Em quase oito anos de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que caminha para o fim com as eleições presidenciais de ontem, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) acumulou ganhos de 523,26% até a última sexta-feira pelo Ibovespa, seu índice de referência. Foi a maior alta nominal entre as 12 principais bolsas do mundo, superando emergentes como China (94,36%), Índia (505,95%) e México (452,04%), segundo dados da Bloomberg. Um período classificado por economistas como “exuberante” e que foi marcado no último mês pela polêmica capitalização de R$ 120 bilhões da Petrobras.
Os investidores aumentaram em mais de cinco vezes seu patrimônio aplicado na Bovespa graças, segundo especialistas, a um longo período de crescimento econômico mundial, liderado pela demanda chinesa por commodities (matérias-primas), e ainda ajudados pela força do consumo interno brasileiro.
— Fomos muito privilegiados entre 2002 e meados de 2007, quando a economia mundial cresceu como nunca. Nossa Bolsa tem muitas empresas ligadas a matérias-primas, que foram beneficiadas — explica Alvaro Bandeira, economista-chefe da Ágora Corretora.
Para Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central (BC) e hoje sócio da Rio Bravo Investimentos, acrescentase a isso a continuidade de trabalho no plano macroeconômico entre os governos Fernando Henrique Cardoso e Lula, o que, afirma, permitiu a queda do risco-Brasil (taxa calculada pelo banco americano JPMorgan, que mede o grau de risco atribuído por estrangeiros aos títulos do país) e a atração de investidores estrangeiros.
— O rali começou em novembro de 2002, pouco depois da Carta aos Brasileiros divulgada por Lula em meio ao pânico do mercado. O riscoBrasil começou a recuar e a Bolsa acompanhou — afirma Franco. Siderurgia entre setores de destaque Mesmo ajustado pela inflação oficial no período, o desempenho do Ibovespa ao longo dos dois mandatos foi de 308,46%, muito acima do rendimento real da caderneta de poupança (22,01%) e do CDI (89,95%), que serve de referência na renda fixa e que acompanha a taxa básica de juros (Selic), por exemplo.
No período FH (1995-2003), o ganho real do Ibovespa foi de 26,80%.
— O ganho não foi maior no governo Lula porque aconteceu a maior crise econômica mundial desde 1929, a crise desencadeada pelas hipotecas de alto risco americanas.
Mas o governo FH também viveu uma sequência impressionante de crises e a inflação ainda corroeu a maior parte da rentabilidade — explica André Perfeito, economistachefe da Gradual Investimentos.
Segundo dados da Economática, os setores que tiveram maior valorização ao longo desses dois mandatos foram o de construção (2.590%), transporte (2.228%) e siderurgia (2.061%). Este último o mais importante, porque tem um maior número de ações (12 ao todo), de empresas e também de investidores.
Para calcular o desempenho dos setores, a consultoria considerou as cem ações mais líquidas no período.
Entram na conta papéis que eram negociados em 30 de dezembro de 2002 e que continuaram sendo negociados até a última sexta-feira.
Para Eduardo Velho, economistachefe do Banco Prosper, os setores que mais cresceram foram os que melhor se aproveitaram do novo momento da economia, marcado pelo aumento de emprego e renda da população.
Também se destacam setores que conquistaram mercados e incorporaram aumento de produtividade.
— Quem soube aproveitar mais rapidamente esses cenários saiu na frente. Há setores cujo processo de consolidação não aconteceu de forma tão rápida e que acabaram ficando para trás — diz Velho.
O setor de telecomunicações tem três ações entre as dez que menos renderam nesses quase oito anos. Em conjunto, o setor cresce 2.017%. Mas o principal motivo é a alta dos papéis da Telebrás, que subiram 20.526% desde 30 de dezembro de 2002. Falida quando Lula tomou posse, a empresa agora se prepara para colocar em operação o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), programa que pretende levar internet rápida a todos os municípios nos próximos anos.
— Neste caso a alta não reflete condições de mercado, mas imposições do governo, que anunciou diversas vezes a reativação da empresa e deu margem para a especulação.
Algo que pode acontecer em todo sistema estratégico onde existe controle acionário público — afirma o economista do Prosper.
Entre as empresas “queridinhas” da Bolsa, as ações da Petrobras valorizaramse 577,9% (PN, sem direito a voto) e 536,99% (ON, com esse direito) desde o início do primeiro governo Lula. Isso rendeu à petrolífera, no entanto, apenas uma posição intermediária no ranking. Nesse período, as ações da Vale subiram mais: 596% (ON) e 559% (PN).
Mas nem sempre a relação entre Lula e o mercado foi assim. Quando o atual presidente despontou nas pesquisas eleitorais em 2002, o dólar subiu para quase R$ 4. O mercado temia as incertezas de um governo de esquerda. Quase oito anos depois, o dólar está cotado abaixo de R$ 1,70.
— Lula foi hábil ao entrar e segurar a bomba de início, aumentou os juros.
Se não fosse isso, o governo ficaria em xeque o tempo todo. E a indicação de Henrique Meirelles para presidente do Banco Central também foi muito bem aceita — lembra Perfeito.
Nada parecido com o que aconteceu este ano. A eleição presidencial aconteceu em um clima de calmaria no mercado nacional. Nem mesmo na reeleição de 2006, ano considerado um marco no mercado de ações, o pleito passou ao largo como este ano. Naquele ano, a crise política do mensalão levou a uma alta de 13% do risco-país brasileiro em apenas uma semana e a uma elevação do dólar.
Segundo economistas, isso acontece porque o tripé da economia brasileira — superávit primário, metas de inflação e o câmbio flutuante — estão consolidados. Para Gustavo Franco, as tendências dos últimos anos não foram esgotadas, mas o governo precisará fazer um ajuste do que chamou de “descontrole fiscal” dos últimos 12 meses.
— O Brasil conquistou o grau de investimento (nota dada por agências internacionais que serve como uma espécie de aval a países seguros para se investir), mas sua nota ainda é equivalente a um cinco. Precisa evoluir.
Sem esse descontrole, estaríamos prontos para receber uma elevação da nota logo após as eleições e geraríamos mais valor para a Bolsa — acrescenta o economista. -----------
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