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sábado, abril 07, 2007

EDITORIAL: CRISE AÉREA [A INSUBORDINAÇÃO !]

A INSUBORDINAÇÃO!

É quase “lugar-comum” durante a Semana Santa, nas salas de redação da grande imprensa, jornalistas contarem aos colegas neófitos a seguinte historinha: “Na Quinta-feira Santa, um redator-chefe diz á um de seus subordinados: -- Escreva uma matéria sobre Jesus Cristo para amanhã. O jornalista lhe pergunta: -- Contra ou a favor?”. Um segundo lugar-comum: os fatos e a versões!
A moral dessa história é que, para o subordinado, o que importa é a “verdade” veiculada pelo Jornal, não importando qual seja a repercussão da matéria. E a ele, por sua vez, importa manter o seu “emprego”.
Tomando-se novamente algumas narrativas bíblicas como referência, o que presenciamos nesta semana nos aeroportos brasileiros e no centro do poder? Uma verdadeira “Torre de Babel”. Não é laborioso nem desnecessário lembrar (aos neófitos, principalmente) o que significou a Torre de Babel no contexto bíblico[1]: “Em tempos imemoriais, num vale da Mesopotâmia, os clãs dos descendentes dos filhos de Noé [Sem, Cam e Jafé], em sua marcha para o Oriente, se encontraram e se puseram a construir uma enorme torre, a torre de Babel. Empilharam, para tanto, milhares de tijolos, colando-os uns sobre os outros, com betume, para fazer com que um dia o seu ápice penetrasse nos céus. Provavelmente a intenção deles era agradecer à divindade por terem escapado ao terrível dilúvio que tudo arrasara em tempos remotos. Mas não foi assim que Jeová entendeu. Não viu aquele colosso se erguer no meio do nada como um possível agrado a ele, mas sim como prova da soberba dos homens. Queriam rivalizar-se com Ele. Resolveu intervir. Desceu em meio aos construtores e num gesto Dele todos começaram a dizer palavras em línguas diferentes. Ninguém mais se entendeu[2].
É nesse contexto que se trava (literalmente) a batalha entre o poder civil (Ministério da Defesa) e o poder militar (Força Aérea Brasileira) no controle do tráfego aéreo brasileiro (sic) e na “arena” escolhida pelos “controladores de vôos”, nesse caso apropriadamente, as “torres”. A propósito, torres nos faz lembrar o conto de fadas de “Rapunzel”[3].
A lógica nos diz que, as torres existentes nos aeroportos sirvam não apenas para “controlar” a aterrizagem e decolagem das aeronaves como também (ou sobretudo) para que comandantes (piloto e co-piloto) e controladores “falem a mesma língua”. E, por extensão, em “sintonia” com todo nível hierárquico ou de subordinação. Mas, não foi o que presenciamos! O imbróglio já havia começado semanas antes. Apenas lembrando que, em meio à crise aérea o Presidente deixou o Brasil rumo aos EUA para cumprir agenda com o presidente Bush em “Camp David”, deixando recado ao Vice (Alencar) que não tomasse nenhuma medida punitiva em relação ao “motim” iniciado pelos controladores de vôos, que apenas tentasse “barrar” o movimento. Quando de seu retorno ao País e informado sobre o caos que se instalara na aviação, o discurso do Presidente tomou outras “falas”. Isto porque, já no domingo, o Clube da Aeronáutica (composto majoritariamente por militares da FAB – Força Aérea Brasileira - na reserva) havia enviado aos associados uma mensagem conclamando a “reversão da desmilitarização” do controle do tráfego aéreo e criticando o governo por não ter punido os controladores motinados. A crise se acirra ainda mais entre os “poderes” envolvidos nessa trama a partir do momento que se tornou público o acordo entre os grevistas do CINDACTA-1 (Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle do Tráfego Aéreo, de Brasília) e o Governo, principalmente em relação criação de um órgão civil para administrar o controle do tráfego aéreo, conforme reivindicado pela categoria. Por esse motivo, o presidente do Clube ameaçou entrar no Supremo Tribunal Federal (STF), com uma ação de inconstitucionalidade contra as decisões do presidente Lula por não “punir os controladores rebeldes e desmilitarizar o controle do tráfego aéreo” e denunciá-lo por crime de responsabilidade. Talvez o tenente-brigadeiro não soubesse que a criação do órgão civil fora pedida pelo Comando da Aeronáutica, haja vista a “insubordinação” dos militares que passariam a responder diretamente ao Ministério da Defesa. Coincidência ou não, o Presidente determinou pressa na elaboração da Medida Provisória (MP) que transfere da Aeronáutica o controle para o órgão civil a ser criado. Por sua vez, a Aeronáutica tendo entendido que fora desautorizada, pelo Governo Lula, em sua decisão de prender os sargentos controladores (motinados) disse na segunda-feira (2) não se considerar responsável pelo setor e esperava a saída dos controladores, de seus quadros, o mais rápido possível. Levando-se em conta a Semana Santa, a Aeronáutica também resolveu “lavar as mãos”.
