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100 dias de Dilma e a agenda socioambiental
Autor(es): André Lima |
Correio Braziliense - 13/04/2011 |
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Advogado, mestre em gestão e política ambiental pela UnB e membro do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) Fatos relevantes ocorridos nos 100 primeiros dias de governo Dilma sinalizam uma agenda desenvolvimentista em que a questão ambiental ainda é vista como gargalo e não como oportunidade. A expedição, em fevereiro, da licença “parcial” para a instalação do canteiro de obras da polêmica Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu, no Pará, sem o cumprimento das condicionantes estabelecidas na licença prévia é um desses fatos relevantes.
Entre as condicionantes, destacamos a recuperação de áreas degradadas, o preparo de infraestrutura urbana, iniciativas para garantir a navegabilidade nos rios da região, a regularização fundiária de áreas afetadas e programas de apoio aos povos indígenas afetados. Belo Monte é o símbolo de uma luta histórica que marcou a origem do movimento socioambiental brasileiro. A fórceps, Dilma está fazendo essa megaobra avançar, a despeito da sua questionável legalidade e sustentabilidade (ambiental e econômica).
Pela mídia e nos bastidores da Esplanada ouve-se a respeito da gestação, intramuros, de um pacote de “modernização” da legislação ambiental brasileira com o firme propósito de agilizar os processos de licenciamento ambiental, em benefício das grandes obras de infraestrutura de interesse do governo federal. Busca o governo eliminar supostos gargalos e exigências considerados excessivos e com altos custos para os setores produtivos.
A revolta recente de trabalhadores da Usina Hidrelétrica de Jirau, no Rio Madeira, em Rondônia, é paradigmática. Serve de alerta em relação ao projeto de “modernização” do licenciamento ambiental. Os bagres que incomodaram o ex-presidente Lula e que deixarão de ir e vir pelo rio ou as milhões de toneladas de CO2 liberadas pelo desmatamento que a obra direta e indiretamente garantirá constituem apenas parte do problema. O planejamento adequado das condições de vida e trabalho oferecidas aos milhares de trabalhadores migrantes constitui elemento socioambiental central a ser tratado previamente no licenciamento da obra. A lógica fast track pensada pelo governo para tocar o licenciamento das obras de seu interesse não parece ser a mais recomendável.
Outro fato que merece comentário é a postura laissez faire, flácida e ambígua, do núcleo central do governo em resposta à evolução natural da proposta do deputado Aldo Rebello para o “novo” Código Florestal Brasileiro na Câmara dos Deputados.
Com o propósito de beneficiar pequenos produtores rurais em condições desfavoráveis de adequação à legislação vigente desde 1965, a proposta sugere a institucionalização da impunidade como remédio, cujo efeito colateral mais grave será o favorecimento de grandes infratores ambientais. A nova lei florestal estimulará mais desmatamentos em todos os biomas brasileiros.
Os sinais concretos do anunciado processo de construção pelo governo de uma alternativa viável são tão tímidos, quanto trocados, no Congresso Nacional e nos bastidores do Planalto. A ambiguidade letárgica do governo nutriu até aqui uma proposta que transformará o Código Florestal na lei do apagão ambiental. Já passou da hora de o governo federal deixar o papel de coadjuvante (ou omisso?) e assumir as rédeas desse processo que deixará marcas na história da política ambiental brasileira.
A criação, no Ministério da Fazenda, de uma Coordenação para Meio Ambiente e Clima indica novos e promissores passos, ainda que embrionários. Merece destaque a formulação, no Ministério de Desenvolvimento Social, do plano de combate à miséria que incorporará, segundo interlocutores do Ministério do Meio Ambiente, componentes ambientais estratégicos como investimentos em saneamento básico, apoio às cooperativas de catadores de resíduos recicláveis e pagamento por serviços ambientais aos agricultores familiares.
No entanto, a lógica estreita do comando e controle (normas, licenciamento e fiscalização) que impera há 30 anos no seio da gestão ambiental brasileira deve ser reciclada e conviver com os modernos instrumentos econômicos para o desenvolvimento sustentável. O pagamento por serviços ambientais, o Imposto de Renda Ecológico, o Mercado Brasileiro de Carbono, o Redd (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal), o Fundo Verde de Participação dos Estados e Municípios, os incentivos para a produção de energias limpas (eólica e solar) são temas estratégicos a merecer muito mais atenção do governo. |
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(*) Frase de música. Milton Nascimento.
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