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quinta-feira, março 25, 2010
BRASÍLIA/ORQUESTRA SINFÔNICA [In:] UMA SOGRA (I)''LEGAL''
A ajuda milionária de Eurides ao genro
Sob a batuta de Eurides | |||||||||||||||
Autor(es): Lilian Tahan e Nahima Maciel | |||||||||||||||
Correio Braziliense - 25/03/2010 | |||||||||||||||
Deputada distrital destina R$ 10,5 milhões em emendas parlamentares à entidade que paga o salário de R$ 40 mil do seu genro
A ingerência da distrital Eurides Brito (PMDB) ultrapassa a esfera política. Filmada guardando dinheiro entregue por Durval Barbosa na bolsa, motivo pelo qual é investigada por quebra de decoro parlamentar, Eurides tem forte influência na cena cultural de Brasília. Mais precisamente na Orquestra Sinfônica da capital. Nos últimos três anos (incluindo 2010), ela destinou R$ 10,5 milhões, em emendas parlamentares, uma espécie de orientação de gastos sugerida pelos deputados ao governo, para a manutenção do trabalho dos instrumentistas profissionais. Entre os quais, seu genro, maestro de renome internacional, Ira Levin. Dos mais de R$ 10 milhões destinados por Eurides, R$ 5,9 milhões se confirmaram em pagamentos bancários endereçados à Orquestra Sinfônica. Cada distrital tem a oportunidade de indicar R$ 5 milhões por ano com emenda para até 40 projetos. Mas Eurides concentrou média anual de R$ 3,5 milhões para a manutenção da orquestra. O curioso é que antes de chegar ao seu destino final, os recursos fizeram escala na Associação de Amigos Pró-Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Claudio Santoro. Por ser considerada de utilidade pública, abre-se a brecha para que a entidade tenha condições de receber o dinheiro sem a necessidade de licitação, procedimento criado justamente para evitar direcionamento de verba pública. A autoria do projeto que confere essa qualidade à associação também é de Eurides Brito. Em 14 de maio de 2008, a distrital conseguiu a aprovação da Lei nº 4.145, que declara de utilidade pública à entidade. Entre as obrigações contratuais da associação está a de pagamento do salário de R$ 40 mil ao maestro Ira Levin. Mesmo diante da natureza diferenciada da associação, três pareceres elaborados pela Procuradoria-Geral do Distrito Federal em 2007, 2008 e 2009 orientaram que o vínculo entre a associação e a Orquestra Sinfônica deveria ser feito por meio de licitação, a menos que se apresentassem argumentos capazes de justificar a assinatura de convênio com a dispensa de concorrência pública. “A proposta apresentada nos autos poderia ser levada a efeito, todavia, há de se comprovar comunhão de ações voltadas para o alcance do objeto do convênio, do contrário, restaria configurada uma relação meramente contratual em que uma das partes presta o serviço e a outra processa a remuneração. E, nesse caso, o caminho apropriado seria o da licitação. Esses pareceres foram endossados pela própria assessoria jurídica-legislativa da Secretaria de Cultura, que orientou “cumprimento integral” dos documentos. Material gráfico Apesar da suspeita de contrariedade legal, os convênios foram celebrados. E desde novembro do ano passado são objeto de investigação do Ministério Público do Distrito Federal. A Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e Social (Prodep) se debruça sobre o caso para conferir, por exemplo, despesas da associação com material gráfico. Em 2009, a intenção da entidade era a de gastar quase R$ 1 milhão para a impressão de 152,2 mil revistas com informações sobre os concertos da Orquestra Sinfônica. Todo o material foi rodado na gráfica Reigraf Editora e Gráfica, que também está sob a mira do MP. Uma outra desconfiança da Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e Social paira sobre o sistema de contrapartida estabelecido entre a associação e o GDF, que repassa o dinheiro das emendas propostas por Eurides. Uma das obrigações descritas no convênio firmado entre o poder público e a entidade é a de oferecer uma compensação para os repasses autorizados. Essa contrapartida é o pagamento do salário do maestro Ira Levin, conforme está registrado no contrato assinado pelo presidente da Associação de Amigos Pró-Orquestra, Guilherme Quintas. Mas, em vez de bancar o valor, a associação conseguiu patrocínio do Banco de Brasília (BRB) para custear os pagamentos ao maestro. No entendimento do MP, essa triangulação contém indícios de irregularidade, já que repassa ao banco ligado ao GDF o compromisso atribuído à entidade sem fins lucrativos. Manutenção de atividades
