PENSAR "GRANDE":

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[NÃO TEMOS A PRESUNÇÃO DE FAZER DESTE BLOGUE O TEU ''BLOGUE DE CABECEIRA'' MAS, O DE APENAS TE SUGERIR UM ''PENSAR GRANDE''].
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“Pode-se enganar a todos por algum tempo; Pode-se enganar alguns por todo o tempo; Mas não se pode enganar a todos todo o tempo...” (Abraham Lincoln).=>> A MÁSCARA CAIU DIA 18/06/2012 COM A ALIANÇA POLÍTICA ENTRE O PT E O PP.

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''Os Economistas e os artistas não morrem..." (NHMedeiros).

"O Economista não pode saber tudo. Mas também não pode excluir nada" (J.K.Galbraith, 1987).

"Ranking'' dos políticos brasileiros: www.politicos.org.br

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# 38 RÉUS DO MENSALÃO. Veja nomes nos ''links'' abaixo:
1Radio 1455824919 nhm...

valor ...ria...nine

folha gmail df1lkrha

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segunda-feira, novembro 09, 2009

XÔ! ESTRESSE [In:] ''FALSA BAIANA'' *

...

















[Homenagem aos chargistas brasileiros].
....
(*) FALSA BAIANA (João Gilberto).
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ANSELMO DUARTE: APLAUSOS E PALMA(S)... DE OURO...

Corpo de Anselmo Duarte é sepultado no interior de São Paulo

Ator e cineasta faleceu na madrugada de sábado

Seg, 09/11/2009 - 10:22

anselmo duarte enterro - Foto: Renata Xavier - 0

Foto: Renata Xavier

O ator e cineasta Anselmo Duarte

Por Redação Online

O corpo do ator e cineasta Anselmo Duarte foi enterrado na tarde de domingo (8/11/2009) em Salto, no interior paulista, sua cidade natal. O prefeito do município, José Geraldo Garcia, decretou três dias de luto oficial.

Duarte faleceu na madrugada de sábado, por conta de um acidente vascular cerebral. Antes de um breve velório no Centro de Educação e Cultura de Salto, o corpo do cineasta foi velado na Assembleia Legislativa de São Paulo.

Além de ter trabalhado em grandes sucessos do cinema e da TV, Anselmo foi o único brasileiro a receber o prêmio Palma de Ouro, em Cannes, pelo filme O Pagador de Promessas.
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http://contigo.abril.com.br/noticia/corpo-anselmo-duarte-sepultado-interior-sao-paulo-510907.shtml
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MARK BOYLE: ''DINHEIRO NA MÃO É VENDAVAL..." *

I live without cash – and I manage just fine

Armed with a caravan, solar laptop and toothpaste made from washed-up cuttlefish bones, Mark Boyle gave up using cash

Read Mark Boyle's response to your comments


Mark Boyle outside his caravan. Mark Boyle outside his off-grid caravan. Photograph: Mark Boyle

In six years of studying economics, not once did I hear the word "ecology". So if it hadn't have been for the chance purchase of a video called Gandhi in the final term of my degree, I'd probably have ended up earning a fine living in a very respectable job persuading Indian farmers to go GM, or something useful like that. The little chap in the loincloth taught me one huge lesson – to be the change I wanted to see in the world. Trouble was, I had no idea back then what that change was.

After managing a couple of organic food companies made me realise that even "ethical business" would never be quite enough, an afternoon's philosophising with a mate changed everything. We were looking at the world's issues – environmental destruction, sweatshops, factory farms, wars over resources – and wondering which of them we should dedicate our lives to. But I realised that I was looking at the world in the same way a western medical practitioner looks at a patient, seeing symptoms and wondering how to firefight them, without any thought for their root cause. So I decided instead to become a social homeopath, a pro-activist, and to investigate the root cause of these symptoms.

One of the critical causes of those symptoms is the fact we no longer have to see the direct repercussions our purchases have on the people, environment and animals they affect. The degrees of separation between the consumer and the consumed have increased so much that we're completely unaware of the levels of destruction and suffering embodied in the stuff we buy. The tool that has enabled this separation is money.

If we grew our own food, we wouldn't waste a third of it as we do today. If we made our own tables and chairs, we wouldn't throw them out the moment we changed the interior decor. If we had to clean our own drinking water, we probably wouldn't contaminate it.

So to be the change I wanted to see in the world, it unfortunately meant I was going to have to give up cash, which I initially decided to do for a year. I got myself a caravan, parked it up on an organic farm where I was volunteering and kitted it out to be off-grid. Cooking would now be outside – rain or shine – on a rocket stove; mobile and laptop would be run off solar; I'd use wood I either coppiced or scavenged to heat my humble abode, and a compost loo for humanure.

Food was the next essential. There are four legs to the food-for-free table: foraging wild food, growing your own, bartering, and using waste grub, of which there is loads. On my first day, I fed 150 people a three-course meal with waste and foraged food. Most of the year, though, I ate my own crops.

To get around, I had a bike and trailer, and the 34-mile commute to the city doubled up as my gym subscription. For loo roll I'd relieve the local newsagents of its papers (I once wiped my arse with a story about myself); it's not double-quilted, but I quickly got used to it. For toothpaste I used washed-up cuttlefish bone with wild fennel seeds, an oddity for a vegan.

What have I learned? That friendship, not money, is real security. That most western poverty is of the spiritual kind. That independence is really interdependence. And that if you don't own a plasma screen TV, people think you're an extremist.

People often ask me what I miss about my old world of lucre and business. Stress. Traffic jams. Bank statements. Utility bills.

Well, there was the odd pint of organic ale with my mates down the local.

