Em discurso no Congresso, governo tenta convencer os parlamentares a não aprovar um piso superior a R$ 545. Argumentos incluem aumento da inflação e ameaça de se descumprir acordos A posição dúbia de parte dos aliados na votação do reajuste do salário mínimo levou o Palácio do Planalto a tentar atemorizar aliados e oposicionistas para conseguir a aprovação dos R$ 545 na votação de hoje à tarde. O governo comandou, durante todo o dia de ontem, uma força-tarefa para amarrar a votação em plenário. Convocou ministros e deputados e ameaçou aliados. Mas, diante da indefinição de parte das legendas governistas, a exposição do ministro da Fazenda, Guido Mantega, serviu para transmitir um recado claro: “É muito ruim para todos que a gente descumpra o acordo. Significa que outros acordos podem não ser cumpridos”, avisou, acrescentando que um reajuste acima do estipulado pela equipe econômica pode, inclusive, pressionar a inflação.
O Palácio do Planalto iniciou a terça-feira colocando em prática uma estratégia traçada nos últimos dias. Logo no início da manhã, o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, presidente licenciado do PDT, e o deputado federal e sindicalista Paulo Pereira da Silva (PDT-SP) foram chamados ao Palácio do Planalto e pressionados a seguir a orientação do governo (leia mais na página 3). Ao mesmo tempo, o secretário executivo da Fazenda, Nelson Barbosa, e o ministro de Relações Institucionais, Luiz Sérgio, além de Mantega, foram à Câmara expor a preocupação com a volta da inflação caso as propostas defendidas pela oposição — R$ 560, R$ 580 e R$ 600 — sejam aprovadas. Da Casa Civil, o ministro Antônio Palocci disparou ligações para deputados do PT e da base aliada.
Nesse esforço concentrado, o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), simulou uma previsão de votos favoráveis à posição do Executivo. Na reunião com os líderes aliados, ouviu que o PMDB poderia prometer 60 dos 77 votos da bancada. O PR, o PCdoB e o PT disseram que todos os seus parlamentares apoiarão o mínimo defendido pelo Planalto. Já o PSB informou que a tendência é o partido seguir a proposta oficial. O PDT, entretanto, deve liberar a bancada.
A previsão do Planalto chegou à conta de 300 votos, número suficiente para garantir uma vitória segura em favor dos R$ 545. “Apenas o PDT decidiu que não acompanhará o governo. Temos conforto para debater e aprovar a questão na Câmara, porque nossa tese está correta. É fácil fazer demagogia na eleição, prometer R$ 600 num ano e passar os quatro seguintes arrochando o mínimo”, disparou Vaccarezza. Um dos fatores de confiança do governo é a divisão da bancada da oposição, que, rachada por conta da sucessão nos partidos, não conseguiu consenso em torno de um valor para o salário-base (veja a página 4).
Insegurança O fator de insegurança, entretanto, é a posição dúbia de alguns aliados. Embora tenham prometido boa parte dos votos para o governo, as legendas da base não fecharam questão, como pressionava o Planalto. Na prática, a atitude significa que os deputados desses partidos não poderão ser punidos caso descumpram a determinação de votar pelos R$ 545. Com a janela aberta por essas siglas para possíveis traições, Mantega fez uma exposição focada na temeridade de se aprovar uma cifra superior à defendida pelo governo, em meio às manifestações dos sindicalistas que lotaram as galerias.
O ministro mostrou impactos consideráveis na inflação e nas contas públicas para rechaçar os valores defendidos pelos sindicalistas, pela oposição e pelo PDT. “Não temos condições, do ponto de vista fiscal, de aumentar a despesa”, apelou Mantega. Nos discursos seguintes, sindicalistas e oposição acusaram o governo de querer cobrar do trabalhador a farra orçamentária do ano eleitoral. “Estamos fazendo um cavalo de batalha com o governo para aprovar um reajuste de R$ 0,5 por dia para o trabalhador, o que não dá nem para comprar dois pãezinhos”, reclamou Paulo Pereira da Silva.
A votação do mínimo está marcada para a sessão de hoje da Câmara. Por acordo, o projeto de lei que estabelece a remuneração de R$ 545 e a política de reajuste do piso até 2015 serão votados primeiro. Em seguida, serão apreciadas as emendas que aumentam o valor proposto pelo governo.
Correção do IR Cândido Vaccarezza confirmou que o Palácio do Planalto editará uma medida provisória com o valor da correção da tabela do Imposto de Renda assim que o reajuste do mínimo for aprovado na Câmara. A ideia é de que o índice seja de 4,5%, caso os parlamentares confirmem os R$ 545 defendidos pelo governo para o piso salarial. Caso um valor superior ao estabelecido seja aprovado, a correção pode ser inferior a esse percentual. “Vamos esperar a votação do mínimo, porque só temos um orçamento”, explicou Vaccarezza. |
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