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quarta-feira, fevereiro 27, 2013

''MEZZO MUSSARELA, MEZZO CALABRESA''



Após eleição, Itália chega perto da ingovernabilidade



Valor Econômico - 27/02/2013
 

A Itália voltou ao centro da crise na zona do euro após o resultado rocambolesco das eleições. A alternativa Mario Monti, o tecnocrata que apareceu como salvador após um governo ruinoso de Silvio Berlusconi, no fim de 2011, foi fragorosamente rejeitada pelos eleitores. Contando com o aval da Comunidade Europeia e dos mercados para continuar com seu programa de austeridade, Monti mal passou dos 10% dos votos - obteve 10,6%. A crise jogou a responsabilidade de salvar o capitalismo italiano nas mãos do ex-comunista Partido Democrata, liderado por Pier Luigi Bersani, uma ironia da história. Apoiado por empresários, Bersani contou com exótico sistema eleitoral do país para, como coalizão mais votada (29,5%), apenas 0,4 ponto percentual acima da centro-direita de Berlusconi (29,2%), obter maioria automática de 54% dos votos na Câmara. Na comparação com as eleições de 2008, Bersani perdeu 3,5 milhões de votos, e agora terá o duvidoso privilégio de tentar formar um governo estável. Diante de dois formidáveis populistas Berlusconi e o comediante Beppe Grillo, pelo novato Movimento 5 Estrelas, que juntos, arrebataram 55% dos sufrágios, a missão de Bersani parece impossível.
A caótica política italiana sempre nutriu a impressão de que o país é ingovernável. Agora, a impressão ameaça tornar-se pura realidade, aos golpes da crise. As diferenças em relação ao passado são marcantes - e dramáticas. A Itália tem hoje a terceira maior dívida do mundo, de € 2 trilhões, só inferior à dos EUA e Japão. Terceira maior economia da zona do euro, foi atingida em cheio pela crise da dívida soberana que começou na periferia da Europa. Os malabarismos do Banco Central Europeu para debelar o pânico nos mercados debelaram o pânico até aqui, mas nuvens negras voltaram a encobrir o bloco monetário após a reviravolta política italiana. Os eleitores deram claro voto contra as políticas de austeridade.
A revolta política, que tem derrubado os governos da zona do euro, seja qual for o lugar do espectro político que ocupem, é uma barreira poderosa às decisões tomadas, certas ou erradas, por burocratas em Bruxelas. A Itália não é exceção. O governo direitista de Mariano Rajoy, na Espanha, vive em apuros e com a credibilidade em queda livre, agravada pelo escândalo de subvenção ilegal de líderes do Partido Popular por dinheiro de contribuição eleitoral de empresas. Nos dois países, a uma situação econômica bastante frágil, somam-se agora debilidades políticas que podem se revelar incapacitantes para a tomada de decisões duras e inadiáveis a curto prazo.
O estado da economia italiana é, de imediato, melhor que o da Espanha. A Itália conseguiu reduzir seu déficit a 3% do Produto Interno Bruto, embora carregue o peso de uma estagnação de uma década que desembocou em uma recessão no ano passado e em 2013. Mas parece ter produzido uma charada política insolúvel. Os partidos já saíram de uma eleição falando na próxima, como nos piores dias da crise grega.
Nenhum partido tem maioria no Senado, que de tem praticamente os mesmos poderes da Câmara. É implausível formar um governo estável. Juntos, Bersani e Monti não têm força política para isso. A união da centro-esquerda com a centro-direita de Berlusconi cria uma aberração, desembocando em uma maioria parlamentar pronta para se liquifazer diante de qualquer questão relevante ou polêmica. Beppe Grillo, que fundou em 2009 seu Movimento 5 Estrelas para desbancar a elite política corrupta e lutar por sua eliminação, foi o grande vitorioso. Usou para isso a bandeira da ética, boa o suficiente para populistas de todo o tipo, mas seu programa tem pouco a dizer sobre o que fazer com a economia. Foi o partido que mais votos obteve - 25,6% - e, se é incapaz de governar sozinho possui, pela força dos números, o poder de impedir que qualquer outro partido ou coalizão o faça.
Tudo somado, só há impasses. Os mercados, com a perspectiva de instabilidade sem data para acabar, castigaram as ações dos bancos italianos, enquanto que a bolsa de Milão chegou a cair 4,9%. O preço cobrado para rolar a dívida italiana subiu para 4,83%, alto, embora ainda distante dos 6,3% do pico da crise da dívida soberana em 2012. As chances de que a receita de austeridade seja abandonada não são desprezíveis, o que pode até ser positivo, desde que da vontade popular emerja um governo decidido e viável - as urnas mostraram que a Itália está longe disso.

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