• Mark Boyle is the founder of The Freeconomy Community. In a subsequent blog he responds to the comments below.
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http://www.guardian.co.uk/environment/green-living-blog/2009/oct/28/live-without-money
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TRADUÇÃO LIVRE:

Eu vivo sem dinheiro - é muito fácil administrar

Armado com uma caravan, laptop solar e pasta de dentes feitas de ervas e cascas de ostras moídas, Mark Boyle concedeu essa entrevista/depoimento:

Em seis anos de estudo da economia, não ouvi uma única vez a palavra "ecologia". Então, se eu não tivesse tido a oportunidade de comprar um vídeo chamado Gandhi ao final da minha graduação, eu provavelmente acabaram por ganhar a vida muito bem em um trabalho muito respeitável em persuadir os agricultores indianos para ir a GM, ou algo assim (...). O sujeito em ''trajes simples'' me ensinou uma grande lição - para que eu fosse a mudança que eu queria ver no mundo. O problema era que eu não tinha idéia ... de que mudança era.

Depois de administrar um par de empresas de alimentos orgânicos me fez perceber ... Estávamos a olhar para as questões do mundo - a destruição ambiental, fábricas, fazendas industriais, guerras por recursos - e querendo saber a qual deles devemos dedicar nossas vidas. Mas eu percebi que eu estava olhando para o mundo da mesma maneira que um praticante da medicina ocidental olha para um doente, vendo os sintomas ..., sem qualquer pensamento sobre sua causa. Então eu decidi, em vez de se tornar um homeopata social, uma ativista pró-, e para investigar a causa destes sintomas.

Uma das causas críticas desses sintomas é o fato de nós já não vermos as repercussões diretas que nossas compras tem sobre as pessoas, ambiente e os animais que essas afetam. Os graus de separação entre o consumidor e o consumo aumentaram tanto que estamos completamente inconscientes dos níveis de destruição e sofrimento incorporados no material que compramos. A ferramenta que permitiu que essa separação é o dinheiro.

Se nós plantamos nosso próprio alimento, não poderíamos desperdiçar um terço dele como fazemos hoje. Se fizéssemos a nossa própria mesa e cadeiras, não poderíamos jogá-los fora do momento em que mudou a decoração de interiores. Se tivéssemos que limpar nossa água de beber, nós provavelmente não iríamos contaminá-la.

Assim, para ser a mudança que eu queria ver no mundo, que, infelizmente, significava que eu ia ter que abrir mão de dinheiro, que inicialmente eu decidi fazer durante um ano. Eu próprio tenho uma caravan, estacionou-a em uma fazenda orgânica onde eu fui voluntariado e equipado para ser off-grade. Cozinhar e se aquecer da maneira mais ''ecológica'' possível.

(...)

O que aprendi? Essa amizade, não o dinheiro, é a segurança real. Que a pobreza é mais ocidental do tipo espiritual. Essa independência é realmente interdependência. E que, se você não possui uma televisão de tela plasma, as pessoas pensam que você é um extremista.

Muitas vezes as pessoas me perguntam o que eu sinto falta do meu velho mundo de lucro e de negócios. Stress. Engarrafamentos. Extratos bancários. Faturas.

Bem, isto compensa com um ''final de expediente'' bebendo cerveja orgânica com meus companheiros no local.

• Mark Boyle é o fundador da Comunidade freeconomy. Em um blog subseqüentes ele responde aos comentários abaixo.
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MURO DE BERLIM [In:] VINTE ANOS DEPOIS...

Internacional

A revolução que salvou o mundo

Há vinte anos, os alemães-orientais derrubaram o Muro de Berlim,
libertando-se de quatro décadas de totalitarismo e enterrando para
sempre a experiência comunista. Os efeitos do regime falido são
sentidos até hoje na antiga Alemanha Oriental, mas prevê-se que
em dez anos não haverá diferenças no país reunificado


Diogo Schelp, de Berlim

Peter Turnley/Corbis /Latinstock
A QUEDA
Em 11 de novembro de 1989, dois dias depois de os alemães-orientais forçarem a passagem para o Ocidente, os guardas do regime comunista ainda tentavam, sem muita vontade, impedir que o muro fosse desmantelado


VEJA TAMBÉM

Em Berlim, para lembrar é preciso olhar para baixo. As cicatrizes estão marcadas no chão da capital da Alemanha. Discreta, quase imperceptível, uma estreita faixa de paralelepípedos corta uma avenida de asfalto impecável, invade a calçada e desaparece sob a parede de um moderníssimo prédio. Em outros trechos, a menção ao símbolo maior da Guerra Fria traz uma mensagem mais direta: placas de metal encravadas no solo com a inscrição "Muro de Berlim – 1961-1989" informam que por ali passava a barreira que dividiu a Alemanha, a Europa, a Terra. A queda do muro, em 9 de novembro de 1989, foi um desses eventos raros em que a ruptura com o passado é tão brusca que uma única data marca o início de uma nova era. O efeito mais óbvio daquela noite de outono berlinense, em que os alemães-orientais forçaram a abertura das fronteiras para o oeste, foi dar um fim ao conflito entre Estados Unidos e aliados no mundo civilizado e União Soviética. A Guerra Fria, como se chamava esse conflito, se não resultou em embate direto entre as duas superpotências nucleares, por causa do risco de aniquilamento total, configurou o planeta em metades capitalista e comunista que descarregavam a tensão permanente em guerras localizadas, como a da Coreia e a do Vietnã. Com a queda do muro, a Alemanha voltou a ser uma só nação e ficou evidente quem eram os vencedores: o capitalismo, a democracia, a liberdade. O ano de 1989 representou, assim, o fim da história para o comunismo, um regime que, nos países em que se instalou à força de baionetas, ceifou 100 milhões de vidas e eliminou o horizonte de progresso material e espiritual de quem estava sob seus tacões. Nos dois anos seguintes, o império soviético esfacelou-se por completo. Hoje, o sistema que o engendrou sobrevive como curiosidade quase que zoológica apenas numa ilha do Caribe e na metade de uma península asiática. Até a poderosa China, nominalmente comunista, aderiu ao capitalismo, embora esteja a milhões de anos-luz de ser democrática.

