Entre céticos e até surpresos, criminalistas que defendem condenados no processo do mensalão preparam memoriais que são o recurso derradeiro para convencer os ministros do Supremo Tribunal Federal a aceitarem os embargos infringentes - se acolhido, esse recurso pode levar 11 réus a um novo julgamento na Corte.
Muitos advogados nem acreditavam mais que essa brecha pudesse surgir, no crepúsculo da ação penal 470. A esperança renasceu na sessão de quinta-feira, por iniciativa do ministro Luís Roberto Barroso, o novato da Corte, que sugeriu interrupção dos trabalhos para que as defesas possam apresentar argumentos em favor dos embargos.
Alguns veem na medida uma estratégia do STF em neutralizar eventuais alegações de causídicos sobre cerceamento de defesa. Mesmo assim, pretendem aproveitar a oportunidade: vão citar pareceres de juristas e manifestações até de um ex-presidente do Supremo sobre a admissão dos infringentes, o que provocaria a indicação de novo relator específico para esses recursos.
"Admitir os embargos infringentes é muito importante porque reabre-se uma nova chance", diz o advogado José Carlos Dias, que defende a ex-presidente do Banco Rural Kátia Rabello, condenada a 16 anos e 8 meses de prisão por formação de quadrilha, evasão de divisas, lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta de instituição financeira.
Mas o veterano criminalista não alimenta muita esperança e se revela angustiado nesse cenário. "É sempre uma coisa boa (o STF abrir espaço para novos memoriais, no caso pelos embargos), mas estou cético. A defesa tem sempre que tentar. Devemos apresentar novo memorial, mas tudo o que tínhamos que expor aos ministros já o fizemos em outras fases do julgamento", afirma Dias.
"Pareceres já foram juntados, mas estou extremamente preocupado diante de um grande erro judiciário que está sendo praticado. Minha cliente teve uma vida dedicada com correção ao sistema financeiro, é um injustiçada."
Opinião própria. "Vamos apresentar memoriais, até porque o ministro Celso de Mello, no julgamento da própria ação penal 470, sustentou o cabimento dos embargos perante o STF", anota Marcelo Leonardo, defensor do empresário Marcos Valério (pena de 40 anos e 4 meses de prisão). "Além disso, estamos apoiados em manifestação publicada em artigo pelo ministro (aposentado) Carlos Velloso, que reconhece os infringentes no âmbito da Suprema Corte em ação penal originária."
A defesa de Valério quer amparar sua última investida recorrendo até ao parecer de um jurista apresentado pelo mais notório dos réus, José Dirceu, ex-ministro chefe da Casa Civil, apontado como chefe da quadrilha que pagava parlamentares em troca de apoio ao governo Lula.
O parecer é da lavra do professor titular da Faculdade de Direito da USP Antônio Magalhães Gomes Filho, anexado a um memorial que o criminalista José Luís Oliveira Lima entregou ao STF. "O professor sustenta a admissão dos embargos desde que existam quatro votos favoráveis e destaca expressamente a vigência do artigo do Regimento Interno do STF que prevê esse recurso."
Para o criminalista Leonardo Isaac Yarochewsky, que defende Simone Reis Vasconcellos (ex-diretora da agência SMPB, 12 anos e 7 meses de prisão e multa de R$ 374,4 mil), o Supremo não pode ficar refém de formalismos. "O ministro Joaquim Barbosa disse inúmeras vezes que ser julgado pelo Supremo é um privilégio. Eu digo mais: não se pode subtrair do Supremo o direito de analisar embargos e rever situações diante de um erro em matéria criminal que trata do bem mais sagrado, que é a liberdade."
O advogado ainda levanta um argumento "muito simples" para o Supremo considerar: "o argumento de Justiça". "Se a lei não recepcionou o Regimento Interno do STF, mas se estamos na iminência de uma injustiça, o próprio Supremo deve corrigir", sustenta Yarochewsky. "O ministro Barroso disse que a pena para Simone foi muito dura. Ora, os ministros terão oportunidade agora de rever."
O Supremo retoma a discussão sobre os embargos infringentes na quarta-feira.
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