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sexta-feira, setembro 28, 2012

''NÃO SE FALA EM CORDA EM CASA DE ENFORCADO" *



Na terra de Delúbio e Demóstenes, debate eleitoral evita mensalão e Cachoeira


Autor(es): Por Raquel Ulhôa | De Goiânia
Valor Econômico - 28/09/2012

Garcia (PT), prefeito e líder nas pesquisas, diz que Delúbio não atrapalha: "As pessoas sabem que não faço concessão ao ilícito"
Na terra de Delúbio Soares e Demóstenes Torres, o "mensalão do PT" e o "caso Cachoeira" são temas tratados com muita cautela na campanha eleitoral. Afinal, direta ou indiretamente, os principais envolvidos na disputa pela prefeitura da capital goiana têm, ou tiveram, algum tipo de relação com os dois episódios. Se os casos de corrupção mais rumorosos da atualidade forem usados como munição nessa reta final, pode sobrar para todo mundo.
O líder da disputa em Goiânia é o prefeito Paulo Garcia (PT), com chance de reeleição no primeiro turno, segundo as pesquisas de intenção de voto. Ele tem como companheiro de partido o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, que está sendo julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e um irmão de Delúbio, Carlos Soares (PT), como candidato a vereador.
Delúbio a compareceu a alguns eventos no início da campanha de Garcia. Chamou tanta atenção e provocou tanto questionamento em cima do prefeito sobre sua presença que acabou afastado dos eventos públicos. Atualmente, sua participação está praticamente restrita a apoios em artigos e rede social. Garcia, também amigo do ex-ministro José Dirceu, outro réu do mensalão, diz que o apoio de Delúbio não afeta "em nada" sua campanha. "Até porque as pessoas sabem que não faço concessão a nada que é lícito", afirma.
Ex-vice-prefeito do pemedebista Iris Rezende - que deixou o cargo em 2010 para disputar o governo do Estado e foi derrotado -, Garcia deu continuidade à gestão do antecessor e manteve a equipe. O maior cabo-eleitoral do prefeito é Iris, que, aos 78 anos de idade, ainda é cotado para disputar o governo do Estado em 2014.
Garcia herdou 12 contratos da prefeitura da capital com a empresa Delta Construções, especialmente nas áreas de pavimentação e de aluguel de máquinas. A empresa é acusada pelo Ministério Público de usar dinheiro público proveniente de contratos firmados com governos estaduais, prefeituras e Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) para irrigar empresas de fachada do grupo do empresário de jogos de azar Carlos Cachoeira.
Em abril, quando investigações da Polícia Federal trouxeram o escândalo à tona, o prefeito suspendeu os contratos e afastou servidores que tiveram os nomes citados por suposta participação em irregularidade. "Respondi prontamente. Então, [tentativa de envolvê-lo com a Delta] não cola", diz Garcia. As investigações, segundo ele, não comprovaram nenhum problema nos contratos, que não foram retomados nem pagos.
O prefeito vem sendo seguido de longe nas pesquisas (uma diferença de até 30 pontos percentuais, em alguns casos) pelo deputado federal Jovair Arantes, líder do PTB na Câmara dos Deputados. Partido aliado do governo federal, o PTB tem membros entre os réus do mensalão. Seu presidente, Roberto Jefferson, é delator do esquema.
A campanha de rádio do petista chegou a explorar suposta relação de Jovair com Cachoeira. Na operação Monte Carlo, ele foi flagrado pela PF em ligação telefônica pedindo ajuda ao empresário. O deputado negou qualquer relacionamento com o contraventor, alegando que todos em Goiás conhecem Cachoeira, pela atividade empresarial.
Outros pré-candidatos a prefeito de Goiânia tiveram seus nomes citados em escutas realizadas pela PF nas investigações do esquema de jogos de azar explorados por Cachoeira, como Leonardo Vilela (PSDB) e Sandes Júnior (PP), que acabaram afastados da disputa.
O político goiano mais prejudicado com o escândalo foi o ex-senador Demóstenes Torres (ex-DEM), que teve o mandato cassado pelas ligações com o esquema. Demóstenes, que reassumiu vaga no Ministério Público, era apontado pelas pesquisas como o nome mais forte para a disputa à Prefeitura de Goiânia. Mas ele preferia permanecer no Senado até 2014, quando o projeto era concorrer ao governo estadual. Agora, está fora da política.
Jovair é candidato do governador Marconi Perillo (PSDB), cuja imagem está desgastada pelo envolvimento do seu nome nas investigações relacionadas à exploração ilícita de jogos de azar em Goiás. Perillo se manteve afastado da campanha. Apareceu pela primeira vez no programa de televisão do seu candidato no dia 20 deste mês e no dia seguinte viajou em missão oficial para os Estados Unidos, onde ficará até 1º de outubro.
