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segunda-feira, fevereiro 28, 2011

MUAMAR KADAFI [In:] A ONU e o ÔNUS

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COMUNIDADE INTERNACIONAL SE UNE PARA ISOLAR KADAFI



"TODOS A BORDO"


Autor(es): Agência O globo:Fernanda Godoy
O Globo - 28/02/2011

Unanimidade e rapidez na decisão da ONU sobre a Líbia surpreendem


NOVA YORK. O barulho dos passos apressados dos membros da delegação chinesa descendo as escadas que levam ao plenário do Conselho de Segurança da ONU provocou uma onda de adrenalina na antessala onde se aglomeravam diplomatas e jornalistas. Faltavam cinco minutos para as 20h (22h em Brasília) de sábado, hora marcada para a votação da resolução sobre a Líbia, remetendo o ditador líbio ao Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia, por crimes contra a Humanidade, e o embaixador da China, Li Baodong, trazia a resposta de Pequim.

- Todos a bordo - disse Li, antes de entrar para a votação histórica, que também decidiu pelo embargo de venda de armas à Líbia, o congelamento dos bens de Kadafi e de sua família, e a proibição de viagens ao exterior para o ditador, seus parentes e cinco de seus principais auxiliares.

A consulta havia forçado o atraso da votação em mais de três horas porque, devido ao fuso horário de 13 horas entre Nova York e Pequim, foi preciso esperar que o dia amanhecesse no Oriente para que os líderes fossem ouvidos. A revelação da unanimidade deixou exultantes os diplomatas que foram irredutíveis na defesa do envio do caso de Kadafi ao TPI, notadamente os da França, do Reino Unido e da Alemanha. Como disse o embaixador da França, Gérard Araud, um terremoto foi sentido no Conselho de Segurança e nos corredores da ONU.

- Um vento de liberdade e mudança está varrendo o mundo árabe, e o Conselho de Segurança está respondendo a isso. Demos um aviso a todos os líderes para que não usem a repressão contra esse vento de liberdade - disse Araud.

A França ajudou a sacar do bolso do colete a arma que virou os votos de vários países, especialmente os três membros africanos (Nigéria, Gabão e África do Sul) que estão temporariamente no Conselho de Segurança: a carta do embaixador líbio, Abdurrahman Mohamed Shalgham, pedindo a responsabilização dos autores de ataques a civis e endossando o envio da denúncia ao TPI.

Com a maioria consolidada, a China, normalmente avessa a condenações por violação de direitos humanos, corria o risco de ficar isolada. Segundo relato de um diplomata europeu que pediu para não ser identificado, o objetivo era a unanimidade, ou ao menos garantir que a China não fosse mais longe do que uma abstenção, abrindo mão do poder de veto. E, na pior das hipóteses, a proposta de resolução seria levada a votação, mesmo para perder.

- Os chineses teriam de assumir o ônus político do veto. Mas é interessante ver como estão levando a opinião pública em conta - disse o diplomata.

Em mais uma intervenção emocionada, o vice-embaixador da Líbia, Ibrahim Dabbashi, que havia abandonado Kadafi há uma semana, louvou a decisão:

- Foi uma mensagem clara de apoio ao nosso povo. Esperamos que os que estejam colaborando com o regime tomem uma posição e fiquem do lado do povo.

Nos discursos e entrevistas após a votação, os embaixadores abandonaram a linguagem cautelosa e destacaram a enorme importância da decisão.

- Essa é uma expressão poderosa da profunda preocupação, na verdade, da raiva da comunidade internacional com os níveis de violência perpetrados contra o povo da Líbia. As ações cometidas e a linguagem usada pelo coronel Kadafi não são mais aceitáveis no século XXI - disse o embaixador do Reino Unido, Mark Lyall Grant.

Desta vez, os EUA pareceram confortáveis no banco de trás, e a embaixadora americana, Susan Rice, chegou a agradecer a Grant a liderança britânica:

- Não me lembro de uma ocasião em que o Conselho de Segurança tenha agido de forma tão rápida e decisiva, e por unanimidade, num assunto urgente de direitos humanos internacionais.

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, que teve participação decisiva ao implorar rapidez ao Conselho, na sexta-feira, compareceu à votação e pediu agilidade também na confirmação da suspensão da Líbia do Conselho de Direitos Humanos da entidade, prevista para acontecer esta semana na Assembleia Geral. A embaixadora do Brasil, Maria Luiza Ribeiro Viotti, que deixa hoje a presidência rotativa do Conselho, cedendo o lugar à China, tinha o semblante desanuviado no final da noite.

- É uma sensação de dever cumprido, de o Conselho de Segurança ter podido exercer sua responsabilidade de uma forma unificada, ter mandado uma mensagem única e forte em relação à situação na Líbia - disse a embaixadora.

Dentro de dois meses, o promotor do TPI, o argentino Luis Moreno Ocampo, terá de apresentar ao Conselho de Segurança o primeiro relatório de sua investigação sobre os crimes na Líbia.

- Isso é histórico. Uma decisão unânime do Conselho de Segurança sublinha o enorme potencial do Tribunal Penal Internacional como meio de prover justiça para as vítimas dos crimes mais horrendos - disse o diretor do Programa de Justiça da Human Rights Watch, Richard Dicker, que parecia não acreditar no que via.

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