Renan Calheiros (PMDB-AL) considera-se abandonado pelos aliados. Queixa-se de todos, inclusive de Lula e de seu próprio partido. Nas últimas 48 horas,
passou a utilizar, entre quatro paredes, uma arma que destoa da frieza que exibe em suas aparições públicas:
a ameaça. Disse claramente a um grupo de interlocutores que, se lhe der na telha, pode criar “uma crise institucional”.
Declara-se inclusive disposto a prejudicar Lula e seu governo. Num instante em que a hipótese de perda de mandato já não parece tão improvável,
Renan diz, em privado, que, se cair, não irá ao chão sozinho. Afirma que
arrastará consigo outros senadores. Chega mesmo a difundir, em timbre inamistoso, a informação de que
não hesitará em revelar segredos de alcova dos colegas. Diz que sua privacidade foi invadida sem constrangimentos. E
não se julga na obrigação de guardar as confidências alheias. Na noite de terça-feira (19), dois senadores do PT tentaram convencer
Renan a desistir de votar no Conselho de Ética o relatório que sugeria o arquivamento do processo contra ele. Embora informado acerca do risco de derrota, o presidente do Senado bateu o pé. Queria uma definição.
Afirmou que, se o conselho não encerrasse o episódio, ele passaria a considerar a hipótese de provocar uma crise, envenenando o cotidiano do Legislativo. As pessoas que privam da intimidade de Renan acham que ele começou a exibir sinais de desespero. Oscila momentos de excitação a instantes de ira.
Não raro, investe contra Lula. Renan considera-se credor do Planalto. Diz ter agido no Legislativo para preservar Lula na crise que se seguiu ao escândalo do mensalão, em 2005. E
acha que, agora, no momento em que mais precisa de ajuda, o governo lavou as mãos.Ao longo desta quarta-feira (20), Renan manteve o tom belicoso em seus diálogos reservados. Sentiu que o chão lhe fugira dos pés no instante em que foi informado, no meio da tarde, de que o senador Valter Pereira (PMDB-MS), que tinha como um aliado fervoroso, passara a defender não o arquivamento, mas o aprofundamento das investigações. Renan duvidou. Só deu o braço a torcer depois de certificar-se de que o companheiro de partido já havia até mesmo protocolado na mesa diretora do Conselho de Ética um voto alternativo ao de Epitácio Cafeteira (PTB-MA). Mais cedo, Renan tentara uma aproximação com os “amigos” da oposição, com quem mantém uma relação civilizada. Disseram-lhe, delicadamente, que era tarde. A abertura de uma investigação mais criteriosa se impunha. No PT, o distanciamento tornou-se tão patente que o presidente do Conselho de Ética, o antes apressado Sibá Machado (PT-AC), ecoando as vozes da maioria do plenário, pregou a conveniência de um novo
adiamento do veredicto. Preferiu constituir uma comissão, para traçar os novos rumos da investigação -dessa vez sem pressa. A comissão contituída por Sibá é pluripartidária. Integram-na, além do próprio Sibá, senadores como Sérgio Guerra (PSDB-PE), que passara o dia alardeando que o Senado não poderia dar as costas para o Brasil; e Demóstenes Torres (DEM-GO), um promotor licenciado que insiste desde o início para que o Conselho de Ética faça uma apuração com começo, meio e fim.
Wellington Salgado, escalado na véspera para tentar salvar a pantomima sugerida no relatório de Cafeteira,
renunciou à relatoria menos de 24 horas depois de ter assumido. Súbito, Renan mandou dizer, por meio do amigo Romero Jucá (PMDB-RR), que deseja explicar-se pessoalmente ao Conselho de Ética, já nesta quinta-feira (21). Demóstenes redargüiu. Disse que a inquirição de Renan no conselho é um imperativo processual. Mas só deveria ser feita no final do processo. Não houve vozes destoantes. Era o sinal de que o grupo de Renan já não controlava o processo. Resta agora saber se a promessa de retaliação é mero blefe de um senador em apuros ou se Renan Calheiros vai mesmo criar uma crise.
À frente de uma campanha intitulada “Fora, Renan”, o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ) esteve nesta quarta com o senador José Sarney (PMDB-AP). Disse que iria iniciar uma guerra e que enxergava em Sarney um dos generais da tropa inimiga. Instou-o a pedir a Renan que renuncie. Seria, segundo disse, um modo de deixar a presidência do Senado antes que seja "escorraçado" do posto. Sarney disse a Gabeira que não se sente à vontade para levar semelhante proposta ao amigo. Disse, de resto, que confia na solidariedade dos colegas a Renan. Afirmou que o presidente do Senado enredou-se numa "questão que envolve mulher". E outros senadores já teriam passado pela mesma experiência. Haveria o que Sarney chamou de "solidariedade masculina". Gabeira insistiu: "Vai começar a guerra". E Sarney: "Sou isento do serviço militar, estou fora dessa guerra."
Folha Online, Escrito por Josias de Souza; foto matéria.
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