Ministro na corda bamba
Chefe de gabinete e mulher de Manoel Dias são investigados pelo TCE-SC, que vai acionar o TCU
GeraldaDoca
Thiago Herdy
-Brasília e São Paulo-
Com a queda em sequência dos principais assessores nos últimos dias, a permanência do ministro do Trabalho, Manoel Dias, no cargo, ficou ainda mais delicada ontem depois das denúncias de irregularidades em convênios da pasta, envolvendo sua mulher, Dalva Dias, presidente do PDT em Florianópolis (SC), e seu chefe de gabinete, Rodrigo Minotto.
Embora o Planalto negue a demissão, um interlocutor próximo a Dias avalia que sua situação fica insustentável quando o problema chega "dentro de casa"! Reportagem publicada pelo jornal "O Estado de S. Paulo" revelou a existência de um processo de investigação no Tribunal de Contas de Santa Catarina (TCE-SC), que aponta a participação de Dalva, quanto era secretária de Assistência Social, Trabalho e Habitação do Estado, em contratos com entidades ligadas ao PDT, sem licitação e uso indevido de dinheiro público.
A gestão de Dalva Dias foi no período de 2007 e 2010, no governo de Luiz Henrique da Silveira (PMDB). Relatórios do TCE apontam suposto dano e favorecimento de três entidades, uma delas ligada ao PDT, em parcerias firmadas na gestão de Dalva. Dos R$ 2,1 milhões previstos para o convênio, 83% vinham do Ministério do Trabalho, na época comandado por Carlos Lupi (PDT-RJ).
As entidades contratadas deveriam dar cursos profissionalizantes variados a trabalhadores, como de vigia e costureiro, através do Programa Estadual de Qualificação Profissional, mantido pela secretaria e executado pelo Sine. A secretaria autorizou ou fez gastos de quase R$ 400 mil indevidamente, segundo o TCE.
Por falta de competência legal, o Tribunal de Contas local vai enviar nesta semana os relatórios técnicos ao Tribunal de Contas da União (TCU), com pedido de tomada de contas espe-ciai nos convênios suspeitos. Além de outras ir: regularidades, há suspeita de relação de alunos fantasmas nos cursos de capacitação.
NOTA DO MINISTÉRIO TEM CONTRADIÇÕES
Numa nota cheia de contradições, Manoel Dias tentou se defender dizendo que as acusações são "infundadas" e que a reportagem "traz uma série de informações distorcidas" A nota afirma que o assunto já fora analisado pelo TCU, que emitiu, inclusive, certidão negativa no nome de Dalva e de Rodrigo Minotto, que dirigia, à época, o Sistema Nacional de Emprego (Sine) em Santa Catarina. Hoje Minoto é chefe de gabinete de Manoel Dias no MTE.
"Lamentamos a publicação de uma matéria que tem claramente por objetivo levantar, de forma oportunista, um episódio já deliberado pelo órgão de controle" diz a nota. Mas o ministro foi desmentido pelo TCU. A assessoria de imprensa do Tribunal esclareceu que a análise foi restrita à dispensa de licitação.
"O TCU analisou exclusivamente a regularidade ou não do uso de dispensa de licitação. Apenas isso. As irregularidades na execução do convênio não foram analisadas" explicou o TCU em nota.
A nota do Ministério do Trabalho alega ainda que as irregularidades constam apenas de um parecer da área técnica do TCE e que ainda não foram analisadas pelo plenário da Corte. Mas o presidente do Tribunal local, conselheiro Salomão Ribas Júnior desmente. Segundo ele, foi o próprio plenário que decidiu no início deste mês remeter o relatório para o TCU porque os convênios envolvem recursos de mais de uma fonte (União e estado).
— Eles (Dalva e Rodrigo) não foram condenados, mas também Mo estão livres. Vão ter que se explicar — disse o -conselheiro.
Entre as irregularidades, ele citou o convênio com o Instituto Wilson Picler, que gastou R$ 62 mil na compra de bens permanentes, o que o programa destinado à formação de trabalhadores não permite, pois se limita a despesas com custeio. A mesma entidade também usou R$ 16 mil para comprar 82 bicicletas que seriam distribuídas aos alunos como brindes, uma "despesa desprovida de interesse público" na avaliação do conselheiro do TCE.
Nos contratos assinados pela mulher do ministro com ONGs, aparecem despesas da ordem de R$ 318 mil, sem comprovação, de acordo com o TCE. São gastos "genéricos" não identificados, apontados no relatório técnico.
Na nota, o Ministério do Trabalho informou, no entanto, que o caso será investigado. "A prestação de contas do convênio em questão será objeto ainda de análise de força-tarefa do Ministério do Trabalho que irá apreciar eventuais pendências existentes em todos os convênios celebrados, conforme já anunciado pelo ministro. Caso seja apontado algum erro de execução, as entidades conveniadas serão notificadas para os devidos esclarecimentos e responsabilização" afirmou o órgão.
Essa não é a única investigação sobre a existência de fraudes nos convênios da pasta em Santa Catarina. Há um inquérito correndo em segredo de Justiça no Ministério Público Federal (MPF) do estado sobre desvio de dinheiro do Projovem. As ações judiciais são referentes a convênios em Criciúma, Florianópolis e São Bento do Sul. No caso de São Bento do Sul, o MPF propôs ação contra o prefeito, Magno Bollmann, e a devolução de quase R$ 800 mil pela contratação sem licitação da Associação ADRVALE, presidida por Osmar Boos, que pertence ao quadro do PDT.
No meio disso tudo, numa espécie de intervenção branca, a ministra chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffinann, decidiu que técnicos auditores de sua pasta vão participar da comissão de fiscalização dos convênios do MTE, criada por Manoel Dias.
DENÚNCIA DE PECULATO EM 1998
Além da investigação sobre o período em que era secretária estadual em Santa Catarina, Dalva Dias é acusada também de peculato (apropriação por funcionário público de dinheiro ou bem de que tem posse em razão do cargo) por desvio de recursos de atividades de aperfeiçoamento de professores da rede pública estadual, nos anos 90. De acordo com a denúncia, apresentada pelo Ministério Público em 1998 e aguardando julgamento da Justiça catarinense, Dalva era responsável pelo desenvolvimento pedagógico dos cursos oferecidos pela Secretaria de Educação em parceria com a Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), da qual era funcionária. Na época a universidade recebeu para realização do curso valores que hoje correspondem a R$ 1,1 milhão.
Para se apropriar de recursos, ela e outros seis funcionários produziram prestações de contas com nomes de alunos e professores fictícios, segundo o MR Em fevereiro de 1992, Dalva recebeu um cheque de R$ 63,6 mil (em valores atualizados) para pagamento de "cursistas e outras despesas indispensáveis ao curso" Segundo perícia realizada pelo MP nos extratos bancários de Dalva, ela depositou R$ 40,7 mil do total em sua conta particular.
Com isso, "obteve altos rendimentos propiciados pela ciranda financeira na época dos fatos, ainda que, como meio de não levantar suspeitas e atenção em demasia, tenha efetuado pagamentos parciais a cursistas e fornecedores" escreveram os promotores André Carvalho e Raul Rogério Rabelo na denúncia. O processo está em fase de apresentação de alegações finais por parte dos acusados, e prestes a ser julgado.
O ministério do Trabalho não se manifestou sobre a denúncia envolvendo Dalva na época em que ela era funcionária da Udesc. A reportagem não conseguiu localizá-la.
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