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segunda-feira, outubro 22, 2012

COTAS SOCIAIS. QUEM PAGA O ''ALMOÇO GRÁTIS"?



Questionamentos sobre a Lei de Cotas Sociais



Autor(es): Luis Claudio Megiorin
Correio Braziliense - 22/10/2012
 
Advogado, presidente da Associação de Pais e Alunos das Instituições de Ensino do DF, coordenador regional da Confederação Nacional das Associações de Pais e Alunos e membro da Comissão de Direito do Consumidor da OAB-DF

A nova Lei nº 12.711/12 está sendo comemorada por parcela considerável da população. Trata-se de uma lei de política afirmativa para tentar reparar a enorme desigualdade social existente no país. Por seu lado, parte da sociedade vê a lei, em certa medida, como uma injustiça e questiona os critérios de distribuição de vagas nas universidades federais.

Na verdade, o Supremo Tribunal Federal (STF) já se pronunciou favoravelmente sobre a constitucionalidade das cotas raciais e, nesse ponto, não cabem mais divagações. Vale ressaltar, entretanto, o posicionamento do relator, ministro Lewandowski, que lembrou o caráter provisório das políticas de cotas. Para ele, todas as universidades podem adotar as cotas, desde que respeitem os critérios de razoabilidade, proporcionalidade e temporalidade.

Nesse ponto, o que nos causa preocupação é que o art. 1º da lei em comento traz a expressão reserva de no mínimo 50% das vagas. Questionamos, então, se as universidades podem manter suas normas de cotas e somá-las ainda ao percentual exigido pela nova lei. Outro fator que tende a extrapolar é que os alunos cotistas competirão duplamente: pelo sistema de cotas e pelo universal. Não seria isso ofensa aos princípios expressados no julgado do STF? Não estaria, assim, caracterizado um bis in idem, ou seja, normas aplicadas duas vezes sobre o mesmo fato tendentes a prejudicar terceiros, o que é vedado em nosso ordenamento jurídico?

Em princípio, mesmo após a decisão do STF é possível, sim, questionar, em alguma medida, a aplicação da nova lei, caso se verifique que a sua aplicação possa causar prejuízos ou, aplicada em conjunto com outras normas, de hierarquia inferior, prejudique os alunos que prestarão o vestibular.

Não podemos deixar de pontuar que sucessivos governos privatizaram a educação do país. A falta de investimento no ensino básico gerou uma desigualdade tão grande quanto as desigualdades oriundas das questões raciais.

Não há dúvidas de que as políticas afirmativas são necessárias para aplacar a desigualdade social. Nesse sentido, a nova lei traz benefícios para uma camada da população que mais sofreu com a discriminação racial e que jamais teremos condições de reparar por completo. Por seu lado, a lei faz justiça também quanto à questão de renda, pois a discriminação não é só racial neste país.

Mais uma vez as classes A e B arcarão com esse custo social, além da alta carga tributária que lhes pesa sobre os ombros e que não se traduz em serviços de qualidade, como a educação. As famílias de classe média que mantêm os dois sistemas de ensino, o público e o privado, arcam com o alto custo da formação de seus filhos até o ensino médio. Contudo, agora, com a considerável diminuição de vagas nas federais, boa parte desses estudantes será empurrada para as faculdades privadas, cuja qualidade de ensino é duvidosa em muitas delas, a começar pelo processo de seleção.

Logo, quem ganha com a nova lei de cotas? Com certeza, os beneficiados serão os alunos das escolas públicas, assim como as faculdades privadas e as escolas privadas de alto desempenho nos vestibulares. Dentr e os prejudicados estão os alunos das escolas privadas, inclusive os pretos, pardos e índios.

Ao contrário do que se imagina, não cremos que haverá nesse momento êxodo de alunos das escolas privadas para as públicas, visto que os pais talvez não arrisquem a educação de seu filho apenas pelo sistema de cotas. Isso porque a baixa qualidade do ensino médio público é notória. Também a falta de infraestrutura e as greves constantes são alguns dos fatores que inibem a troca. Além disso, o número de vagas no vestibular é incerto para as pessoas que não se enquadram nos quesitos raça e renda.

Muito embora entendamos que a lei em análise produza justiça social, diante dos argumentos trazidos, questionamos a sua aplicação no momento em que as universidades estão sucateadas e sem estrutura mínima para receberem e manterem os alunos das escolas públicas, os quais certamente continuarão sofrendo os revezes de uma educação pública deficitária, em que pese a promessa de apoio pedagógico para nivelamento, bem como o financeiro, para a manutenção desses alunos na universidade.

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