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sexta-feira, março 30, 2007

CANA-DE-AÇÚCAR: PRODUTIVIDADE & MORTE (conclusão)

A morte por trás do etanol: Recordes de produtividade e buscade energia “limpa” são a face modernada produção de cana-de-açúcar. Masisso é sustentado por um regime de semi-escravidão a que ainda são submetidos os trabalhadores.
E o pior é que a situação desses condenados da terra pode se agravar. A partir deste ano, começa a ser colhido um novo tipo de cana, mais leve por ter sido geneticamente modificada. Além de pesar menos – pois elimina bastante a água –, esse tipo de cana concentra uma quantidade muito maior de sacarose (açúcar). Tudo ótimo, menos para o trabalhador, que precisava cortar 100 metros de cana para produzir dez toneladas e por causa da novidade transgênica precisará cortar o triplo para produzir a mesma quantidade. Aos 52 anos, Maria dos Santos corta nove toneladas para levar para casa R$ 512 no final do mês. Quando soube que terá que trabalhar três vezes mais para ter o mesmo rendimento, não se conteve: “Vamos morrer!”, desesperou-se. Hábeis em implementar modernizações tecnológicas, os usineiros não demonstram intenção de alterar as arcaicas relações de trabalho que predominam no setor sucroalcooleiro. “As práticas impostas por eles, em muitos casos, ainda são escravagistas”, diz a técnica do Ministério do Trabalho. Veja-se, por exemplo, o processo de seleção dos trabalhadores. Eles são “vendidos” para intermediários que selecionam a mão-de-obra para usinas. Trazidos das profundezas do País para dar duro nos canaviais, esses escravos do século XXI são cooptados por “gatos”, uma espécie de empreiteiro que busca pessoas que, em troca de migalhas, se submetem a todo tipo de humilhação. Para cada cortador de cana trazido para a usina, capaz de produzir 12 toneladas por dia, o “gato” recebe em média R$ 60. Qual a vantagem? Esses cortadores são escolhidos a dedo e não reclamarão de serem obrigados a viver em alojamentos decrépitos. Eles também não reclamam do pagamento abaixo dos pisos salariais e ainda admitem viver confinados nas propriedades onde a colheita ocorre oito meses por ano. “Só 20% dos trabalhadores ligados ao setor sucroalcooleiro no Brasil têm conquistas preservadas, o resto são escravos”, garante Miguel, o sindicalista. “Não é difícil constatar a miséria e a exploração a que essas pessoas estão submetidas. O Ministério do Trabalho é que dá as costas para o problema”, indigna-se Miguel. União da Agroindústria Canavieira de São Paulo (Única), entidade que representa os usineiros, não fala sobre direitos do trabalho. Segundo a assessoria de imprensa, eles apenas “cumprem a lei”. Mas em relação ao crescimento da produção eles são expeditos. Para os donos dos engenhos, as máquinas produzirão, até 2013, 36 bilhões de litros de álcool – um bilhão a mais que a atual produção mundial. Grande parte dessa produção atenderá aos mercados americano e europeu. No ano passado, 19 bilhões de litros de álcool foram destilados, uma supersafra que movimentou mais de R$ 40 bilhões na economia, US$ 8 bilhões em exportações, equivalentes a mais de 3,5% do PIB brasileiro. Segundo as estimativas do setor sucroalcooleiro, uma nova usina de cana surgirá a cada mês no País nos próximos dois anos. Este crescimento acelerado no plantio e na produção preocupa governantes e economistas. Muitos temem que esse boom leve o Brasil de volta à monocultura. Hoje, várias plantações de alimentos e áreas de pastagem estão sendo substituídas por lavouras de cana-de-açúcar. Preocupados com essa possibilidade, alguns Estados já se preparam para enfrentar a situação. Em Mato Grosso, na região do Pantanal, já foi proibida a implantação de usinas de álcool. No Estado de Goiás, algumas prefeituras querem limitar a entrada da cultura da cana. Em São Paulo, responsável por 60% da produção nacional, um projeto do deputado estadual Simão Pedro (PT) propõe que os fazendeiros de regiões do Estado onde a cultura da cana se expande sejam obrigados a reservar 10% das terras para outros tipos de cultura. “É fato a expansão do setor, mas precisamos criar alguns limites, senão daqui a uns dias seremos obrigados a importar alimentos básicos”, diz Simão. Enquanto isso, o presidente Lula, inebriado com o etanol, disse que os usineiros passaram de bandidos a heróis. 10 mil quilos de cana por dia é a cota mínima que cada cortador deve produzir. Por Alan Rodrigues e Hélcio Nagamine, IstoÉ Online.

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