Venezuela tenta conter o dólar paralelo
Por Fabio Murakawa | De São Paulo
O governo venezuelano encerra hoje o primeiro de uma série de leilões de dólares, na mais recente medida para tentar combater o déficit de divisas que tem provocado uma disparada da moeda americana no paralelo, da inflação e da escassez de produtos no país. Críticos classificaram a medida como eleitoreira e paliativa.
Ao fazer o anúncio, o recém-nomeado vice-presidente da área econômica do governo, Rafael Ramírez, disse que o governo estuda modificar a Lei de Ilícitos Cambiais e a Lei de Mercado de Valores, para descriminalizar a posse e a comercialização de dólares no país. O objetivo, mais uma vez, seria conter a disparada da moeda americana.
Ramírez, que também preside a estatal de petróleo PDVSA, anunciou a intensificação dos leilões por meio do sistema Sicad, com nove ofertas de US$ 100 milhões até o final do ano. Ele explicou que esses dólares serão destinados a setores "que não são prioritários, mas que são importantes para o funcionamento da nossa economia". Produtos "prioritários", como alimentos e medicamentos, são importados diretamente pelo governo, na maior parte dos casos.
O Sicad foi implementado em março, pouco depois da morte do ex-presidente Hugo Chávez, mas houve apenas quatro leilões desde então. Na mesma época, o governo promoveu uma desvalorização do câmbio controlado, de 4,30 bolívares para 6,30 bolívares por dólar. Mas o dólar paralelo, ilegal no país, saltou de cerca de 20 bolívares para 47 bolívares por dólar.
A disparada reflete a dificuldade de empresas e pessoas físicas em obter a moeda por meios oficiais. A situação é especialmente grave na Venezuela, país petroleiro que importa cerca de 70% dos bens que consome.
Segundo o jornal "El Mundo", a dívida do Cadivi - principal instrumento com o qual o governo vende dólares à cotação oficial - com o setor privado passa de US$ 2 bilhões. O índice de escassez de produtos, medido pelo banco central, atingiu 21,2% em setembro. E a inflação, que em 2012 foi de 20,1%, fechou os 12 meses encerrados em agosto em 45,4%.
Analistas e oposição dizem que os leilões têm como objetivo facilitar a importação de produtos para o Natal, mas terão pouca eficácia para reduzir o desabastecimento de forma duradoura e, menos ainda, para baixar a inflação.
"A medida terá um efeito de curto prazo, mas não vai resolver o problema dos preços. Para planejar a reposição dos estoques e formular os preços, as empresas continuam tendo como referência o dólar [do mercado] negro", disse ao Valor o economista Luis Vicente León, da consultoria Datanalisis.
Críticos do governo também apontam um caráter eleitoreiro na medida. O país terá eleições municipais em 8 de dezembro, que servirão como um termômetro para a aprovação de Maduro, escolhido por Chávez como seu sucessor e eleito por uma margem surpreendentemente estreita em abril.
Analistas também consideram o montante oferecido nos leilões semanais insuficiente. Na oferta de hoje, US$ 95 milhões serão vendidos a empresas, e outros US$ 5 milhões a pessoas físicas. No segundo trimestre do ano, as importações privadas na Venezuela somaram US$ 7,442 bilhões, perfazendo uma média diária de US$ 81 milhões. Ou seja, cada leilão semanal ofertará às empresas pouco mais de um dia de importações, se a quota atual for mantida.
O brasileiro Luiz Pinto, pesquisador do Instituto de Estudos Latino-Americanos da Universidade Columbia, nos EUA, vê pontos positivos na medida. "Uma parte do diferencial entre o dólar oficial e o negro tem caráter especulativo. O fato de o governo ter lançado esse plano pode mitigar um pouco os efeitos da especulação", disse. Para ele, os leilões servirão também para o governo ter uma medida mais precisa do tamanho do mercado paralelo de dólares no país e, a partir disso, adotar políticas mais eficientes para estabilizar o câmbio.
adicionada no sistema em: 16/10/2013 12:27 |
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