado dois teatros no espaço. Além disso, a escola de música Tom Jobim também irá se mudar para lá. Pensamos em outras atividades ali que envolvam a população. Queremos um espaço que tenha vida, que funcione sempre.
Por falar em mais envolvimento da população, como anda a implementação das Fábricas de Cultura, na periferia? Estamos construindo três prédios, Cachoeirinha, Sapopemba e Capão Redondo, e queremos mais seis. Serão nove distritos de alta vulnerabilidade juvenil atendidos pelo projeto. As fábricas irão oferecer espaços para diversos cursos artísticos. Enquanto não estão prontas, estamos usando o espaço dos CEUs para as aulas de teatro.
O que os CEUs representam para a secretaria da Cultura? É um ótimo equipamento, colocado em regiões da periferia, com bons teatros e espaços para o desenvolvimento da cultura. Qual será o reflexo das Fábricas nas comunidades carentes? A possibilidade de se expressar artisticamente é fundamental na formação do jovem, na elevação da auto-estima e na integração social. Vamos trabalhar com 200 mil jovens. Queremos ter impacto na vida da Cidade em relação à violência, à preservação do meio ambiente etc. Quem viaja para o exterior costuma voltar encantado com os músicos que se apresentam nas estações de metrô.
Por que o metrô de São Paulo não tem músicos? Em Paris e Nova York, isso é espontâneo. Aqui dependeria do Metrô, mas eu seria a favor... (um dos assessores do secretário relembra a retirada de um flautista que se apresentava em frente ao Conjunto Nacional, na Avenida Paulista. Segundo ele, a ação foi motivada por um pedido da administração do local).
A Prefeitura tirou ele de lá? Não deixaram ficar? Viu, é muito difícil agradar todo mundo, conciliar as opiniões.
O senhor gosta de música? De música erudita.
E o que acha do hip hop? Disso eu não gosto tanto. Na minha idade gosto mais de música erudita. Mas eu reconheço a importância do movimento. É importantíssimo. O secretário da Cultura não está aqui pra dizer o que gosta e o que não gosta. Se fosse assim, teria proibido música contemporânea no Estado (risos). Nós nos preocupamos com aquelas modalidades artísticas que precisam de apoio. E o hip hop é uma delas.
Qual a opinião sobre o grafite? Grafite ou pichação? Grafite.(Pausa) Grafite eu gosto, mas existem exageros na Cidade. Tem uns lindos. Agora, precisa ser consentido, não é? Eu não gostaria de acordar e ver minha casa grafitada. Se tivessem que fazer isso, queria ter o direito de, pelo menos, escolher o grafiteiro.
Como o governo pode ajudar um museu como o Masp? O Masp é privado. Assim como qualquer organização, uma boa administração, uma administração transparente, permitiria nossa ajuda. Eu não posso oferecer ajuda financeira para uma organização cuja as regras de administração e transparência de contabilidade não seja de ótima qualidade.
O Masp não oferece essas garantias? Não oferece. Tanto do ponto de vista administrativo quanto do ponto de vista da transparência. Essa é a nossa limitação em relação ao Masp.
Existem projetos para novos museus em São Paulo? Temos planejado a construção do Museu da História de São Paulo, no bairro da Mooca, o MAC (Museu de Arte Contemporânea) vai se transferir para o prédio do Detran em julho e estamos planejando um novo prédio para a Pinacoteca, onde se localiza o colégio Prudente de Moraes hoje.
Alguma novidade em relação à Virada Cultural? A expansão do número de cidades. Foram dez no ano passado, esse ano serão 20. Na Virada Cultural, os eventos ficam cheios até com chuva. Temos que conquistar as ruas e as praças para a cultura.
As praças não poderiam ser mais utilizadas pela cultura? Em algumas cidades, nós sempre usamos as praças. Mas não temos eventos todas as semanas, embora seja uma boa idéia. Precisamos acertar isso com as prefeituras. Eu não posso, simplesmente, tomar uma praça.
Qual é a política do governo em relação à literatura? Nosso foco em literatura é o incentivo à leitura. Para isso, estamos fazendo o diagnóstico das 645 bibliotecas do Estado. Queremos torná-las mais atraentes. Ler, hoje, concorre com internet, televisão, música. Nós queremos trazer essas coisas que atraem o público para dentro da biblioteca. Vamos instituir um prêmio de literatura cujo o objetivo é incentivar a leitura. Nós queremos tornar a escolha do melhor livro de ficção do ano em um evento que chame atenção da mídia e do público. Serão dez indicados, mas apenas um ganhador. Será um evento nacional. Um evento charmoso e importante. Lembro que, no ano passado e retrasado, falou-se muito na criação de uma Broadway paulista.
O projeto morreu antes de nascer? Não. O projeto existe, mas é mais off-Broadway (risos). Vamos instalar uma oficina de teatro lá na Praça Roosevelt, perto dos grupos teatrais.
Os artistas da região serão os professores dessa oficina. A cidade de São Paulo tem boas salas de teatro? Hum, tem e não tem. Às vezes, não são usadas corretamente. Acho que só falta falar de cinema. O mais importante para nós é o projeto Vá Ao Cinema. Esse ano, vamos distribuir dois milhões de ingressos para filmes nacionais aos alunos da rede pública.
Os alunos receberão ingressos para que tipo de filme? Qualquer filme nacional.
Dentro da máquina do governo, a Secretaria de Cultura é relevante? Em dinheiro nunca chegaremos ao ideal, mas em termos de importância nós somos muito reconhecidos.
Sua experiência sempre foi ligada à área da economia. Como está sendo trabalhar com Cultura? É uma novidade, mas continuo um administrador público. Muitos problemas são semelhantes. Fora isso, sou bem assessorado. Acho que estou livre das rivalidades que um artista teria se ocupasse essa pasta.
O senhor acha que artista reclama muito? Acho que reclama igual aos outros. Por outro lado, são muito mais interessantes e encantadores que o pessoal de outras áreas.
Qual é a peculiaridade da arte feita no Estado de São Paulo? A miscigenação e a cultura dos imigrantes é mais intensa. Fica mais evidente na produção. Jornal da Tarde, 1102.
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AQUELE ABRAÇO [Gilberto Gil]. "(...) Alô, alô, Realengo - aquele abraço! (...) Pra você que meu esqueceu - aquele abraço!".
www.vagalume.com.br
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