Evidentemente, não foi preciso esperar até 1989 para constatar o fracasso do socialismo. A própria construção do Muro de Berlim, iniciada em 13 de agosto de 1961, foi motivada pela incapacidade do sistema de cumprir as promessas de uma vida melhor à população. Até aquela data, 3 milhões de pessoas haviam fugido da Alemanha Oriental para a Ocidental. "Para evitar o colapso do país por falta de gente, o regime comunista precisou prender os seus cidadãos, e não havia maneira mais barata de fazer isso do que construir um muro", diz o historiador inglês Frederick Taylor, autor de Muro de Berlim – Um Mundo Dividido – 1961-1989. Na órbita soviética, cultivava-se a ideia de que, como os alemães eram um povo eficiente, seriam capazes de fazer o socialismo funcionar e, assim, transformar o seu país numa vitrine do sistema. De fato, os alemães-orientais eram mais eficientes do que os seus companheiros do Leste Europeu. Tanto que exacerbaram, mais do que em qualquer outra latitude, o único atributo comunista: o total controle do estado sobre os cidadãos. Controle este que se estendia aos intestinos das crianças. Na pré-escola, todas eram obrigadas a ir ao banheiro na mesma hora.

Fotos reprodução e AFP
OPRIMIDOS E OPRESSORES
À esquerda, crianças comemoram a chegada dos aviões aliados a Berlim, bloqueada pelos soviéticos em 1948. À direita, em 1962, guardas da RDA recolhem o corpo de Peter Fechter, morto ao tentar pular o Muro de Berlim


Não havia uma Polônia Ocidental ou uma Hungria Ocidental, mas havia uma Alemanha Ocidental. Para além de se haver com a total irracionalidade de um sistema que havia banido a propriedade privada e a liberdade de opinião e associação, a República Democrática Alemã (RDA), como era chamada oficialmente a Alemanha Oriental, tinha de se confrontar com a laboriosidade dos alemães-ocidentais, que, dos escombros da II Guerra, construíram uma das nações capitalistas mais pujantes do planeta. No fim da década de 70, os dirigentes da Alemanha Oriental admitiram, para sua vergonha, que o desenvolvimento tecnológico da RDA estava duas décadas atrasado em comparação ao da República Federal da Alemanha (RFA). Provavelmente o abismo era ainda maior, e ele só fez aumentar com o passar do tempo. Em Berlim Oriental, a paisagem urbana era dominada por Trabants, um modelo de carro da década de 50 produzido na RDA. Enquanto no Ocidente a indústria automobilística equipava os veículos com acessórios eletrônicos cada vez mais modernos, o Trabant funcionava com um motor de dois tempos. Para comprar um, era preciso colocar o nome numa lista e esperar quinze anos. "Como resultado, um Trabant usado era mais caro do que um novo", diz o historiador berlinense Hanno Hochmuth. Uma contradição mais do que dialética.

A baixíssima produtividade da indústria da RDA é considerada um dos principais fatores que levaram à queda do muro. Não havia imprensa livre no país, mas não era preciso recorrer aos jornais para verificar o desastre econômico. As fábricas obsoletas, muitas das quais com equipamentos da década de 30, ora não contavam com peças de reposição para as máquinas, ora ficavam sem matéria-prima para produzir. A oferta de produtos era muito limitada. Café e banana, por exemplo, eram artigos de luxo. Como em outros países comunistas, as pessoas acostumaram-se a sair de casa sempre munidas de sacolas. Se encontrassem uma fila na porta de uma loja, entravam, mesmo sem saber o que estava à venda.

A falta de produção e, consequentemente, de recursos explica em parte por que a RDA gostava tanto de fazer presos políticos. A liberdade de cada um deles podia ser vendida por até 100 000 marcos ao governo da Alemanha Ocidental, o equivalente hoje a 50 000 euros. Entre 1963 e 1989, 3,5 bilhões de marcos ocidentais foram parar nos cofres do regime comunista por causa desse tipo de sequestro oficial. O principal objetivo do estado policial da Alemanha comunista, no entanto, era manter a submissão ideológica de seus cidadãos. Nisso, a eficiência também era germânica. A Stasi, corruptela em alemão para Segurança de Estado, era um ministério que abarcava inúmeras funções de repressão, desde a espionagem internacional e doméstica até a investigação criminal. Seus mais de 90 000 funcionários diretos e 180 000 informantes vasculharam em detalhes a vida de um em cada três habitantes da Alemanha Oriental. "Não dava para saber em quem confiar, pois houve casos de dedos-duros entre casais, irmãos e até pais e filhos", diz o historiador Bernd Floriath, pesquisador da repartição pública que administra os arquivos da Stasi. "Na minha ficha, por exemplo, descobri que minha vizinha contava até o número de garrafas de vinho da minha lata de lixo." Uma questão incômoda na Alemanha atualmente é se pessoas que espionaram para a Stasi no passado podem ocupar cargos públicos de destaque. Muitos ex-colaboradores da repressão comunista estão hoje ascendendo na política. A maioria é filiada ao partido Die Linke (A Esquerda), um herdeiro do Partido Comunista da RDA cuja representação no Parlamento alemão aumentou em 30% após as eleições deste ano. A chanceler Angela Merkel é um dos poucos políticos oriundos da Alemanha Oriental sem um passado a esconder.

