Os mapas de intenção de voto da corrida presidencial mostram mais do que a divisão do país em duas regiões geopolíticas - o Sudeste/Sul, que prefere o candidato da oposição (José Serra), e o Norte/Nordeste e o Centro-Oeste, que estão com a candidata do governo (Dilma Rousseff). Os dados, um retrato do momento passível de mudança, parecem refletir, como ocorreu na eleição de 2006, as escolhas do governo Lula na área econômica.
No primeiro mandato e contra a vontade de setores do seu partido, o presidente Lula manteve o tripé de política econômica herdado do antecessor - equilíbrio fiscal, metas para inflação e câmbio flutuante -, fortalecendo um dos pilares (o superávit primário). Com isso, reorganizou as contas públicas e derrubou a inflação de 12,53% em 2002 para 3,1% em 2006, ano da reeleição.
Com inflação baixa, Lula tornou efetivo o seu principal programa social - o Bolsa Família, que beneficia cerca de 50 milhões de pessoas. De fato, não bastaria transferir renda se o poder de compra da moeda continuasse sendo corroído pela inflação. A opção teve efeitos colaterais - os juros altos inibiram os investimentos do setor privado e o aperto fiscal, os investimentos do setor público.
Essa equação deu força a Lula nas regiões mais pobres, mas o enfraqueceu nos centros mais industrializados. A taxa de desemprego em 2006 já era menor que a dos anos anteriores, mas ainda muito elevada (10,4% em abril daquele ano). O rendimento médio real da população ocupada nas seis regiões metropolitanas pesquisadas pelo IBGE estava abaixo dos valores de 2002, último ano do governo FHC (ver quadro abaixo).
Aparentemente, isso se refletiu nas eleições: na disputa do segundo turno em 2006, Lula perdeu para Geraldo Alckmin (2006) nas três capitais da região Sul e em São Paulo. Dentre os grandes centros, saiu vitorioso no imprevisível Rio de Janeiro e em Belo Horizonte. Em todo o Estado de Minas Gerais, a diferença para seu adversário foi de apenas cinco pontos percentuais, enquanto na capital chegou a 26,3, uma história nunca bem explicada pelo tucano Aécio Neves, reeleito na ocasião com 77% dos votos válidos (Alckmin perdeu votos do primeiro para o segundo turno em Minas).
No segundo mandato, Lula manteve a política econômica, mas fez inflexões - adotou uma política deliberada de recuperação do salário mínimo, aumentou fortemente o gasto público, colocou o tema do investimento em infraestrutura no centro da agenda e desistiu de dar o passo seguinte no processo de desinflação (a meta de 4,5%, vigente desde 2005, virou, na prática, piso do regime).
Essa estratégia fortaleceu ainda mais a imagem de Lula como "pai dos pobres", adquirida no primeiro mandato - o salário mínimo turbinado beneficia 18,7 milhões de aposentados, mais de 20 milhões de trabalhadores do setor privado, 40% dos servidores públicos municipais, um sem-número de trabalhadores da economia informal, que usam o mínimo como referência, e até desempregados com direito ao seguro-desemprego.
Tendo arrumado a casa no primeiro mandato, Lula criou as condições para a economia crescer de forma acelerada no período seguinte - a única exceção foi 2008, quando houve recuo de 0,2%, provocado pela crise mundial. Nos últimos três anos, o desemprego cedeu em todas as regiões metropolitanas. Em abril, caiu ao menor índice da série histórica para esse mês. Isso pode explicar a melhora do desempenho de Dilma em todas as regiões do país, inclusive, onde Serra ainda lidera as pesquisas.
Segundo o Datafolha, a diferença entre Serra e Dilma no Sudeste chegou a ser de 22 pontos em dezembro; em maio, caiu para sete pontos em favor do ex-governador. Na região Sul, a distância era de 29 pontos em março, mas hoje é de apenas três. Nas regiões metropolitanas, Dilma já empatou com Serra. Isso não garante que a candidata do governo vá continuar crescendo onde Lula se habituou a perder - afinal, a campanha oficial ainda nem começou e há inúmeros fatores que podem influenciar na decisão de um eleitor.
O comportamento do rendimento médio real da população ocupada mostra que, mesmo com toda a "exuberância" da economia brasileira nos anos recentes, esse indicador evoluiu timidamente nas seis principais regiões metropolitanas - apenas 3,5%, na média, em oito anos. Em abril, era praticamente o mesmo de 2002 em São Paulo (alta de 0,3%) e 6,8% inferior no Recife. Cresceu em Salvador (10,38%), Belo Horizonte (9,6%), Rio (7,7%) e Porto Alegre (9,5%).
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