O que há no debate sobre a eleição de 2010.
Parece surpreendente que a sucessão presidencial seja um assunto na pauta dos políticos e da imprensa quando ainda faltam mais de três anos para as eleições. O segundo governo do presidente Lula começou há oito meses, tem planos para investir mais de meio trilhão de reais em infra-estrutura, incorporar mais de 4 milhões de jovens à economia formal, reduzir a um terço a quantidade de homicídios nas grandes cidades, injetar R$ 8 bilhões na melhoria da qualidade da educação e, assim mesmo, chegar ao fim do mandato com um déficit nominal das contas públicas zerado. Com uma agenda desse porte e a memória ainda fresca dos 61% de votos obtidos pelo presidente em 2006, é mesmo incrível que o PT tenha aberto a corrida sucessória em seu congresso partidário, na semana passada. “O PT apresentará uma candidatura a presidente a ser construída com outros partidos”, decidiu o congresso, numa expressão um tanto ambígua para o padrão tradicionalmente exclusivista da legenda. A resolução diz mais sobre os impasses internos do PT que sobre suas condições de disputar, pela primeira vez, uma eleição presidencial sem um candidato chamado Lula. A crise do mensalão e, talvez mais que a crise, a reeleição de Lula – apenas um ano depois de ter sido levado à lona por denúncias de corrupção – certamente aumentaram a compreensão dos petistas sobre a importância das alianças na política. Sem aliados no Congresso, nos movimentos sociais e na disputa eleitoral, Lula jamais teria obtido a recuperação espetacular que exibiu no segundo turno de 2006. Talvez nem mesmo tivesse chegado a disputar a reeleição. A dificuldade do PT neste momento está em se abrir a uma candidatura “amiga, porém estrangeira”. Isso em meio a um processo de renovação interna necessário, mas retardado pelo sucesso eleitoral de Lula. O PT precisa preservar o condomínio partidário do governo – que o processo sucessório tende a dispersar – e simultaneamente construir uma candidatura própria sobre as ruínas da velha cúpula mensaleira. É uma corrida contra o tempo, talvez necessária para a auto-afirmação do PT, mas sem dúvida inconveniente para o governo. A precipitação, no entanto, não chega a ser o mais grave problema no debate sobre a sucessão. Se já estamos discutindo nomes e sobrenomes, de governistas ou da oposição, este é um perigoso sinal de que poderemos chegar a 2010 sem que o eleitor participe de uma disputa real em torno de projetos para o país. No campo lulista, mesmo nomes de personalidade política marcante, como Ciro Gomes, Marta Suplicy ou Nelson Jobim, vão se apresentar como fiadores em grau maior ou menor de um projeto de continuidade. No PSDB, as candidaturas de José Serra e Aécio Neves terão de carregar algum compromisso com o que os petistas chamam “avanços sociais” do governo Lula. Em recente – e tardia – autocrítica, Lula confessou não ter compreendido a importância da estabilidade proporcionada pelo real na campanha de 1994. Acredita, por isso, que seus adversários não devem repetir o erro em relação a políticas como o Bolsa-Família ou a recuperação do poder de compra do salário mínimo. Curiosamente, o partido que se apresenta com maior nitidez no campo das idéias diferentes é o que menos chances teria hoje de entrar na disputa como alternativa real de poder. O recém-rebatizado DEM propõe um deliberado desmonte do Estado, na contramão do que o PT vem fazendo e em grau muito mais elevado que o PSDB arriscou quando era parceiro do PFL no governo Fernando Henrique Cardoso. Na oposição, o PFL de hoje comporta-se como o PT do passado. Mas isso não lhe confere necessariamente uma perspectiva de futuro. RICARDO AMARAL é repórter especial de ÉPOCA em Brasília. 1009.
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