Fotos reprodução, Corbis/Latinstock e Album/AKG/Latinstock
AMEAÇAS AO MURO
No alto, Kennedy olha por cima do muro, em 1963. À esquerda, guarda encarregado de vigiar a barreira foge para o lado ocidental. À direita, igreja situada na "zona da morte" é implodida, em 1985


As informações recolhidas pela Stasi eram usadas para punir os cidadãos que não se mostrassem "bons comunistas". Função semelhante tinham as diversas organizações militares ou paramilitares da RDA. "A militarização da sociedade tinha como objetivo quebrar a vontade própria do indivíduo e começava já no jardim de infância", diz Tom Sello, um dos 3 000 alemães-orientais que se arriscaram a fazer oposição na Alemanha Oriental. Entre outras atividades, as crianças tinham de fazer simulações de manobras contra hipotéticas invasões capitalistas. Na adolescência, os alunos eram pressionados a aderir à Juventude Livre Alemã, uma organização paramilitar que tinha entre suas atividades quebrar as antenas de TV dos moradores que assistiam aos canais ocidentais. Impedidos de viajar, era assim que os cidadãos sob o regime comunista verificavam que a vida do outro lado era muito melhor. A região de Dresden, onde as características topográficas dificultavam a captação de sinais de TV do Ocidente, era chamada de Vale dos Inocentes.

Muro derrubado, a Alemanha voltou a ser um só país em 1990. Até agora, o custo da reunificação já bateu em 1,5 trilhão de euros. No início, o processo produziu uma espécie de milagre alquímico: os alemães-orientais puderam trocar seu dinheiro por marcos alemães-ocidentais, então uma das moedas mais fortes do mundo, na proporção de 1 para 1. No mercado negro a proporção era de 1 para 5. Quase vinte anos depois, os efeitos são vistosos na infraestrutura. A porção oriental de Berlim reluz como a parte ocidental e as rodovias no antigo território oriental são melhores do que as do resto da Alemanha. Mas os problemas permanecem, se não insuperáveis, bastante grandes. Os subsídios governamentais atraíram empresas para o leste, mas não na proporção necessária para empregar todos os trabalhadores. Além disso, os sindicatos alemães não aceitaram que os salários fossem mais baixos nos estados que compunham a Alemanha Oriental, o que seria natural dada a menor qualificação dos trabalhadores de lá. Desse modo, as empresas em busca de mão de obra mais barata preferiram instalar-se, em sua maioria, nas outras ex-repúblicas comunistas – que adoraram, é claro, receber o investimento.

O corolário do sindicalismo míope é que o desemprego entre os alemães-orientais é o dobro do registrado no restante da Alemanha e, nos últimos vinte anos, a migração para a parte ocidental fez a região perder 8% de sua população. Um passeio a pé por Halle, uma importante cidade industrial nos tempos da RDA, deixa claro o perfil dos que saem do leste: há poucas mulheres jovens nas ruas. Uma em cada cinco residências de Halle está abandonada, e o governo chegou a demolir modernos conjuntos habitacionais cons-truídos após a reunificação, por falta de gente para morar. "O erro maior é acreditar que os problemas econômicos e demográficos são culpa da reunificação ou da transição para o capitalismo", diz Udo Ludwig, do Instituto de Pesquisas Econômicas de Halle. "Na verdade, tudo isso ainda é efeito das décadas em que estivemos apartados do resto da Alemanha." É como um braço amputado: depois de reimplantado, custa a fun-cionar normalmente.

A Alemanha Ocidental tornou-se uma potência exportadora nos anos 50 e 60, quando tinha pouca concorrência internacional. Já a Alemanha Oriental fez a transição para a economia de mercado em um momento em que a disputa é bem mais acirrada: além de todo o Leste Europeu, há a China, o novo chão de fábrica do mundo. Pouco a pouco, no entanto, a diferença entre os alemães está diminuindo. O PIB per capita no leste da Alemanha é de 75% da média nacional. "Os alemães-orientais devem alcançar a proporção de 85% em dez anos", diz Wolfgang Tiefensee, até o mês passado titular do Ministério para a Reconstrução do Leste. Desde 2005, as ofertas de emprego na região aumentaram. E mesmo os que não têm trabalho vivem melhor com a renda do seguro-desemprego do que há vinte anos sob o comunismo. Como explicar, então, a onda de "ostalgia" (neologismo que une as palavras ost, leste em alemão, e nostalgia)? "A questão é que centenas de milhares de pessoas perderam a posição de destaque que tinham na RDA e hoje têm de se contentar com atividades de status mais baixo", diz Rainer Eckert, diretor do Fórum de História Contemporânea de Leipzig.

Como não poderia deixar de ser, a reunificação alçou a Alemanha a um novo patamar de liderança externa e a queda do muro deu impulso à União Europeia. "A UE expandiu-se rapidamente para o leste, onde se mostra fundamental para melhorar a gestão pública e manter a estabilidade", diz o historiador inglês Tony Judt, especialista em Europa. O fim do comunismo, representado pela derrubada do muro, também propiciou a aceleração do processo de globalização econômica e o enfraquecimento das visões estatizantes em países como o Brasil e a Índia, hoje duas potências emergentes. Há vinte anos, porém, a primeira-ministra inglesa Margaret Thatcher e o presidente francês François Mitterrand tinham calafrios ao imaginar a possibilidade da reunificação do país. "Gosto tanto da Alemanha que prefiro duas", dizia Mitterrand. Recentemente, a divulgação de gravações feitas pelos russos revelou que Thatcher chegou a pedir ao líder soviético Mikhail Gorbachev que impedisse a reunificação. Em 1990, Thatcher disse a Gorbachev: "Toda a Europa está assistindo a tudo isso não sem uma dose de temor, lembrando muito bem quem começou as duas guerras mundiais". Lothar de Maizière, o último governante da RDA, diz que foi o chanceler da Alemanha Ocidental, Helmut Kohl, quem conseguiu convencer Mitterrand de que não era preciso se preocupar com as ambições da Alemanha. Thatcher era mais resistente. "Eu próprio tentei tranquilizá-la, dizendo que ninguém na Alemanha pensava em fazer reivindicações de território ou colocar em dúvida as fronteiras existentes", conta De Maizière.

