Situação poderia ter provocado nova tragédia, diz controlador
Uma pane ocorrida ontem em dois geradores de energia do Cindacta-4 (Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle do Tráfego Aéreo), em Manaus, obrigou os controladores de vôo do centro a trabalharem no escuro e a fazerem contato com órgãos de controle de aproximação por meio de seus telefones celulares. Apenas duas linhas de telefones fixos funcionaram durante a pane elétrica, segundo um controlador disse à Folha. Rádios e radares ficaram inoperantes. Com medo de retaliações, ele pediu para não ter o nome publicado. Ele disse que, após a falha, ocorrida por volta das 23h30, o sistema de "backup" geradores de reserva não funcionou. Segundo o controlador, a situação precária poderia ter levado a uma nova tragédia. A energia só foi retomada por volta das 2h. O Cindacta-4 cuida do controle do tráfego aéreo no Amazonas, Roraima e Mato Grosso e em parte do Pará. Funciona como "porta de entrada" do país, responsável por 90% do tráfego aéreo que evolui dos Estados Unidos e da América Central. Segundo o relato do controlador, havia 45 aeronaves sem condições de comunicação sobrevoando a região no momento da pane. "Tínhamos apenas dois telefones fixos, que funcionam em casos de emergência, para 12 controladores. A maioria dos contatos com outros órgãos de controle [de aproximação] em Belém, Manaus e Santarém, foi feita pelos nossos celulares." De acordo com o controlador, um avião ABSA Cargo Airline, de rota internacional, entrou no sistema sem contato com os radares e, a partir de Manaus, deveria trocar de altitude e não o fez, passando a sobrevoar a área na contramão. "A exemplo do que aconteceu com o Legacy [que colidiu com o Boeing da Gol no ano passado], poderia ter havido uma tragédia. A aeronave passou por Manaus sem contato e seguiu em nível incorreto. Só conseguimos fazer contato com a Venezuela para avisar da situação e a Venezuela foi quem teve que desviar as outras aeronaves do jato", disse. Para garantir a segurança dos vôos, o controlador disse que a idéia era fechar o espaço aéreo. "Queríamos separar as aeronaves que já estavam voando e, do nosso setor, mandar que todas pousassem." A rota de aeronaves seria desviada e os aviões que estavam em Manaus não poderiam decolar. Mas, segundo o controlador, houve resistência do comando do centro a essa medida. "O tenente-coronel Leonidas Medeiros de Araújo Jr., que é o subcomandante do Cindacta-4, ordenou que não fechássemos o espaço aéreo porque ninguém poderia saber o que estava acontecendo", disse. "Ele ameaçou prender os controladores caso não cumpríssemos as medidas. Estava tudo escuro e ele passou a dar as ordens com uma lanterna." Ele contou que, para que o espaço aéreo não fosse fechado, o subcomandante determinou que um grupo de cinco controladores se deslocasse à antiga torre de comando onde antes funcionava o centro de controle em Manaus e passasse a se comunicar por meio de um rádio de alta freqüência que não era utilizado desde 2002. "A divisão técnica da Aeronáutica está negligenciando a manutenção de equipamentos. O sistema está doente e as autoridades teimam em não reconhecer. O problema de falta de 'backup' já tinha sido anunciada e não fizeram nada." O comandante do Cindacta-4, coronel Eduardo Carcavalo, afirmou que não há negligência por parte da Aeronáutica em relação à manutenção dos equipamentos de geração de energia. Segundo ele, as declarações feitas à Folha pelo controlador ouvido pela reportagem são "irresponsáveis". "Nossos equipamentos estão em ótimas condições", disse. De acordo com o comandante, os geradores de energia funcionaram, mas, por algum motivo que ainda será investigado, não fizeram a conexão com o Cindacta-4. Isso levou o comando a acionar o "plano de degradação", utilizado quando ocorre falhas no sistema. Ele afirmou que os controladores são treinados para agir nesses casos e negou que tenha havido conflito entre comando e controladores em razão do deslocamento de uma equipe para a sala com rádio de alta freqüência. Negou ainda que controladores tenham sido ameaçados de prisão. "Somos treinados para utilizarmos os meios disponíveis. Isso é um procedimento comum. Prova de que tudo funcionou bem foi que as aeronaves conseguiram pousar, contatos com outros centros foram feitos e o plano foi executado com tranqüilidade." Ele disse ignorar que os contato tenham sido feitos por meio de celular. Carcavalo afirmou que ainda é cedo para apontar culpados pela pane. "Garanto que a Aeronáutica vai relatar exatamente tudo o que aconteceu. Não queremos esconder nada." MATHEUS PICHONELLI, da Agência Folha.
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