A revelação de que a pré-candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, veio ao Rio inaugurar um hospital que não recebeu um centavo sequer de investimento do governo federal irritou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que atacou a imprensa logo ao chegar ontem ao Rio e também durante visita à Rocinha, na Zona Sul. No evento na favela, onde o cronograma das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) é o mais atrasado no estado, Lula “inaugurou” menos de 20% das obras.
— A imprensa brasileira, por hábito ou por desvio, não gosta de falar de obras inauguradas. Coisa boa não interessa.
O que interessa é desgraça — protestou. Mais cedo, em entrevista para uma rádio evangélica, atacara: — Eu vi que a grande notícia de um jornal do Rio não é para o que serve o Hospital da Mulher, que foi inaugurado ontem (domingo), mas é porque a dona Dilma vem numa obra que não é do governo federal. Imagina a distorção da informação ao nosso leitor.
Ora, porque qualquer pessoa de consciência imaginaria o seguinte: por que o governo do Rio teve dinheiro para fazer um hospital dessa magnitude? É porque a parceria com o governo federal permitiu que colocássemos dinheiro em outra área e desafogássemos o governo estadual para fazer esse investimento. Qualquer pessoa menos medíocre saberia analisar assim.
Dilma, por sua vez, voltou a afirmar que houve parceria federal com o governo do estado na construção do Hospital da Mulher em São João de Meriti, na Baixada. A ministra, porém, não deu detalhes: — Tem sim (participação do governo federal). Até porque nós sabemos que o que é muito caro de fazer é manter o hospital funcionado. É pagar aos médicos, garantir todo o atendimento, o que a gente chama de custeio.
Em Meriti, o secretário estadual de Saúde, Sérgio Côrtes, justificou a participação da ministra na inauguração, que teve militantes do PT e do PDT, carros de som da prefeitura de Mesquita pedindo votos para Dilma e distribuição de lanches. Segundo ele, o governo Sérgio Cabral pôde fazer o hospital porque o governo Lula investiu em outras áreas da saúde no Rio.
Lula inaugurou na Rocinha um complexo esportivo e um Complexo de Atendimento à Saúde (CIAS/UPA). No entanto, faltam ainda serem concluídos uma passarela, uma creche, um centro de convivência, abertura e alargamento de ruas, urbanização, dois planos inclinados e unidades habitacionais.
Ao todo serão investidos na favela R$ 231,2 milhões do PAC.
Discursando para os moradores, Lula disse que bandido não se esconde apenas em favelas, mas em “prédios chiques de Copacabana”.
— Acabou o tempo em que as pessoas não olhavam para cá (Rocinha). É verdade que a Rocinha deve ter algum bandido. É verdade que no Pavão-Pavãozinho deve ter algum bandido e no Complexo do Alemão também, mas quem disse que não tem bandido naqueles prédios chiques em Copacabana? — discursou o presidente.
Em entrevista a uma rádio, perguntado sobre sua posição em relação à legalização das drogas, Lula afirmou que é contrário.
— A princípio sou contra a legalização de drogas. Não me consta que venha ajudar acabar com a droga no Brasil ou em qualquer país do mundo — disse.
Cinco ministros participaram da solenidade na Rocinha: Franklin Martins (Comunicações), José Gomes Temporão (Saúde), Orlando Silva (Esportes), Márcio Fortes (Cidades) e Carlos Lupi (Trabalho).
NOTA DE REDAÇÃO: “Mais uma inauguração serviu de precário biombo para um mal dissimulado comício da candidata Dilma Rousseff, fora de todos os prazos estabelecidos pela legislação eleitoral.” A advertência já constava de editorial do GLOBO em 22 de janeiro último — e de lá para cá a situação só se intensificou, mas parece que o que incomoda mesmo o presidente Lula é o fato de a imprensa estar vigilante ao uso da máquina pública em favor de sua candidata. Pelo raciocínio presidencial exposto nos palanques da vez, ontem no Rio, para justificar a presença da ministra Dilma na inauguração de um hospital sem qualquer verba federal, conclui-se que todas as obras do país só são possíveis graças ao governo Lula. Não é de se admirar, portanto, se em breve a candidata Dilma vier ao Rio para inaugurar algumas “obras federais”, como a barreira acústica da Linha Vermelha , o asfaltamento de ruas, a despoluição da Lagoa, a limpeza de bueiros ou um novo choque de ordem.
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