Enviado por Ricardo Noblat -
29.7.2013
| 12h00m
GERAL
Fabíola Meira de Almeida Santos,
O Globo
Certamente vocês estão se perguntando: qual a relação do indivíduo mais procurado do planeta, Edward Snowden, com os consumidores brasileiros? É direta: ao aceitar “Políticas de Privacidade” e “Termos de uso” que se revestem de legalidade por prestar informações supostamente “claras”, o consumidor, mesmo sem plena consciência do fato, chancela a possibilidade de o fornecedor coletar seus hábitos mais íntimos durante a navegação — fazendo uma busca, enviando um e-mail ou adquirindo produtos e serviços.
No entanto, não temos dúvidas de que qualquer “Política de Privacidade” ou “Termo de uso” que viole a Constituição Federal, o Código Civil (direitos da personalidade) e o Código de Defesa do Consumidor, ainda que o internauta, vulnerável, emita seu “aceite”, será considerado abusivo e, portanto, nulo de pleno direito.
Em outras palavras, será considerado como não escrito e, nestes termos, a autorização de transmissão de dados chancelada pelo consumidor não surtirá efeitos. Mais: a prática daquele que violou, espionou e transmitiu dados será ilícita.
Ora, se por simples atos de navegação e compra os consumidores brasileiros são frequentemente monitorados, não é nenhuma surpresa o fato de a NSA (Agência de Segurança Nacional dos EUA) contar com a colaboração “profunda e continuada” das multinacionais americanas (entre elas, Google, Facebook, Skype, YouTube). E não apenas para fins de monitoramento geopolítico ou questões de segurança, mas também para obtenção de segredos comerciais.
Daí não se pode afirmar que a notícia causou repulsa, pois caso as autoridades estivessem preocupadas com o que se tem afirmado há muito tempo acerca da violação da privacidade dos consumidores na internet, certamente já teriam concluído que a espionagem, poderia, sim, afetar a soberania nacional, pois estas informações estariam sendo compartilhadas não apenas para oferecimento de publicidade na rede, mas para diversas outras finalidades.
O ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, afirmou que não é lícito que um país tenha controle sobre a internet. Ora, se já é inadmissível o controle da rede por um país sob a justificativa de segurança, o que dirá sobre o controle da internet, hoje assumidamente nas mãos de somente uma empresa, o Google.
A preocupação não se restringe à privacidade do consumidor. Implica também na violação da privacidade entre fornecedores concorrentes, que têm seus dados coletados de forma a gerar captação de clientela por meio da violação da liberdade de escolha do consumidor que, por sua vez, não tem ideia de como foi monitorado ao receber resultados de busca não de forma neutra, mas manipulada.
Daí a relação com Snowden. A espionagem no campo das relações de consumo pode ser traduzida, de forma simples, pela abusividade da prática de extrair vantagem manifestamente excessiva do consumidor e violar sua liberdade de escolha.
Os órgãos de proteção e defesa do consumidor, bem como de combate às práticas anticoncorrenciais, precisam fiscalizar e estar atentos aos problemas contemporâneos da era digital.
Fabíola Meira de Almeida Santos é advogada.
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