Ministro da Fazenda afirma que obras em andamento continuarão recebendo recursos. Outros projetos correm o risco de ser adiados
Antes intocáveis, os recursos destinados ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) entraram na linha de tiro do governo. Em 2011, o corte de gastos programado pela União não vai poupar obras que até há pouco tempo eram consideradas prioritárias. A equipe econômica nomeada pela presidente eleita, Dilma Rousseff, quer apertar o cinto como forma de criar condições para que os juros básicos (Selic) recue. Prevista para janeiro, a elevação da taxa está nos planos do Banco Central (BC) para fazer frente à inflação acumulada e acalmar as expectativas do mercado. Nos últimos meses de 2010, o repique de preços dá sinais claros de que escapou do controle.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem no Rio de Janeiro que obras em andamento seguirão o curso normal, mas aquelas que ainda não tiveram os projetos executados correm risco de ficar para depois. “O PAC poderá ter alguma postergação. Tem projetos que estão terminando este ano ou que estão para terminar nos próximos anos. Esses não serão mexidos”, explicou Mantega. Segundo o ministro, o aperto que será feito pelo próximo governo atingirá todas as áreas. Técnicos dos ministérios da Fazenda e do Planejamento calculam quanto seria necessário cortar do orçamento geral — em discussão no Congresso Nacional — para equilibrar as contas.
Sacrificar o PAC soma-se a outras medidas igualmente duras já anunciadas pelo governo na tentativa de melhorar o ambiente macroeconômico e adiar o início do ciclo de alta da Selic. Na semana passada, o BC ampliou o compulsório bancário, o que encareceu o crédito, encurtou os prazos e retirou R$ 61 bilhões de circulação. O efeito sobre a economia foi instantâneo. As taxas ao consumidor subiram e os financiamentos de automóveis novos, além de mais curtos, passaram a exigir entradas maiores. Nas estimativas do mercado, o arrocho promovido pela autoridade monetária teve reflexo semelhante a uma elevação de 0,5 ponto percentual na Selic — atualmente em 10,75% ao ano.
Outra mudança importante planejada pelo próximo governo diz respeito ao aumento do capital privado para financiar a expansão da infraestrutura. Mantega afirmou que o papel anticíclico do Estado foi cumprido durante e no período pós-crise internacional e que, agora, o momento é de estimular o setor privado a cumprir seu papel. De acordo com o ministro, a intenção é reduzir os subsídios e a importância quase hegemônica do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no financiamento de longo prazo. “A partir de 2011, vamos reduzir gastos de custeio e subsídios, vamos reduzir recursos para o BNDES para o setor privado entrar”, disse.
Nos últimos dois anos, o banco estatal de fomento recebeu aportes do Tesouro Nacional de quase R$ 200 bilhões. O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, afirmou ontem que o pacote baixado pelo BC, que alterou o compulsório bancário e reorientou a política de financiamento de longo prazo, vai interferir no sistema de crédito como um todo. Para ele, a relação crédito e Produto Interno Bruto (PIB) não deverá chegar a 49,5% neste ano — hoje, ela está em 47,2%.
Alerta
O choque contra a inflação dado pelo Banco Central na semana passada por meio do aumento no compulsório terá impacto negativo sobre os ratings (avaliação de risco) dos bancos brasileiros. O alerta foi feito ontem pela agência de classificação Moody’s. Bancos de médio porte, com forte atuação no crédito ao consumidor, e aqueles que se financiam no atacado devem ser os mais atingidos.
Aperto afetará bens duráveis
O aperto promovido pelo Banco Central (BC) para conter a expansão do crédito e esfriar a economia deve diminuir o consumo e prejudicar a atividade industrial brasileira. Na avaliação do gerente executivo de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco, as medidas, que tornaram os financiamentos mais caros e menos longos, terão impacto na demanda por bens duráveis, como os automóveis e os eletrodomésticos.
Castelo Branco argumenta que o aumento dos depósitos compulsórios e a elevação para 20% do valor da parcela mínima de pagamento nos cartões de crédito encarecerão o custo dos financiamentos. “Essas medidas devem causar um arrefecimento maior nos primeiros meses de 2011. Qualquer restrição monetária vai impactar em queda no nível de expansão de produção da indústria”, destacou.
Na sua avaliação, até os produtos pagos à vista devem sofrer. “Como a renda é uma só, quando você faz uma alteração dessa natureza, os consumidores terminam alterando suas decisões de consumo. Existe impacto em todos os mercados, mais concentrados naqueles que dependem de crédito”, ressaltou. O economista crê que as medidas tomadas pelo BC sinalizam um aumento da taxa básica de juros.
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