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quarta-feira, setembro 26, 2012

... PRATICAMENTE UMA ''SENA DA CEF''



SENADORES DÃO CALOTE E QUEM VAI PAGAR É VOCÊ

DRIBLE NO LEÃO SERÁ PAGO POR CONTRIBUINTE
Autor(es): JOÃO VALADARES
Correio Braziliense - 26/09/2012
 

A Receita Federal decidiu cobrar dos parlamentares o Imposto de Renda devido sobre os 14º e 15º salários recebidos nos últimos cinco anos. Mas eles já manobraram e empurraram a dívida para o Senado. Ou seja: é o contribuinte, que nunca viu a cor de um 14º e de um 15º, quem pagará outra vez a conta. A decisão do Fisco de intimá-los ocorreu depois de o Correio Braziliense denunciar que, além de embolsar os salários extras — privilégio não pago aos brasileiros que os sustentam —, eles ainda davam calote no Leão. Expostos a um vexame nacional, senadores votaram o fim dos salários extras. Mas, na prática, continuarão a pôr a mão nesse dinheiro. Isso porque a mordomia só deixará de existir se o projeto também for aprovado na Câmara, o que não aconteceu até agora.

Senado vai arcar com o Imposto de Renda devido pelos parlamentares nos últimos cinco anos referente ao 14º e ao 15º salários. Vice-presidente admite que colegas pressionaram a Mesa Diretora para, mais uma vez, escapar do Fisco
O calote histórico aplicado na Receita Federal por senadores e ex-senadores ao receber 14º e 15º salários e não pagar Imposto de Renda, revelado pelo Correio no início de março, vai ser coberto integralmente pelo Senado. Na prática, os valores que não foram descontados caíram direto no bolso dos senadores e vão ser pagos com o dinheiro do contribuinte. Após a denúncia, os parlamentares foram intimados em casa pelo Fisco. A intimação em massa causou grande constrangimento e repercutiu no Palácio do Planalto. O vice-presidente da Casa, senador Aníbal Diniz (PT-AC), afirmou ontem que, depois da notificação, os senadores pressionaram a Mesa Diretora. Venceram. Na tarde de ontem, ficou acertado que, até 3 de outubro, o Senado começa a pagar ao Leão toda a dívida dos parlamentares entre 2007 e 2011 — a Receita Federal só pode cobrar tributos devidos nos últimos cinco anos.
O Senado avisou que vai entrar na Justiça para tentar reaver o montante. Os valores que serão devolvidos à Receita não foram informados oficialmente, mas o Correio fez um cálculo aproximado. Considerando o período retroativo de alcance da cobrança devida, os parlamentares, juntos, deixaram de repassar ao Fisco aproximadamente R$ 10,8 milhões, incluindo as multas por imposto devido. Ao não pagar o IR referente aos salários extras, cada senador deixa de contribuir, por ano, com R$ 12.948. Durante um mandato inteiro, o parlamentar embolsa R$ 103.584.
O diretor da Secretaria Especial de Comunicação do Senado (Secs), Fernando César Mesquita, informou que está sendo elaborado um projeto de resolução sobre o tema. A expectativa é de que a proposta seja publicada hoje no Diário do Senado e, em seguida, deve entrar na ordem do dia.
Tributação

Logo após as primeiras denúncias do Correio, o Senado rebateu as reportagens em nota oficial, alegando que os rendimentos adicionais não seriam tributáveis "por terem caráter indenizatório". Logo em seguida, a Receita Federal alertou que os vencimentos eram tributáveis, sim, por apresentarem natureza remuneratória. O discurso oficial caiu por terra quando os próprios senadores, pressionados após as reportagens, aprovaram em plenário projeto que acaba com a regalia.
"Na medida em que a ajuda de custo foi abolida, o Senado se acusou e a Receita começou a exigir o pagamento. Então, os senadores pressionaram a Mesa para não serem punidos", Aníbal Diniz (PT-AC), vice-presidente do Senado
"O Senado percebeu que os senadores não poderiam ser responsabilizados simplesmente porque eles não tiveram culpa. O Senado só mudou de opinião agora. Na medida em que a ajuda de custo foi abolida, o Senado se acusou e a Receita começou a exigir o pagamento. Então, os senadores pressionaram a Mesa para não serem punidos", afirmou Aníbal Diniz.
Hoje, a versão oficial aponta que o erro que beneficiou os parlamentares teria sido ocasionado por uma falha administrativa do Senado. No entanto, o próprio presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), após a divulgação das reportagens, negou o equívoco e disse que um decreto do próprio Senado isentava o pagamento sobre os salários extras, considerados ajuda de custo. Na ocasião, ele acrescentou que cada senador deveria responder individualmente à intimação do Fisco.
Auditores da Receita Federal ouvidos pelo Correio durante a série de reportagens tinham assegurado reservadamente que, no caso específico dos senadores, todo o ônus financeiro iria recair nas costas dos parlamentares, enquanto pessoas físicas, e não do Senado. Prova maior é que a intimação não foi encaminhada aos gabinetes, e sim à residência dos políticos. A justificativa era simples: "A Receita é credora e o Senado é devedor. No entanto, a União não pode cobrar da própria União. Nesse caso, o empregador é a própria União. Por isso, todo o ônus financeiro vai ser lançado nos próprios senadores", alegou, na época, um auditor.
Nos estados, por exemplo, a Receita utilizou outra fórmula. Institucionalmente, as assembleias legislativas e os tribunais de contas que não descontaram o IR na fonte foram multados em R$ 67,9 milhões. Mesmo assim, além de pagar os atrasados com juros, cada político também foi taxado em 75% do valor da contribuição devida. O cálculo da quantia aplica o percentual de desconto referente ao IR nos rendimentos extras recebidos nos últimos cinco anos. Ainda há cinco assembleias legislativas espalhadas pelo país com contas em aberto.
Intocado desde a Constituição de 1946, o pagamento do 14º e do 15º salários a deputados federais e a senadores foi extinto, por unanimidade, em votação no plenário do Senado em maio deste ano. O projeto, que previa o fim da farra com dinheiro do contribuinte, dormia na gaveta da Casa havia mais de um ano. Só saiu da fila após as denúncias.
R$ 10,8 milhões
Valor estimado da dívida dos senadores com a Receita
Memória
Projeto adormecido na gaveta

