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sexta-feira, maio 21, 2010
CONGRESSO NACIONAL [In:] FICHAS LIMPAS (Ma non troppo...)
Anistia aos fichas-sujas
O Estado de S. Paulo - 21/05/2010 |
O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), não precisa se preocupar. Depois de manobrar, inutilmente, para impedir a votação do Projeto Ficha Limpa "a toque de caixa", alegando que a proposta nem sequer era do governo, "mas da sociedade", ele teve uma reação característica quando, na quarta-feira, a proposta passou na Casa pelo voto unânime dos 76 senadores presentes, decerto a contragosto em diversos casos. Jucá disse que o texto restringindo as candidaturas de condenados por um colegiado de juízes em razão de uma série de delitos especificados ? eles só poderão disputar eleições 8 anos depois de cumprir a pena ? precisará ser aperfeiçoado porque "ainda é muito genérico, pode cometer injustiças e não pegar quem tem que pegar". De fato, não pegará de imediato quem tem de pegar, embora o que ele e a sociedade entendam por isso decerto não seja a mesma coisa. E não deverá pegar tão logo quanto a sociedade gostaria por causa de uma daquelas malandragens em que os políticos são especialistas. A esperteza contrasta com a euforia do veterano senador gaúcho Pedro Simon, da ala limpa do PMDB. Para ele, graças à aprovação final do projeto de iniciativa popular apresentado com 1,6 milhão de assinaturas, a que aderiram pela internet outros 3,4 milhões de pessoas , o Brasil deixava anteontem mesmo de ser conhecido como o país da impunidade. O golpe se deu quando a Comissão de Constituição e Justiça examinava o texto aprovado na Câmara. O senador Francisco Dornelles, do PP fluminense, aproveitou o momento para introduzir uma "emenda de redação", alterando os tempos verbais em 5 artigos da proposta. Assim, onde constava que não poderiam se candidatar os políticos que "tenham sido condenados", passou a se ler "forem condenados". Ou seja, forem condenados depois da sanção da lei, o que se espera que aconteça até o início de junho. A "emenda Maluf", como merece ser chamada, e não apenas por ser o deputado colega de sigla de Dornelles, anistia os fichas-sujas que conseguiram se eleger quando se entendia que a proibição somente poderia alcançar aqueles cuja condenação tivesse transitado em julgado. É, notoriamente, mas não exclusivamente, o caso do ex-prefeito Paulo Maluf. Mesmo que a Justiça decida que a lei valerá já para as próximas eleições ? o assunto divide os juristas ele e outros políticos intrépidos, condenados em mais de uma instância, terão preservado o direito de se candidatar. Das 4 condenações aplicadas a Maluf por órgãos judiciais colegiados, uma trata de delitos previstos no Projeto Ficha Limpa ? que inclui crimes eleitorais, contra a economia popular, a administração, o patrimônio público e o mercado financeiro, tráfico de entorpecentes, homicídio, estupro e crimes ambientais graves. Políticos que renunciarem ao mandato para não ser cassados também ficarão inelegíveis. No caso que interessa, Maluf foi obrigado a devolver aos cofres públicos o valor gasto com uma compra, considerada superfaturada, de frangos congelados. Protegido pela maliciosa "emenda de redação" de Dornelles, a futura lei, seja lá quando entrar em vigor ? este ano ou só a partir do pleito municipal de 2012 ? não o atingiria, dado que a condenação foi anterior a ela. O relator do projeto no Senado, Demóstenes Torres, do DEM de Goiás, não acredita que a emenda reduza o alcance da lei. "Todos os processos em andamento serão, sim, abrangidos por ela", assegura. Um em cada 4 deputados federais, a propósito, enfrenta pendências judiciais no Supremo Tribunal. Outros parlamentares têm sérias dúvidas. Para os deputados Chico Alencar, do PSOL fluminense, e Flávio Dino, do PC do B do Maranhão, a mudança amenizou o Ficha Limpa. "A alteração que fizeram não foi de redação, foi de mérito", entende Dino. Fica, de qualquer forma, a experiência alentadora de ver a sociedade dobrar o corporativismo dos políticos, quando não o seu acendrado senso de autopreservação. Como diz o coordenador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, Chico Whitaker, "votar esse projeto era botar a faca na cabeça de uns e dar um tiro no pé de outros, mas foi impossível ser contra". |
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