Se o estado-maior das forças de oposição não despertar para a gravidade do teatro de operações, as eleições presidenciais programadas para 3 de outubro de 2010 estarão liquidadas no primeiro semestre.
A desigualdade de forças entre a sólida base governamental, e a fluída e insegura oposição, é digna de registro. Não bastasse, do lado governista verifica-se inabalável coesão em torno do marechal Lula, cujo mando é disciplinadamente aceito pelos quadros inferiores, de generais a soldados rasos. O paiol, por sua vez, dispõe de artilharia pesada, na qual se sobressai o Bolsa Família, cujo poder de persuasão não deve ser subestimado.
Neste segundo mandato, consciente da inexistência de nome forte no seio do PT, investido de liderança para sucedê-lo sem tropeços, o presidente, como habilidosa aranha tecedeira, tratou de construir a teia de interesses, para a qual atraiu dirigentes de partidos dispostos a apoiar qualquer nome de sua livre escolha, embora inexperiente e inexpressivo. Cooptou o velho PMDB com ministérios, empresas, diretorias e empregos e, para seduzi-lo, definitivamente, ter-lhe-ia prometido a Vice-Presidência. Ao PDT, concedeu o Ministério do Trabalho e Emprego, e prestigiou a Força Sindical, talvez a central com maior número de filiados.
Enquanto o presidente Lula dá provas de sagacidade política, a oposição — se é que existe — perde-se no labirinto das vacilações e dúvidas. O PSDB, supostamente a agremiação mais estruturada e forte, pois já ocupou a Presidência na era FHC, e detém o governo de São Paulo há 20 anos, deixa claro ao que não veio. Até o momento não dispõe de pré-candidato consolidado. A decisão sobre eventual pretendente ao Palácio do Planalto persiste, na expressão pitoresca de Churchill, como “charada envolvida em mistério, dentro de um enigma”.
A renúncia à candidatura do governador mineiro Aécio Neves, deve ser interpretada como vaga manifestação de propósito, sujeita a confirmação, conforme o andar da carruagem. O presidente francês Charles De Gaulle, com a experiência política que o converteu num dos grandes estadistas do século 20, advertia que “promessas somente comprometem aqueles que as ouvem”. No caso, sequer promessa houve.
Com o PSDB vítima da indefinição interna, o PMDB dividido, e o DEM abalado dos alicerces ao telhado por denúncias de corrupção que envolvem o Governo do Distrito Federal, secretários e deputados distritais, torna-se quase inimaginável impor derrota a quem preside o governo, dispõe da máquina, e revela saber usá-la sem despertar reação da Justiça Eleitoral.
Segundo Maurice Duverger, os partidos políticos são de massa, quando possuem forte apelo popular, ou de quadros, se organizados, como nas Forças Armadas, segundo os princípios de hierarquia e disciplina, conforme se dava com o extinto Partido Comunista. É claro que, na generalidade dos casos, resultam de combinação inteligente entre quadros e massa, dependendo a composição das forças da qualidade dos dirigentes.
Os recentes partidos oposicionistas conseguiram não ser de quadros ou de massas. Funcionam como antigos clubes ingleses, frequentados por conspícuos e elegantes senhores, que discursam e procedem bem, mas não conseguem sensibilizar o grande colégio eleitoral composto pelas classes B, C e D, responsáveis pelos resultados finais. Ocasionalmente, algum representante dessas agremiações emerge para derrotar alguém oriundo de sigla popular. Quando tal acontece, a responsabilidade recai sobre o candidato derrotado, mas não sucede em função da suposta popularidade do vencedor.
Coube ao talento de Getúlio Vargas descobrir que o proletariado brasileiro existia, mas esquecido pelas elites. O presidente Lula foi quem tomou a iniciativa de dar-lhe organização político-partidária, retirá-lo dos bastidores e trazê-lo ao proscênio, onde já não é mero figurante, ou massa de manobra, pois passou a integrar o elenco principal.
O PSDB corre perigo de se transformar na versão ressurecta da extinta UDN; o DEM poderá voltar a ser o PFL, do qual não conseguiu desencarnar.
Até as eleições de outubro, dias, semanas, meses voarão nas asas do vento. Ou a oposição aceita o repto lançado pela situação, e disputa a Presidência para valer, ou estará derrotada no próximo semestre. Quem viver verá.
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