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terça-feira, novembro 24, 2009

CARRO ELÉTRICO II


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Carro elétrico: você ainda vai ter um


Eles ainda são caros e têm pouca autonomia. Mas a revolução na indústria automobilística já começou. E os primeiros modelos chegarão ao Brasil em 2010

ALEXANDRE MANSUR

Para alguns, o transporte “limpo” vai exigir uma ruptura com a lógica da indústria automobilística. Essa é a terceira estratégia, proposta pelo israelense Shai Agassi, fundador do projeto Better Place (Lugar Melhor), uma empresa sediada em Palo Alto, na Califórnia. Seu plano é criar uma rede de infraestrutura para vender não apenas os carros, mas o serviço de locomoção. Da seguinte forma: você compra um carro elétrico e contrata um serviço de reposição de bateria. Quando a carga está para terminar, você a substitui por outra, em 70 segundos, em um posto. No fim do mês, recebe uma conta das trocas, como se fosse uma conta de celular. A vantagem do sistema é liberar o motorista do limite de autonomia. Trocar a bateria é tão simples quanto encher um tanque. Uma segunda vantagem é baratear o carro elétrico. Ele seria subsidiado pelo fornecedor de baterias, assim como as operadoras de telefonia subsidiam os celulares. A proposta vem conquistando apoio. A Better Place já recebeu US$ 400 milhões de investidores privados. As primeiras redes nacionais de pontos para troca de baterias começaram a ser montadas, com parcerias locais, na Dinamarca, em Israel e na Austrália. Em Tóquio, a maior empresa de táxi da cidade aderiu. O primeiro posto de troca rápida foi inaugurado lá no início do ano.

Das grandes montadoras, quem aposta mais alto no projeto da Better Place é a Renault-Nissan. Ela anunciou o investimento de € 4 bilhões em três anos, para projetar modelos elétricos já adaptados para a troca rápida de baterias e ajudar no desenvolvimento da rede de postos especiais. “A Renault percebeu que poderia dar uma contribuição importante para ajudar o mundo a solucionar o problema das mudanças climáticas”, diz o francês Jean Michel Jalinier, presidente da Renault no Brasil. Os carros são uma fonte importante de gás carbônico, o principal gerador do efeito estufa. Na Europa, quando a energia vem de usinas térmicas, um carro elétrico emite metade do carbono de um carro a gasolina ou diesel. Se a rede de energia for limpa (nuclear, solar ou hidrelétrica), a emissão será zero. Pelos cálculos da Renault, o preço mais alto do carro elétrico compensa porque a energia da tomada custa, na Europa, um décimo do combustível.

A Better Place e a Renault-Nissan negociam com as distribuidoras de combustíveis da Europa, dos EUA e do Japão a construção dos postos para troca rápida de bateria ou para recarga em 20 a 30 minutos, usando equipamentos de alta voltagem. Por que uma empresa que vende gasolina, álcool, diesel e gás natural em suas bombas ajudaria na entrada dos carros elétricos, que em princípio competem com seu negócio? “Essas empresas sabem que o mercado de serviços para os elétricos já está surgindo. Elas enxergam uma oportunidade para manter seus pontos de venda”, afirma Jalinier. “Se não aderirem, outros oferecerão esses serviços.”

A imagem desse futuro elétrico começará a ser vista em Portugal. O governo português fez um convênio com a Renault-Nissan para popularizar os carros elétricos, com participação das distribuidoras de combustíveis Galp e de eletricidade Energias de Portugal (EDP). A frota de 4 milhões de veículos servirá para testar a implantação do sistema em larga escala. Já existem seis pontos de carregamento de bateria em Lisboa. A rede deverá chegar a mil postos em 25 cidades até o fim de 2010. Além de desconto em impostos, quem comprar um carro elétrico poderá ter abatimento em estacionamentos e postos. Pelo menos 20% dos carros comprados pelo governo a partir de 2011 serão elétricos. A Mitsubishi anunciou que também lançará carros elétricos lá. “Cerca de 80% dos portugueses fazem percursos diários que podem ser bem atendidos pelos modelos elétricos”, diz Jorge Cruz Morais, administrador da EDP em Portugal. Ele espera que, em 2020, o país tenha 200 mil carros elétricos. Para a EDP, isso é uma nova fonte de renda. Cada carro elétrico na rua consome tanto quanto uma residência. A onda poderá ser boa também para o país. Segundo um estudo da EDP, se todos os automóveis leves de Portugal fossem elétricos, o país economizaria 37% do que gasta ao ano com energia, já que todo o petróleo é importado.

O desempenho dos carros elétricos para conquistar o mercado global vai depender, em grande parte, do desenvolvimento de baterias melhores e mais baratas. Hoje, elas respondem por metade do preço dos elétricos mais baratos. A Nissan criou uma empresa em parceria com o gigante japonês de eletrônicos NEC para desenvolver um novo modelo de baterias, que tenha o dobro da capacidade de carga das atuais. Essa corrida explica por que o megainvestidor Warren Buffet comprou 10% da chinesa BYD, uma das maiores fabricantes de bateria de celulares e computadores do mundo, que decidiu levar sua experiência para o ramo automobilístico. Wang Chuan-Fu, dono da BYD, lançou um híbrido, o F3DM, que roda 100 quilômetros só na bateria e custa US$ 22 mil (mais barato que o Prius e o Insight). Dois modelos só elétricos, o E3 e o E6, deverão ser lançados. A empresa também pesquisa baterias mais eficientes. Tudo isso desenvolvido por um exército de 10 mil engenheiros na fábrica. Alguns carros já estão encomendados pelo governo chinês, para serviços públicos e para os correios. Wang também vai vender para seis países da Europa e para os EUA, por US$ 40 mil. Ainda não anunciou planos para o Brasil.

