A dois votos de um novo julgamento
Supremo decide hoje se um tipo de recurso poderá ser aplicado no mensalão. Como dois ministros que ainda vão votar já se posicionaram a favor dos chamados embargos infringentes, 11 réus devem ser julgados outra vez
DIEGO ABREU
AMANDA ALMEIDA
Cinco ministros definem hoje os próximos passos de um processo que consumiu 53 sessões do Supremo Tribunal Federal em sua primeira fase e mais nove na etapa de recursos.
O STF está a dois votos de aceitar um novo julgamento em relação a 11 réus, o que deve levar o processo a se estender pelo menos até o ano que vem.
Nesta quinta-feira à tarde, os ministros Ricardo Lewandowski e Celso de Mello devem votar pelo cabimento dos embargos infringentes e selar a decisão pela validade do recurso que levará a Corte a julgar novamente os condenados em relação aos crimes em que tenham recebido ao menos quatro votos pela absolvição.
O julgamento foi suspenso ontem com o placar de 4 votos a 2 pelo cabimento dos infringentes. A sessão terá continuidade a partir das 14h de hoje, dia que deve marcar o desfecho de mais uma fase da Ação Penal 470. O possível entendimento no sentido de que os novos recursos são válidos resultará em atraso na prisão de réus e em benefício para três petistas, que poderão escapar de cumprir pena em regime fechado, passando para o semiaberto (leia mais nas páginas 3 e 4).
O julgamento foi retomado ontem, a partir do voto do ministro Luís Roberto Barroso. Em frente ao STF, um pequeno grupo de manifestantes levaram uma cela, com a foto de réus do processo. Na semana passada, o único ministro a votar havia sido o relator do caso e presidente do STF, Joaquim Barbosa. Ele se posicionou contra a validade dos infringentes por entender que este recurso está revogado, embora previsto no Regimento Interno do STF, por não estar estabelecido na Lei nº 8.038/1990, que regula a competência recursal do Supremo.
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Por enquanto, porém, está prevalecendo a posição do ministro Barroso, que não havia participado do julgamento no ano passado, pois tomou posse somente em junho de 2013. Barroso afirmou que a lei mencionada pelo relator do processo não revogou expressamente o regimento e tampouco é incompatível com o conjunto de regras que rege o STF. “Mesmo que se queira cogitar da supressão dos infringentes, penso que seria imprópria uma mudança da regra do jogo quando ele se encontra quase no final. Não há por que sujeitar um processo tão emblemático a uma decisão casuística, de última hora”, frisou Barroso, ao votar pelo cabimento dos infringentes.
O único réu a apresentar embargos infringentes até então foi o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares. Caso confirmada a tendência pela validade desse recurso, pelo menos outros 10 réus recorrerão após a publicação do acórdão (documento que resume decisões tomadas no plenário) dos embargos de declaração, que foram usados para contestar contradição, omissão e obscuridade. Em relação a esses recursos, somente dois réus conseguiram revisão de pena: o ex-assessor do PP João Cláudio Genu e o ex-sócio da corretora Bônus Banval Breno Fischberg.
Embora tenha votado a favor dos infringentes, Luís Roberto Barroso defendeu agilidade no processo. “A exemplo de toda sociedade brasileira, eu também estou exausto desse processo. Ele precisa chegar ao fim. Temos que virar esta página. Ninguém deseja o prolongamento desta ação. Mas é para isso que existe a Constituição, para que o direito de 11 não seja atropelado pelo interesse de milhões”, disse Barroso.
O voto dele acabou seguido pelos ministros Teori Zavascki — que também não julgou o mensalão em 2012 —, Rosa Weber e Dias Toffoli. O único a acompanhar o voto de Joaquim Barbosa até então foi Luiz Fux. Ainda votarão Cármen Lúcia, cujo voto é uma incógnita; Lewandowski e Celso de Mello, que devem votar pelo cabimento dos infringentes; além de Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello, contrários ao novo recurso.
“Juízes inexperientes”
Ao votar, Teori Zavascki citou o Pacto de São José da Costa Rica, do qual o Brasil é signatário, para observar que os réus têm assegurado o duplo grau de jurisdição, que nada mais é que o direito de ser julgado duas vezes, e não apenas uma. Ele também afastou o argumento de Barbosa de que os infringentes estariam revogados do regimento pela Lei nº 8.038. “Salvo quando ficar evidente o intuito do legislador de manter uma lacuna legislativa, deve se suprir as lacunas mediante a aplicação das normas gerais.”
Rosa Weber seguiu a linha de argumentação de Barroso. “A Lei nº 8.038 não revogou expressamente o artigo 333 do regimento interno do STF”, avaliou. Antes da sessão, a ministra não deu pistas sobre como votaria e, por isso, a sua decisão era aguardada como uma das de maior impacto em relação ao resultado final.
Depois de Rosa, Luiz Fux enumerou argumentos contrários aos infringentes. Para ele, o artigo que continha a previsão dos recursos caiu com a aprovação da lei de 1990. Além da discussão técnica, Fux criticou a possibilidade de uma nova análise das acusações. “O ‘rejulgamento’ da matéria seria como se sua primeira manifestação tivesse sido um ensaio para um pretenso posterior julgamento definitivo”, analisou.
Fux ainda fez uma provocação aos colegas: “O segundo julgamento é melhor?”, questionou. “Talvez porque sejamos juízes inexperientes”, ironizou Marco Aurélio, ao sinalizar que votará pela rejeição dos infringentes. Ainda em seu voto, Fux criticou a quantidade de recursos possíveis na Justiça brasileira. “O Brasil padece de uma moléstia gravíssima que é a prodigalidade recursal.” Dias Toffoli foi o último a votar na sessão de ontem e também acompanhou Barroso. Para ele, ao não revogar expressamente o artigo que trata dos embargos infringentes, a Lei nº 8.038 manteve sua validade.
“Não há por que sujeitar um processo tão emblemático a uma decisão casuística, de última hora”
Luís Roberto Barroso, ministro do STF
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