Fotos Peter Turnley/Corbis/Latinstock e Sygma/Corbis/Latinstock
PROTAGONISTAS
À esquerda, Gorbachev e Erich Honecker, líder da RDA, ambos de chapéu, um mês antes da queda do muro. À direita, Reagan e Thatcher, em 1987


As preocupações de Thatcher eram perfeitamente justificadas para alguém que conheceu as agruras da II Guerra e se criou politicamente no período de tensões da Guerra Fria. Para não causar mais problemas, a Alemanha derrotada em 1945 emergiu do conflito partilhada pelas forças de ocupação. Foram criados um setor americano, um francês, um inglês e um soviético. Esse padrão se repetiu na capital, Berlim, encravada no coração do território alemão sob influência soviética. Em 1949, a Alemanha foi dividida em dois estados, um comunista e um capitalista. Nesse contexto, Berlim tornou-se o palco de alguns dos momentos mais críticos da Guerra Fria. Em 1948, Stalin, que queria Berlim inteira para si, ordenou um bloqueio à parte ocidental – furado por uma ponte aérea organizada pelos americanos. Ninguém resumiu tão bem o significado de Berlim como centro de resistência ao totalitarismo comunista quanto o presidente americano John Kennedy, em visita à cidade, em 1963. Em discurso aos moradores da parte ocidental, ele disse: "Todos os homens livres, onde quer que vivam, são cidadãos de Berlim. E é assim, como um homem livre, que me orgulho dessas palavras: eu sou berlinense!".

O Muro de Berlim não teria caído em 1989 se não fosse pelo líder soviético Mikhail Gorbachev. "O russo, ele próprio às voltas com reformas na União Soviética, deu espaço às outras repúblicas comunistas do Leste Europeu para experimentarem algum tipo de abertura", diz o americano Michael Meyer, autor do livro 1989 – O Ano que Mudou o Mundo. O presidente americano Ronald Reagan, Thatcher e Kohl souberam aproveitar a disposição de Gorbachev de reduzir as tensões entre os blocos comunista e capitalista, e a nova realidade política foi interpretada da seguinte forma no Leste Europeu: "O líder soviético não está disposto a usar a força para salvar o comunismo". Em maio de 1989, Miklós Németh, o primeiro-ministro reformista da Hungria, mandou desativar a cerca elétrica na fronteira de seu país com a Áustria. Estava aberta a primeira brecha na Cortina de Ferro. Atropelado pelas reformas iniciadas nos países vizinhos e pela crescente onda de protestos, o governo da RDA ensaiou uma tímida lei que permitiria aos cidadãos viajar ao exterior. No dia 9 de novembro, ao final de uma entrevista coletiva com jornalistas ocidentais, o porta-voz do regime Gunter Schabowski comentou as novas regras para viagens. "Quando isso entra em vigor?", perguntou um jornalista. "Imediatamente", respondeu Schabowski, um pouco confuso.

Na verdade, o plano era que as viagens pudessem ser feitas a partir do dia seguinte e de maneira organizada. Mas, logo nas primeiras horas após a entrevista, uma multidão começou a se aglomerar nos postos de controle do muro e a exigir o direito de passar para o outro lado. Um chefe da guarda acabou cedendo. A festa atravessou a madrugada e continuou no dia seguinte, quando marretas e picaretas começaram a ser empregadas para arrancar os primeiros pedaços do muro. A razão imediata que levou à queda dessa barreira ignóbil foi a mesma que justificou a sua construção: o desejo dos cidadãos de deixar para trás a claustrofobia do regime comunista. Vinte anos após a queda do muro, os pés dos berlinenses ignoram as linhas que sinalizam a localização da barreira da vergonha. Eles cruzam de um lado para outro sem tomar conhecimento da extinta divisão entre leste e oeste. Não podia haver exaltação maior à liberdade.

O herói das fugas

Luiz Maximiano


A história do muro é a história de Hartmut Richter. Aos 13 anos, ele viu a barreira ser construída. Em 1966, aos 18 anos, foi preso em uma tentativa frustrada de fugir do país pela fronteira da então Checoslováquia com a Áustria. Foi condenado a dez meses de cadeia, cumpriu três por demonstrar arrependimento e, no mesmo ano, fez uma nova fuga. Dessa vez, bem-sucedida: Richter cruzou a nado o canal de Teltow, ao sul de Berlim, em quatro horas, sem ser visto pelos guardas de fronteira, que tinham ordens para atirar. "Eu fugi porque não suportava ter de reiterar o tempo todo a submissão ao estado e à ideologia comunista", diz. Na década de 70, uma anistia permitiu a fugitivos como Richter visitar novamente a RDA. Ele aproveitou a oportunidade para ajudar outros alemães-orientais a fugir. Ao todo, Richter contrabandeou 33 pessoas para o lado ocidental, todas escondidas em seu carro. Em 1975, ele foi pego pela polícia secreta enquanto tentava cruzar a fronteira com a irmã e o cunhado no porta-malas. Durante meses, Richter foi pressionado nas masmorras do regime comunista para entregar o nome de outras pessoas que planejavam escapar para o oeste. "Eu passava várias semanas na solitária e era interrogado quase diariamente", diz Richter. Condenado a quinze anos de cadeia por "tráfico humano", o herói do muro passou cinco anos e sete meses preso até ter sua liberdade comprada pelo governo da Alemanha Ocidental. Ainda hoje, Richter, de 61 anos, comemora o dia de sua fuga pelo canal de Teltow como se fosse seu aniversário.

