Monumento às Bandeiras é pichado
Edison Veiga
Personagem central da própria noção de identidade paulista, a figura do bandeirante protagoniza uma dicotomia histórica: de um lado, o valente desbravador que enveredou pelos sertões consolidando o País. De outro, o assassino de índios. Na manhã de ontem, o Monumento às Bandeiras, principal homenagem paulistana ao bandeirante, amanheceu pichado.
O local não foi escolhido por acaso. Afinal, não se tratava de um ato de vandalismo qualquer. As inscrições em um dos mais famosos cartões-postais de São Paulo - conhecido popularmente como "empurra-empurra" ou "deixa que eu empurro" - eram contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que pretende tirar do Executivo a definição sobre a delimitação de terras indígenas e passá- la ao Congresso Nacional.
A Prefeitura agiu ontem mesmo. À tarde, a empresa de limpeza contratada pelo Departamento de Patrimônio Histórico - órgão da Secretaria Municipal de Cultura - encarregou-se de deixar o monumento tinindo. De acordo com a secretaria, o serviço foi feito por "jateamento de água limpa e quente, com pressão determinada para o tipo de material do monumento", mas também foram "utilizados removedores químicos". Até o início da noite de ontem, não foi especificado quanto a operação custou aos cofres públicos.
Com 240 blocos de granito de 50 toneladas, a monumental obra é assinada pelo escultor ítalo-brasileiro Victor Brecheret (1894-1955). Nela, estão representadas 29 figuras humanas, entre bandeirantes, índios, mamelucos e negros.
"Meu pai orgulhava-se da solidez dessa obra. Ele costumava brincar que, mesmo que caísse uma bomba atômica em São Paulo, ela permaneceria intacta", afirmou ontem o engenheiro Victor Brecheret Filho, de 71 anos, ao Estado.
Sobre a pichação, Brecheret Filho disse estar "espantado", "chocado" e ""horrorizado". "Estamos vivendo um período de pré-barbárie. Até pouco tempo atrás, o vandalismo não atingia locais que as pessoas foram educadas a respeitar", comentou. "Agora, nada mais é respeitado. A convivência harmônica está acabando."
Ele sugeriu que seja adotada em São Paulo uma solução semelhante à que protege a escultura La Carreta, de José Belloni, em Montevidéu, no Uruguai. "É um detector de passagem, com feixe de luz, capaz de acionar uma sirene quando alguém passa", explicou.
Intervenções. Não é a primeira vez que o icônico monumento é alvo de intervenções. Em maio do ano passado, um dos bandeirantes da escultura teve as unhas do pé pintadas com giz de cera azul, como se tivessem sido esmaltadas.
Também em 2012, um grupo de artistas resolveu colocar orelhas de burro nos cavalos do monumento. Nesse caso, entretanto, a escultura não foi danificada: as orelhas eram feitas de plástico e ficaram ali apenas por cerca de 5 horas - tempo suficiente para que os artistas fotografassem o, digamos, novo visual da escultura.
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