SÃO PAULO – Dada como certeza no início da campanha, mas abalada pela reta final do primeiro turno, a vitória de Dilma Rousseff nas eleições presidenciais traz a expectativa de manutenção das políticas de distribuição de renda e de crescimento econômico, mas dúvidas quanto à sustentação dos gastos públicos.

Repartida em muitas propostas isoladas, a ideia transmitida pela candidatura de Dilma Rousseff ao Planalto foi a de manter as linhas do governo Lula, como a manutenção do tripé metas de inflação, câmbio flutuante e equilíbrio fiscal, associada à busca por políticas de redistribuição de renda, investimentos em infraestrutura e o fortalecimento de estatais e grupos empresariais privados.

Por mais méritos pessoais que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenha, muito do que há de “bendito” no legado para o próximo governo resulta de um processo de reconstrução institucional e econômica, iniciado ainda na década de 1990, em que PT e PSDB tiveram papéis preponderantes.

Fragmentação

Entretanto, a base de apoio político ao Governo deverá ser formada principalmente pelo próprio PT – que possuirá a maior bancada na nova Câmara dos Deputados - e PMDB, conhecido por seu grande apetite por cargos públicos.

PCdoB, PR, PDT, PRB, PSC, PSB, PTC e PTN completam a provável base de apoio ao governo Dilma, que deverá angariar cerca de 73% das cadeiras na Câmara e 75% no Senado.

Com ampla maioria no parlamento e a força da vitória presidencial, seria possível projetar a concretização de reformas importantes, como a tributária, bem como promover um ajuste fiscal no início do mandato, para agradar aos mercados – medida que foi negada de modo veemente durante a campanha.

Contudo, mesmo que recebam prioridade na agenda do próximo governo, os projetos podem esbarrar no controverso resultado das eleições para o Congresso, que fortaleceu a posição de alguns partidos menores, bem como na sólida posição dos partidos de oposição no comando de bancadas estaduais.

Acaba a eleição, uma nova disputa

Passada a definição nas urnas, o grupo político que apoia Dilma Rousseff travará dura disputa interna sobre a distribuição dos cargos importantes, como o controle de estatais e de ministérios.

Neste contexto, as principais variáveis serão o poder de barganha do PMDB – enfraquecido da Câmara, mas fortalecido no Senado – e do grupo petista que capitaneou a campanha de Dilma, formado por políticos como Antônio Palocci e José Eduardo Cardozo.

Trio de ferro

Amplamente identificado com a promoção de políticas macroeconômicas “pró-mercado”, o ex-ministro da Fazenda Palocci terá dificuldades para impôr seus nomes junto ao primeiro escalão, em função das acusações de envolvimento no escândalo do “Mensalão” e de abuso de poder.

Certamente, a manutenção de figuras-chave do governo Lula também será debatida, como Henrique Meirelles e Luciano Coutinho, presidentes do Banco Central e do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), respectivamente. Nem mesmo a manutenção de Guido Manteda na Fazenda pode ser descartada.

Ainda assim, “o mercado parece ter convergido para a visão de que o gabinete econômico será o de melhor cenário, composto por Palocci, Coutinho e Meirelles”, afirmou o analista Emy Shayo Cherman, em relatório do banco de investimentos JPMorgan.

Em resumo, as expectativas são de baixa probabilidade de reformas – tributária, previdenciária ou trabalhista -, associada à manutenção das linhas macroeconômicas adotadas pelo governo Lula. Surpresas positivas podem decorrer de um limitado corte de gastos públicos, foco em investimentos e redução na relação entre dívida líquida e PIB (Produto Interno Bruto).