Do lado errado

Luiz Maximiano


Toralf Dörre tinha 22 anos e estava a poucas semanas de completar o serviço militar quando foi convocado para participar da repressão a um protesto popular em Leipzig, em 9 de outubro de 1989. A ordem do líder comunista Erich Honecker era para atirar na multidão. Um massacre semelhante ao da Praça da Paz Celestial, em Pequim, estava sendo preparado. Os hospitais já haviam até recebido a orientação de estocar sangue para transfusões. "Antes de descermos do caminhão militar, o comandante gritou: ‘Vamos acabar com estes elementos antissociais!’", lembra Dörre. Ele tremeu quando viu 70 000 pessoas descendo a avenida em sua direção. Sabia que amigos participavam do protesto. "Eu estava do lado errado", diz. Para sua surpresa, meia hora depois recebeu a ordem de voltar ao caminhão. As forças de segurança não estavam preparadas para uma manifestação tão grande. Duas semanas mais tarde, já dispensado do serviço militar, Dörre juntou-se aos manifestantes. Finalmente, do lado certo.

O valor da liberdade

Luiz Maximiano


A reunificação da Alemanha significou uma mudança radical na vida da família de Stephanie Rabe, de 19 anos, estudante de administração em Leipzig. Os pais eram bancários e foram demitidos alguns anos depois do fim do regime comunista. Mas ninguém sente saudade da RDA. "Eu não consigo me imaginar vivendo sob um estado que me proibisse de viajar e determinasse os rumos da minha vida", diz Stephanie, nascida um ano após a queda do muro. "E, apesar do desemprego, meus pais levam uma vida digna." A estudante só se incomoda com o fato de os alemães-orientais serem retratados pelos programas humorísticos da televisão como pobretões estereotipados.

O cantor de protesto

Nadja Klier/Evangelische Verlagsanstalt


Vencedor de um festival nacional da canção em 1981, Stephan Krawczyk tinha a aprovação do regime comunista. "Mas eu não queria mentir com minha música", diz o cantor, que pouco depois de receber o prêmio começou a escrever letras de protesto – todas proibidas pelo Ministério da Cultura. Krawczyk ignorou a censura e manteve o seu repertório até que, em 1983, o proibiram de se apresentar e, em 1985, de exercer a profissão de músico. Krawczyk passou a tocar e cantar dentro de igrejas protestantes, livres da interferência do estado. Os arquivos da Stasi revelaram recentemente que, durante três anos, oitenta pessoas espionaram o cantor e sua mulher. Em 1988, o músico foi preso em Berlim por protestar contra a proibição de trabalhar e, em seguida, enviado para o exílio. Ao contrário de alguns cantores de protesto brasileiros dos anos 60 e 70, Krawczyk segue abominando qualquer tipo de ditadura, seja qual for sua orientação ideológica.

O dedo-duro

Luiz Maximiano


A bandeira da Alemanha Oriental amarrotada no canto esquerdo do escritório prova o contrário, mas Volker Külow, deputado no Parlamento do estado da Saxônia-Anhalt, garante: "A RDA está mais viva do que nunca". Külow é um dos muitos membros do partido Die Linke (A Esquerda) com um passado de colaboração com o Partido Comunista e, ainda pior, com a Stasi, o serviço de repressão política da Alemanha Oriental. "Sim, eu fui informante da Stasi, mas fiz isso porque era algo em que eu acreditava", diz Külow. "Hoje vejo que foi um erro, porque as pessoas que espionávamos não representavam um perigo para o regime, ao contrário do que o Partido Comunista nos fazia acreditar." O deputado estadual quase foi cassado por causa desse passado comprometedor. Ao todo, Külow delatou oito pessoas à ditadura comunista. Ele garante que algumas delas o perdoaram. "Não é justo: a Alemanha hoje é mais rigorosa com os ex-comunistas do que foi após a II Guerra com os ex-nazistas", reclama Külow.

Album/AKG/Latinstock

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http://veja.abril.com.br/111109/revolucao-que-salvou-mundo-p-126.shtml

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SAÚDE PÚBLICA: REDUÇÃO DE ESTÔMAGO

Conselho Nacional de Saúde considera ilegal cirurgia de diabetes

ÉPOCA ouviu a paciente de Goiânia submetida ao procedimento. O caso dela foi a principal motivação para o conselho entrar nesta semana com uma representação no Ministério Público Federal pedindo que a operação deixe de ser realizada no Brasil.

CRISTIANE SEGATTO
Anderson Schneider
SUCESSIVAS INTERNAÇÕES
Daliana passou pela cirurgia em 2005. Desde então, enfrenta graves problemas de saúde
Pelo menos 450 pacientes no Brasil já passaram por uma controversa cirurgia criada pelo médico goiano Aureo Ludovico de Paula com o objetivo de se livrar do diabetes tipo 2. Talvez o mais conhecido seja o apresentador de TV Fausto Silva, operado em julho. Faustão diz que está bem mas não fala sobre seu caso. A técnica é chamada de interposição do íleo. O íleo é a porção final do intestino delgado onde são secretados hormônios que estimulam a ação da insulina no pâncreas. Paula acredita que uma mudança nessa região do intestino possa controlar o diabetes e manter os pacientes livres dos remédios.