A Associação de Amigos Pró-Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Claudio Santoro foi criada em 2007 para receber os repasses de emendas e as doações destinadas às atividades da orquestra. Entre 2007 e 2009, recebeu R$ 5,9 milhões, dinheiro destinado a realizar concertos sinfônicos semanais, concertos didáticos e populares, todos dentro do quadro da temporada da orquestra. De acordo com a deputada Eurides Brito, autora das emendas que autorizam os repasses, o dinheiro era destinado aos pagamentos de maestros e solistas convidados e ao programa de apresentações didáticas para estudantes da rede pública, projeto no qual 20 mil alunos são levados ao Teatro Nacional para assistir a concertos matinais. A atuação da associação, no entanto, é alvo de questionamento. Além do parecer contrário da Procuradoria do Distrito Federal sugerindo a inviabilidade de realização de convênios com a Pró-Amigos, o próprio secretário de Cultura, Silvestre Gorgulho, admite que já foi aconselhado pelo Ministério Público a deixar de lado a associação. “A associação surgiu na tentativa de criar uma entidade que pudesse receber patrocínios”, explica Gorgulho. Em 2010, os repasses já não serão mais feitos por meio da Pró-Amigos e sim diretamente na secretaria, mas a prestação de contas de 2008 e 2009 está sendo investigada pelo MP. Na orquestra, a dúvida é quanto ao destino dado às emendas de Eurides. Gorgulho alega que os R$ 5,9 milhões aprovados para 2008 e 2009 são pouco para manutenção das atividades da orquestra. Como é um órgão público, os salários dos músicos são pagos pelo GDF e não estão incluídos nesses repasses, que seriam dedicados exclusivamente à contratação de solistas e maestros convidados, pagamento de lanche e ônibus aos alunos dos Concertos Didáticos, impressão de material gráfico para as apresentações semanais da orquestra, renovação de repertório, concertos populares e pagamento de cachês de músicos. “Essa orquestra tem um custo muito maior. Começamos a fazer apresentação nas satélites, isso é custo. Quando você tem uma orquestra apenas para tocar na terça-feira, é uma coisa, mas quando você tem uma orquestra que participa mais da vida cultural das cidades, ela tem um custo”, diz Gorgulho. Repasses Eurides defende que o valor é mínimo diante da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp), cujo orçamento chega a R$ 43 milhões. No entanto, a orquestra paulistana não é um órgão público e o orçamento, também mantido com repasses do governo estadual, inclui pagamento dos músicos, manutenção de uma academia de aperfeiçoamento profissional, entre outros. A Pró-Amigos também é responsável pelo pagamento do salário do maestro, que, segundo Gorgulho, não passaria de R$ 25 mil. Esse valor estaria incluído nas contas da associação como uma contrapartida de patrocínio para o convênio firmado pela Pró-Amigos com o BRB, cujo logotipo aparece estampado nos banners que ornamentam o palco nos concertos semanais. “A associação obteve patrocínio para o maestro através do BRB, tal como ocorre com outras orquestras. O patrocínio foi aprovado em todas as instâncias do banco, que exige relatórios mensais documentando todas as atividades para reavaliação do retorno social”, diz Guilherme Eduardo Quintas, presidente da Pró-Amigos de 2007 a 2009. Ira Levin, genro de Eurides Brito, assumiu a regência da orquestra em janeiro de 2007. Maestro experiente com passagem pela Ópera de Frankfurt e de Bremen, nascido em Chicago (EUA), Levin já foi regente da Orquestra do Teatro Municipal de São Paulo. “O maestro é profissional internacional e casou-se em Nova York com a minha filha. A vinda dele para Brasília se deu a convite do então governador Arruda, que tem um filho que estuda música nos Estados Unidos e assistia muito aos concerto de Ira Levin no Teatro Municipal”, diz Eurides, em nota enviada ao Correio. “As intrigas, invejas, ciúmes existem em todos os meios e sempre crescem quando há trocas de governos. Então estamos em momento propício para tal.” O secretário de Cultura lembra que houve um impasse na escolha do maestro durante a troca de governo em 2007. Gorgulho sugerira o maestro Júlio Medaglia, mas um compromisso político impediu a nomeação. “O Arruda me falou ‘tenho um compromisso com a Eurides, conheço o genro dela, ele está vindo para Brasília e é um maestro de primeira grandeza e gostaria que fosse ele’”, diz o secretário. “Não tem cargo de maestro. Quando ele veio pra cá, criei um cargo de assessor para assuntos artísticos, que era de R$ 5 mil. Ele nem tomou posse porque ainda não tinha visto. Ficou dois, três meses sem receber e encontramos a forma do BRB.” O maestro Ira Levin não quis se pronunciar sobre o assunto. (LT) A “deputada da bolsa”
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