Os primeiros carros com alguma tecnologia elétrica chegarão aqui no ano que vem. Em março, a Mercedes-Benz começará a vender no Brasil o S400h, um híbrido que usa um motor elétrico para dividir a tração, mas não pode ser ligado na tomada. O preço ficará na faixa dos R$ 590 mil. A Porsche pretende trazer, em julho, o Cayenne híbrido (a versão a gasolina custa R$ 250 mil). O primeiro elétrico puro mesmo pode ser o esportivo Audi R8 E-Tron, que chegará em 2013. Seus dois motores elétricos garantem uma aceleração de 0 a 100 quilômetros por hora em 4,8 segundos e velocidade máxima de 200 quilômetros por hora. Nenhum desses lançamentos, principalmente o elétrico puro, deverá mudar a cara de nossas ruas ainda. A Fiat já descobriu isso. Ela aprimora desde 2006 uma versão elétrica para seu Palio Weekend. Já produziu 36 unidades, quase todas em caráter experimental, para as concessionárias de energia elétrica. Mas a Fiat diz não ter planos de lançar o veículo em escala comercial. O Dock Dock, conceito de carro elétrico apresentado pelo ex-prefeito de Curitiba Jaime Lerner, é visto mais como marketing político do que como um projeto economicamente viável. “O Brasil vai receber os elétricos em larga escala na segunda onda de lançamentos. Não agora”, diz Jalinier.

Portugal terá mil postos de recarga até o fim de 2010. E 20% dos carros do governo serão elétricos

O Brasil está em uma posição peculiar. Graças ao sucesso do programa do álcool, a frota nacional não tem tanto impacto para as mudanças climáticas. Estima-se que 50% do combustível dos carros brasileiros seja derivado de biomassa (somando o álcool puro e o misturado à gasolina). Ele não contribui para o aquecimento global. E reduz a urgência da opção elétrica. Segundo Jalinier, 90% dos motoristas brasileiros dirigem menos de 100 quilômetros por dia, o que tornaria viável o uso de um modelo elétrico. “Mas ainda precisamos superar uma limitação cultural”, afirma. Para ele, em países como a China, os EUA ou a França, os motoristas sabem de cabeça quanto rodam por dia. “Por isso, conseguem avaliar melhor os benefícios do carro elétrico e entender que não precisarão reabastecer no meio do dia.” A tributação no Brasil também atrapalha. O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) dos carros cresce gradualmente a partir dos modelos 1.0, para incentivar os veículos baratos e econômicos. Os modelos elétricos acabam caindo na categoria “outros”, que paga o imposto mais caro. “É um contrassenso”, diz Jayme, da Inee.

 Divulgação  Divulgação
INTERESSE
Furgão elétrico, desenvolvido pela CPFL com a Edra, no Brasil (à esq.), e posto de troca rápida de bateria em Tóquio (direita). Os veículos são um novo negócio para as distribuidoras de energia

A predominância do álcool pode retardar, mas não impedirá a multiplicação dos elétricos aqui. Jalinier e Eduardo Jorge, secretário municipal de Verde e Meio Ambiente de São Paulo, estudam um acordo para a prefeitura comprar uma frota de elétricos e criar políticas de incentivos. “Estamos pensando em subsídios para a instalação da rede de recarga e estímulos, como a isenção do pagamento de alguns estacionamentos e pedágios”, afirma Eduardo Jorge. Segundo ele, a prefeitura também negocia com a Toyota uma redução nos impostos para os híbridos. “Antes dos carros elétricos, as motos elétricas vão ganhar nossas ruas”, diz.

A empresa Motor Z, líder nacional de equipamentos para postos de abastecimento, foi uma das primeiras a apostar nisso. Em 2007, lançou três modelos de lambretas elétricas, a partir de R$ 6 mil. Já vendeu 1.500 unidades. “Um grupo de clientes são as empresas de segurança patrimonial”, diz Samir Nunes, gerente de engenharia da Motor Z. “Os vigilantes ficam rodando o dia todo dentro de um shopping ou em condomínios. A ausência de ruído e de fumaça são vantagens da moto, além do custo final do abastecimento.” Os limites são a autonomia, de 40 quilômetros, e a velocidade máxima, de 50 quilômetros por hora. Para promover a novidade, a Motor Z inaugurou um ponto de recarga, que usa energia solar, em um posto de gasolina Petrobras na Barra da Tijuca, no Rio. “Outros clientes buscam uma moto segura e de pouca manutenção para o lazer, na casa de praia ou no fim de semana”, diz Nunes. É o caso de Carlos Alberto Teixeira, um representante comercial que mora na Barra e comprou uma lambreta elétrica. Ele a usa principalmente para jogar a pelada regular com os amigos em um campo no bairro do Recreio dos Bandeirantes, a 14 quilômetros de casa. “Os vizinhos acham curiosa aquela moto que não faz barulho”, afirma. “A gente precisa cuidar do planeta. Estou dando um bom exemplo a meus filhos.” Os meninos, de 11 e 14 anos, também dão suas voltinhas com a lambreta dentro do condomínio.

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http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI102109-15224-2,00-CARRO+ELETRICO+VOCE+AINDA+VAI+TER+UM.html

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