Desde 2007, a técnica tem sido apresentada em reportagens como uma esperança de cura. Nesta semana, o Conselho Nacional de Saúde se manifestou oficialmente sobre o assunto. Segundo o órgão que faz parte do Ministério da Saúde, a operação é ilegal.


Na quarta-feira (4), o Conselho Nacional de Saúde entrou com uma representação no Ministério Público Federal, em Goiânia, pedindo providências à procuradora Léa Batista de Oliveira. O presidente do Conselho Nacional de Saúde, Francisco Batista Júnior, espera que a procuradora entre com uma ação judicial impedindo a realização desse procedimento no Brasil.


A cirurgia não é regulamentada pelo Conselho Federal de Medicina como são todas as técnicas cirúrgicas consagradas. Poderia ser considerada experimental. Para isso o médico precisaria ter registrado um protocolo de pesquisa na Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep). Esse registro nunca existiu.


“Se a técnica não está formalizada nem é experimental, ela é ilegal”, afirma Batista Júnior. Segundo ele, o Conselho Nacional de Saúde está preocupado com as pessoas que fizeram a cirurgia e acham que estão bem. “A cirurgia atua sobre uma porção do intestino que é fundamental para a absorção de nutrientes. Essas pessoas precisam saber que correm o risco de desenvolver complicações imprevisíveis que podem até levar à morte.” Batista Júnior afirma que o Conselho Nacional de Saúde pretende mapear todos os pacientes que passaram pela cirurgia e acompanhar a evolução deles.


Feita por laparoscopia, a cirurgia consiste em aproximar do estômago uma parte do íleo (porção final do intestino delgado). O objetivo é intensificar a produção de hormônios existentes no íleo que estimulam a ação de insulina no pâncreas. Durante a operação, o médico faz também uma redução de cerca de 40% do estômago. O paciente perde peso e, com isso, diminui a resistência do organismo à insulina. O diabetes melhora.

Paula tem apresentado resultados positivos em congressos médicos e em revistas científicas. Em um artigo publicado em agosto de 2007 no periódico Surgical Endoscopy, ele afirma que, em um grupo de 39 pacientes submetidos à técnica, 90% ficaram completamente livres do diabetes. A técnica tem sido divulgada em reportagens. Mas a falta de estudos clínicos registrados e acompanhados por outros especialistas impede a avaliação criteriosa de possíveis riscos e benefícios.


“Não existe substrato na literatura científica para que essa técnica seja oferecida à população. Ela é feita por um único cirurgião que apresenta resultados sem auditoria”, diz Thomaz Szegö, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica. Segundo Szegö, não é possível dizer nesse momento se a técnica é boa ou ruim.

“Ninguém está dizendo que a técnica é ruim. Estamos dizendo que é preciso comprovar se ela é boa ou ruim antes de oferecê-la aos pacientes”, diz. “Se for comprovado que ela é segura e eficaz, vamos incorporá-la ao arsenal médico”.


Segundo o presidente do Conselho Nacional de Saúde, Francisco Batista Júnior, os pacientes de Paula não estão sendo devidamente informados sobre a falta de aprovação da cirurgia e sobre o risco de aparecimento de resultados inesperados.


A principal motivação da providência tomada pelo Conselho Nacional de Saúde foi a denúncia feita pela advogada Daliana Kristel Gonçalves Camargo, de 31 anos, moradora de Goiânia. Em 2005, Daliana decidiu fazer uma cirurgia de redução de estômago. Ela mede 1m58 e, na ocasião, estava com 95 quilos. Segundo Daliana, o médico Aureo Ludovico de Paula disse que usaria a técnica convencional. Daliana assinou um termo de ciência, segundo o qual seria submetida a uma gastroplastia laparoscópica para tratamento de obesidade mórbida. Gastroplastia é um nome genérico que indica redução de estômago.


A informação que aparece no relatório assinado pelo médico no final da cirurgia é outra: ele afirma ter feito uma “gastroplastia vertical associada a interposição ileal”. A família de Daliana diz que não foi informada de que ela tinha sido submetida a uma cirurgia não-regulamentada. “O médico não nos explicou nada sobre isso. Achamos que minha filha faria uma redução de estômago convencional, a mesma que tanta gente já fez”, diz a mãe de Daliana, a funcionária pública Vera Lúcia Gonçalves de Camargo. “Vimos o termo interposição ileal no relatório dele mas não estranhamos nada. Somos leigos.” A família diz ter pago R$ 28 mil pela cirurgia.

Conheça o caso de outros pacientes e leia mais sobre cirurgias de obesidade na revista ÉPOCA que estará nas bancas neste sábado: que tipos de cirurgias existem, quanto elas custam, para que pacientes elas são indicadas e quais os riscos envolvidos.

A família não entende também por que Daliana foi submetida à interposição do íleo se ela nunca foi diabética. Teoricamente, a interposição do íleo poderia contribuir para a liberação de hormônios que aumentam a sensação de saciedade. Essa é uma hipótese levantada pelos cientistas. Mas não há comprovação de que seja seguro recorrer a esse expediente para reduzir a vontade de comer. Para obter exclusivamente esse efeito, existem as cirurgias clássicas de redução de estômago que já foram testadas, reproduzidas por muitos grupos ao redor do mundo e regulamentadas.


Daliana diz que sua vida nunca mais voltou ao normal depois da cirurgia. “Mesmo comendo devagarzinho, eu só vomitava. Eu procurava o médico e ele dizia que o problema era meu, que eu não sabia comer direito.” Nos últimos anos, ela foi submetida a vários procedimentos para tentar fechar uma fístula em seu estômago. Ficou internada por longos períodos, inclusive na UTI.