Por tudo isso, rapidamente, o Presidente passou a considerar que foi “grave e irresponsável a paralisação dos controladores de tráfego aéreo” na sexta-feira dia 30 de março (dia em que o avião presidencial voou para Camp David), principalmente pelo “movimento de caráter sindical” dos controladores e do grau de “insubordinação” (pasmem!). E com esse discurso tentava mostrar aos chefes do Exército, Marinha e Aeronáutica que o Governo (i) estava se empenhando para restabelecer a disciplina militar, (ii) que sua intenção não foi a de subverter a hierarquia militar, reforçando ainda aos três comandantes militares, (iii) que o acordo com os controladores de vôos não “estava totalmente fechado” e deixando claro (iv) que entendia que a instauração de um Inquérito Policial Militar (IPM) era inevitável. Nas inúmeras reuniões palacianas o Ministro da Defesa participava, mas o “porta-voz” nas intermediações entre militares, controladores e Governo era o Ministro do Planejamento e que a todo o momento lembrava da “indignação” do Presidente em relação ao “movimento sindical dos controladores” e de que o presidente Lula “não negociaria com a faca no pescoço”, já que a mesma “faca” tinha sido utilizada por controladores-sindicalistas que o “apunhalaram pelas costas”.
Ainda no clima do “diz-que-diz-que” que perdurou toda a semana, representantes dos controladores garantiam que não retomariam o movimento para o dia da Páscoa, levando-se em conta que a MP da Câmara criou 172 cargos de técnicos para o Cindacta do Comando da Aeronáutica, onde desse total, 137 vagas são para técnico de nível superior em “defesa aérea e controle de trafego aéreo”, contudo, não criando vagas para “controladores de vôos”, daí a incerteza pairando no ar (sem trocadilhos). Outros aspectos foram relacionados à “crise aérea”, que ficou mais conhecida como “apagão aéreo”, entre eles (i) a “amargura” sentida pelos passageiros nos aeroportos brasileiros, haja vista não raro, a perda de compromissos profissionais, sociais e de lazer, (ii) a estimativa da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) que estima em 18 mil o número de embarques prejudicados por ocasião da paralisação da “sexta-feira”, (iii) a “queixa” das companhias aéreas que se consideram tão vítimas quanto os passageiros, as quais estimam prejuízos em torno de R$100 milhões nos últimos seis meses, (iv) a análise técnica de um engenheiro -- integrante do grupo francês Thomson responsável nos anos 80 e 90 pela expansão de unidades eletrônicas do sistema aéreo -- que afirma que o governo necessitaria investir cerca de US$ 2 bilhões até 2011 no “complexo autônomo de controle dos serviços aéreos civis e que o mesmo ainda seria menor que o atual, composto por centros de radar e bases de processamento de dados e centrais de telecomunicações.
A semana (que não foi “santa” para todos os envolvidos na crise aérea) terminou com a constatação pela “base governista do governo” na Câmara, que é quase impossível impedir a instalação da “CPI do Apagão Aéreo”, contudo, dependendo da decisão do plenário do STF. O fato consolador (se assim podemos nos referir) é que a “base” teria 15 das 23 vagas nessa Comissão e que, tendo o “controle” da CPI, “os governistas” poderão evitar medidas que sejam desfavoráveis ao governo Lula, embora seja quase certo que o PMDB irá reivindicar a “presidência” da comissão[4].
Afinal, quem é a Rapunzel, o príncipe e a bruxa nessa crise aérea? O Presidente, o Ministro, a FAB, a ANAC, os controladores civis, os controladores militares, as companhias aéreas ou os passageiros?
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[1] Gênesis 11.
[2] http://educaterra.terra.com.br/voltaire/artigos/babel.htm
[3] Ver livro Contos para a infância e para o lar, dos Irmãos Grimm.
[4] A luta desmedida pelo poder também pode ser vista na personagem da Rainha Jezebel

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