Desde que foi aprovado no Senado em maio, o projeto de decreto legislativo que acaba com o 14º e o 15º salários está na Câmara dos Deputados e, por enquanto, deu um único e tímido passo. Apesar de existir um pedido para que tramite com urgência, o presidente da Casa, Marco Maia (PT-RS), afirmou, ainda no semestre passado, que deixaria a proposta seguir a tramitação normal e, consequentemente, mais lenta, passando pelas comissões. Dessa maneira, há o risco de os parlamentares receberam os extras no fim deste ano e no início do próximo.
O projeto chegou à Comissão de Finanças e Tributação (CFT) em 18 de maio e recebeu parecer favorável do relator, Afonso Florence (PT-BA), em 17 de julho, dia em que a Casa entrou em recesso. A atividade na Câmara foi retomada, mas as quatro reuniões da comissão marcadas para o período foram canceladas por falta de quórum. O projeto que extingue o 14º e o 15º salários foi colocado na pauta de votação da CFT, mas as eleições municipais serviram como desculpa para a ausência dos deputados.
Na Câmara, havia sete projetos em tramitação sobre o tema, sendo o mais antigo de 2006. Todos estavam engavetados e encontravam resistência dos parlamentares, mesmo após a decisão da Câmara Legislativa de, no início deste ano, abolir a regalia paga aos distritais. No Senado, havia uma proposta semelhante apresentada em fevereiro de 2011 pela então senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR). Os senadores só resolveram apreciar o tema em março, quando o Correio revelou que não havia desconto do Imposto de Renda do 14º e do 15º salários pagos aos senadores. Após a reportagem, o projeto que extingue o benefício foi aprovado em dois meses no Senado e seguiu para a Câmara. Os deputados recebem os adicionais, no entanto, segundo a Casa, há desconto normal do Imposto de Renda. (JV)
Um longo caminho
Veja o que falta para a proposta que acaba com a regalia do 14º e do 15º salários de deputados e senadores ser aprovada na Câmara
Após passar pela CAE e a CCJ, o projeto, que adormecia havia mais de dois anos na gaveta do Senado, foi aprovado em plenário, em 9 de maio passado.
Uma semana depois, a matéria chegou à Câmara dos Deputados.
Atualmente, o Projeto de Decreto Legislativo n° 569/2012 está na pauta da Comissão de Finanças e Tributação (CFT), que ainda analisa a questão.
Quando for aprovado na CFT, o texto segue para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que observará a legalidade jurídica da proposta e terá 10 sessões ordinárias para emitir um parecer sobre o texto.
Assim que passar pela CCJ, a matéria estará pronta para entrar na ordem do dia.
A decisão de colocar o projeto na pauta é tomada pelo presidente da Casa — deputado Marco Maia (PT-RS) —, ouvindo os líderes dos partidos. O texto só poderá ser votado em sessão ordinária deliberativa quando a pauta estiver destrancada.
Se aprovada a urgência, o texto pode entrar na pauta de uma sessão extraordinária a qualquer momento, dependendo somente da ordem do presidente ou do pedido dos líderes
Por tratar-se de projeto de decreto legislativo vindo do Senado, se for aprovado sem alteração, será promulgado imediatamente, sem a necessidade de ser sancionado pela presidente da República.

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