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terça-feira, agosto 03, 2010

ELEIÇÕES 2010 [In:] PROMESSAS DE CAMPANHA NÃO SE EFETIVAM.

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Um sistema eleitoral remendado por esparadrapo

Valor Econômico - 03/08/2010

Olhando de fora, parece conversa de surdos. "Quando não for mais presidente, vou ser um leão para que o meu partido assuma a responsabilidade, junto com outros, de fazer uma reforma política para que a gente possa ter as coisas mais visíveis", disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na sexta-feira. "O Lula não aceitou minha proposta de reforma política e nem o Fernando Henrique tentou fazer. Você sabe que o Lula e o Fernando Henrique são mais parecidos do que parecem? Eu conheço bem os dois e posso garantir", disse o candidato tucano à Presidência, José Serra, em entrevista à Rádio Jornal, no Recife, no dia 16. E garantiu: "Eu vou bancar a reforma política neste país, vou peitar e bancar." Continuando a conversa em que todos falam e ninguém escuta, as candidatas Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (PV) defendem uma Constituinte exclusiva para a reforma política. Marina inclui entre os temas da Constituinte as reformas tributária e trabalhista, que também esbarram nos interesses particulares dos parlamentares.

Existem razões nada sutis para que todos teoricamente concordem com a necessidade de uma reforma política, sempre, e ela não aconteça, nunca. As mudanças na lei que de vez em quando ocorrem respondem a profundas crises políticas e são tópicas e superficiais. A falta de visão integral, totalizante, holística, do processo político-eleitoral, e a ausência de interesse da maioria dos parlamentares na mudança do status quo, levam a modificações homeopáticas, destinadas apenas a dar uma satisfação à opinião pública, que não têm o poder de sanar os vícios do sistema político.

A divergência de interesses e opiniões entre os atores que se movem nesse cenário - políticos e partidos - é um grave impeditivo de uma reforma mais profunda. Sequer existe unidade entre as pessoas que defendem intervenções mais decisivas no sistema, porque o diagnóstico e as mudanças defendidas por eles são divergentes, inconciliáveis até.

O presidente Lula, por exemplo, está comprometido com a visão do PT, que tem reiterado decisões partidárias favoráveis ao financiamento público de campanha e à adoção do voto em listas partidárias nas eleições proporcionais - os votos a vereadores, deputados estaduais e federais não seriam dados ao candidato, mas ao partido, que nas suas instâncias internas decidiria a ordem dos candidatos nas listas. O partido teria as cadeiras em número correspondente aos votos obtidos pela lista, num sistema proporcional. As vagas seriam preenchidas pela ordem da lista.

Para o candidato do PSDB, José Serra, a salvação do sistema eleitoral e partidário está na mudança do sistema proporcional para o sistema distrital puro. É uma visão às avessas à do PT. Enquanto a visão do partido de Lula remete às estruturas partidárias a escolha de seus representantes, a ideia de Serra é personalizar a escolha. Pelo sistema distrital puro, no caso das eleições para deputados federais, por exemplo, o Estado seria dividido geograficamente pelo número de cadeiras a que tem direito na Câmara. Os partidos podem competir com apenas um candidato por distrito. Seria eleito o mais votado - a eleição, portanto, seria majoritária.

A mudança do voto, de proporcional para majoritário, para a escolha de deputados, é uma diferença fundamental de concepção. Há divergências insanáveis também no que diz respeito ao financiamento público de campanha. O PT também não tem como se indispor com os pequenos partidos que compõem a sua base de apoio e dificilmente vai apoiar a adoção da cláusula de barreira - dispositivo que exige um mínimo de desempenho eleitoral para que a legenda continue funcionando. Somente nessas últimas duas questões já se levantam visões diametralmente opostas: o financiamento público é considerado, pelo PT e seus aliados, como fundamental para a moralização do processo eleitoral; a cláusula de barreira é vista como condição para acabar com a pulverização partidária, que dificulta (e encarece) a formação de governos de coalizão.

Existem muitas questões a se debater; há muitos interesses em jogo. Mas não se pode negar que esse é um debate inadiável. O sistema político brasileiro é herança de um passado repleto de períodos autoritários e de mudanças eventuais. É quase um Frankenstein. É preciso dar substância, lógica e congruência aos partidos e ao processo eleitoral. O que não se pode mais é remendar sistematicamente as leis eleitoral e partidária com esparadrapos.

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