Investigação da PF apontou suposta influência de Cachoeira no governo de Goiás, o que foi negado pelo governador, embora assessores tenham sido afastados. Perillo prestou esclarecimentos à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que apura relações de Cachoeira com agentes públicos. Teve de explicar a venda de uma casa, que teria sido comprada indiretamente pelo empresário.
Abatido pelas suspeitas no caso Cachoeira e focado em sua defesa, o governador não teve condições - e nem opções, dizem seus aliados - de construir uma candidatura alternativa forte à do prefeito, sustentado pela aliança entre PT e PMDB, que existe desde a campanha de 2008.
A influência dos casos Cachoeira e mensalão foi além de mexer com as peças do tabuleiro do processo eleitoral em Goiânia. Um efeito citado por assessores das campanhas é a decepção do eleitorado com os políticos em geral, resultando em uma campanha morna, sem empolgação.
"Há, por parte da sociedade, um desapontamento, descrença, desconfiança, em relação aos agentes públicos. Isso é facilmente perceptível", diz o prefeito.
Outra consequência dos dois escândalos que atingiram setores influentes da política de Goiás é a dificuldade de arrecadação das campanhas. O problema é detectado principalmente pelos apoiadores de Jovair, que usou parte do patrimônio pessoal para financiar seus gastos. Ele doou R$ 550 mil do próprio patrimônio à campanha.
Os empresários estariam receosos de contribuir, porque, mesmo isso ocorrendo dentro da legalidade, poderiam, futuramente, ver seu nome envolvido em algum caso de corrupção.
"Esses dois casos, principalmente o mensalão, têm impacto, sim, na doação. A dificuldade de conseguir doadores de campanha é nacional, porque a imprensa tem noticiado com bastante transparência e acuidade o envolvimento de empresas em casos de corrupção, que envolvem campanhas eleitorais", diz Silvio Sousa, secretário estadual para Desenvolvimento da Região Metropolitana e responsável pelas finanças da campanha de Jovair.
Para ele, o caso Cachoeira afetou o financiamento das campanhas no país todo e não só em Goiás. "A Delta estava no país inteiro. Aliás, 90% dos contratos da Delta eram com o governo federal. O Dnit é o maior órgão arrecadador de repasse da Delta. O Cachoeira é de Goiás, mas o Cavendish [Fernando Cavendish, dono da Delta] é do Brasil", diz.
O candidato do PTB apresenta, como principal trunfo de sua candidatura, o fato de pertencer à base do governo estadual e, ao mesmo tempo, do governo Dilma Rousseff. O próprio Marconi chamou a atenção para a "relação excelente" de Jovair com Dilma e para o fato de isso facilitar a obtenção de recursos para a capital.
Sobre a suposta dificuldade de arrecadação, o prefeito de Goiânia acha que as fontes de financiamento são mais ou menos as mesmas, "o que mudou é que as pessoas estão mais atentas a seguir estritamente o rito legal [para as doações]", diz Garcia.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva gravou apoio ao petista, mas a presidente ainda não havia feito isso até a semana passada. Se isso acontecer, causará mal estar com o aliado Jovair.
Garcia contou com o reforço de ministros do PT e a presença do vice-presidente da República, Michel Temer, presidente nacional licenciado do PMDB. Temer foi a Goiás participar de caminhada da campanha à reeleição de Maguito Vilela (PMDB), prefeito de Aparecida de Goiânia, vizinha da capital. O vice-presidente gravou apoio para Garcia.
O prefeito petista construiu mais de 200 praças e seis parques (e está construindo outros três) em seus cerca de dois anos e meio de gestão. Tem como principal plataforma tornar Goiânia uma cidade sustentável, com base em três princípios: planejamento administrativo para um crescimento ordenado, preocupações ambientais claras e oportunidades iguais.
Jovair, que foca suas críticas ao adversário na gestão municipal, escolheu a saúde como prioridade. Lançou uma proposta polêmica, que já sofreu questionamento pelo Ministério Público, de criar um plano de saúde gratuito para a população de baixa renda, chamado de GoiâniaMed. Em debate realizado pelo jornal "O Popular" falaram de saúde, educação, obras e outros assuntos locais. Nenhuma palavra foi dita sobre mensalão ou Cachoeira.
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(*) Adágio.
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