Presidente sanciona reajuste que, para ministro, abalaria "solidez orçamentária"
A três meses da eleição, o presidente Lula sancionou o reajuste de 7,7% concedido pelo Congresso a aposentados que ganham acima do mínimo. A decisão contrariou recomendações dos ministros da área econômica, que alertaram para o impacto nas contas - o custo total chegará a R$ 8,4 bilhões por ano. "Vamos deixar os velhinhos em casa, em paz", disse Lula. Nos bastidores, sabe-se que Lula havia decidido desde o inicio manter o reajuste, mas demorou a anunciá-lo para não deixar apenas com o Congresso os ganhos políticos da medida e ajudar a candidatura da petista Dilma Rousseff ao Planalto. O presidente vetou o fim do fator previdenciário, que coíbe aposentadorias precoces. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, para quem o reajuste abalaria a "solidez orçamentária" do governo, agora disse que ele é possível, mas "vai doer". Ao sancionar reajuste de aposentados, contrariando equipe econômica, presidente fatura junto com Congresso
A três meses da eleição e temendo impacto negativo do veto na campanha presidencial da petista Dilma Rousseff, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu sancionar (confirmar) o reajuste de 7,7% para os aposentados que ganham acima do salário mínimo, aprovado pelo Congresso. Sua decisão, que ele classificou como "a melhor", contrariou recomendações públicas dos ministros da área econômica, que passaram os últimos meses afirmando que as contas públicas não suportariam um reajuste maior que os 6,14% concedidos em janeiro.
Lula ficou com o outro lado: políticos aliados, inclusive do PT, ministros da área social e centrais sindicais, que pressionaram pela sanção dos 7,7%. As centrais sindicais e parlamentares ameaçavam com uma mobilização intensa se o presidente vetasse esse aumento.
Mas a decisão de Lula já era dada como certa há três semanas por setores do PT, da Esplanada e por integrantes da coordenação de campanha de Dilma, segundo revelaram fontes do governo ontem. Aos petistas preocupados com o prejuízo eleitoral com um eventual veto, Lula mandou dizer que não faria nada para prejudicar a candidata do partido.
Nos bastidores do PT e dos partidos aliados, o que se dizia era que Lula já havia tomado essa decisão desde o início, mas que incentivou o debate interno no governo. Demorou para anunciar a decisão até o último minuto com o objetivo de não deixar exclusivamente com o Congresso a autoria da medida.
Equipe econômica alertou para rombo
Já na noite de segunda-feira, depois de dizer durante o dia que não cometeria "nenhuma extravagância", e quando vazou no governo informação de que ele poderia dar um reajuste intermediário de 7%, Lula foi avisado por parlamentares petistas que as centrais estavam prontas para reagir, inclusive a CUT.
Por isso, a decisão de sancionar o reajuste foi antecipada aos presidentes da CUT, Artur Henrique, e da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva, pelo chefe de Gabinete de Lula, Gilberto Carvalho, duas horas antes do anúncio do governo, ontem.
Segundo relatos de participantes das últimas reuniões, a pressão da área econômica era imensa, mas a aposta entre os políticos era de que Lula não brigaria com o Congresso. E a dos petistas, de que ele não prejudicaria a campanha de Dilma.
- Lula já tinha tomado a decisão política de conceder o reajuste. Mas soube segurar até o fim para não dividir com mais ninguém os efeitos políticos dessa decisão. Ele jamais prejudicaria a candidatura de Dilma - admitiu ontem um integrante do comando da campanha petista.
Essa leitura, também feita por cientistas políticos, já era admitida ontem por aliados do governo.
- Quanto mais tempo para anunciar a decisão, melhor para o Lula. E mais próximo ficou da eleição. Além disso, ele fez um jogo de cena e mandou a equipe econômica resistir ao reajuste. E, ao dar o aumento, agrada muito aos aposentados e, com isso, capitaliza a decisão para a candidatura de Dilma - disse o líder do PTB, deputado Jovair Arantes (GO).
A equipe econômica, que saiu derrotada, alegava que as contas do governo não poderiam suportar o impacto do reajuste de 7,7%, que representará, em 2010, despesa adicional de R$1,6 bilhão. O reajuste de 6,14% custaria mais R$6,7 bilhões ao ano, totalizando agora cerca de R$8,4 bilhões.
O presidente ainda decidiu vetar o fim do fator previdenciário, uma fórmula criada em 1999 para coibir aposentadorias precoces, como já era previsto.
O índice de 7,7% significa aumento real (acima da inflação) de cerca de 4,2%. Segundo o ministro da Previdência, Carlos Eduardo Gabas, o benefício já corrigido deve começar a ser pago em agosto. Mas o pagamento dos atrasados, retroativos a janeiro, dependerá de acerto com a Fazenda, podendo ou não ser feito até agosto. Quem ganha o benefício igual ao salário mínimo recebeu 9,67% em janeiro, e nada será alterado agora com a sanção dos 7,7%.
O próprio Lula comemorou o desfecho da polêmica que se arrastava há semanas, afirmando ao procurador geral da República, Roberto Gurgel, com quem se reuniu logo após o encontro com ministros, que tomou a "melhor decisão".
- A primeira coisa que o presidente me disse foi: "Acabei de decidir a questão dos aposentados e acho que foi a melhor decisão que poderia tomar!" - contou Gurgel.
Depois da reunião de mais de três horas com Lula, o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (SP), disse que prevaleceu a avaliação política de que o Congresso não aceitaria outro índice que não o de 7,7%. Isso porque o governo tinha a alternativa de vetar esse reajuste e editar nova medida provisória, com 7%.
- Venceu a avaliação política do Congresso em ano de eleição, mas a equipe econômica não foi derrotada. O presidente me perguntou qual seria o resultado da votação de uma (nova) MP e fui claro: não passa nada que não seja 7,7% - disse Vaccarezza.
O corte de R$1,6 bilhão em outras despesas para compensar o reajuste é considerado pequeno até pelos aliados. Representante do governo na Comissão Mista de Orçamento e vice-líder do governo no Congresso, o deputado Gilmar Machado (PT-MG) disse que os recursos sairão de medidas como atraso na realização de novos concursos, em custeio e até na liberação de emendas de parlamentares.
A justificativa corrente ontem no governo para a decisão do presidente Lula era que as centrais sindicais estavam prontas para reagir, e que, se ele vetasse, o desgaste político seria muito maior. Quando tomou a decisão, o presidente Lula disse, então, que não pretendia mexer com os aposentados, e menos ainda que eles saíssem às ruas para protestar.
- Vamos deixar os velhinhos em casa, em paz - disse Lula, segundo relatos. |
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