Desde o início do ano, Daliana não come nada. Não pode sequer beber água. É alimentada por uma sonda que leva uma solução proteica diretamente ao seu intestino. A família entrou na justiça de Goiânia com uma ação contra o médico. Pede o pagamento das despesas médicas e uma indenização de R$ 10 milhões. “Esse não é um caso de erro médico. É um caso grave de experiência médica sem consentimento”, diz o advogado da família Marcelo Di Rezende Bernardes.


A procuradora Léa Batista de Oliveira, do Ministério Público Federal, em Goiânia, investiga o caso desde julho. Recebeu nesta semana a representação do Conselho Nacional de Saúde. Pretende entrar com uma ação penal de lesão corporal e exercício ilegal da medicina contra Aureo Ludovico de Paula. Antes disso, vai solicitar que Daliana seja submetida a uma perícia médica e vai ouvir o médico. “Com base nas investigações que fizemos até agora tudo indica que esse é um caso de grave violação dos direitos humanos”, diz Léa.

“Estamos diante de experiências realizadas em desconformidade com todas as normas vigentes. O médico não informa devidamente os pacientes sobre os riscos da cirurgia, não tem protocolo de pesquisa, faz publicidade de uma técnica não-regulamentada e cobra por ela”, diz Léa. O caso de Daliana também está sendo investigado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

Na quarta-feira, ÉPOCA esteve no consultório do médico Aureo Ludovico de Paula, em Goiânia. Ele se recusou a dar entrevista. Disse que não fala sobre sua técnica nem sobre o caso Daliana. Em sua defesa no processo que corre no Tribunal de Justiça de Goiás, o médico alega que “a cirurgia não é experimental e sim uma variante técnica de uma cirurgia consagrada há mais de 20 anos”.


Afirma também que “a paciente não foi objeto de nenhuma pesquisa e sim de terapêutica para obesidade e que a complicação ocorrida aparece na mesma frequência em outras operações bariátricas”. Alega ainda que “a fístula é uma resposta orgânica espontânea da paciente. É intercorrência imprevisível, uma complicação pós-operatória sem nenhum nexo com o procedimento realizado adequadamente”.

Leia a entrevista de Daliana a ÉPOCA

ÉPOCA esteve no quarto de Daliana em sua casa em Goiânia. Presa a uma sonda e a um dreno, Daliana costuma passar os dias agitada. Tem se tratado com o antidepressivo Daforin. Em um raro momento de tranquilidade, concordou em dar a seguinte entrevista:
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 Reprodução
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'QUERIA FICAR BONITONA'
Daliana antes da cirurgia
ÉPOCAPor que você resolveu emagrecer?
Daliana Kristel Gonçalves Camargo - Queria ficar bonitona. Tinha tentado de tudo: spa, dietas etc. Fazia exercício, fazia de tudo e não emagrecia. Sempre quis ser magrinha. Queria ser maravilhosa no verão. Mas fui engordando, engordando. Primeiro o Dr. Áureo colocou um balão no meu estômago. Fiquei seis meses com ele mas não resolveu. Logo comecei a engordar de novo. Ele me disse que se eu tivesse 100 kg poderia fazer a cirurgia. Comecei a comer muito para poder fazer a operação. Era mais fácil engordar do que emagrecer. Passei de 77 para 86 kg. O médico disse que ainda não dava. Aí eu me esforcei. Comia muito doce e fritura. Tudo. Cheguei a 95 kg. Agora você imagina o que é não poder comer nada agora. Eu gostava muito de comer.

ÉPOCAVocê queria ficar magra para quê?
Daliana - Para me educar. Depois da cirurgia eu não iria poder comer tanto, não iria engordar. Iria ficar bonita, iria vestir a roupa que quisesse. A psicóloga tinha me dito que depois da cirurgia minha vida seria diferente. Iria viver uma vida de operada.

ÉPOCAÉ verdade que depois da cirurgia de 2005 você nunca mais pôde comer uma refeição normal?
Daliana - É verdade. Eu vomitava, passava muito mal. Comia só papinha e ainda assim só vomitava. Mesmo comendo devagarzinho eu só vomitava. Eu procurava o médico e ele dizia que o problema era meu, que eu não sabia comer direito. Eu achava que ele estava certo e não discutia com ele. Ele dizia que a culpa era minha e eu acreditava.

ÉPOCAEle nunca explicou nada para você sobre a interposição do íleo? Não disse que era uma técnica experimental?
Daliana - Não. Nunca falou. Quando os problemas começaram a aparecer, ele disse que eu era azarada. Ele disse que tudo o que fazia dava certo, mas em mim as coisas que ele fazia não davam certo. Por muito tempo eu achei que não ia achar outro médico que fosse dar conta do meu caso. Por mais que ele me maltratasse eu tinha que aceitá-lo porque eu não tinha para onde ir.

ÉPOCAQual é o sentimento que você tem em relação ao Dr. Áureo?
Daliana - Tenho raiva porque ele não me disse que iria fazer uma cirurgia não regulamentada. Tenho raiva porque ele disse uma coisa e fez outra. Hoje não posso comer nada. Nem beber água.

ÉPOCAComo está se sentindo hoje?
Daliana - Perdi contato com minhas amigas. Estava fazendo pós-graduação, tive de parar. Não dou conta de estudar desse jeito. Perdi minha avó. Minha avó morreu, não pude ir ao velório dela. Eu estava internada em São Paulo. Quando cheguei em casa...(choro). Não acreditei que nunca mais iria ver minha avó. É muito triste.

ÉPOCAE você sente falta da convivência com seus amigos?
Daliana - Todo domingo a gente saía, ia ao cinema, em festinha, era muito bom. Eu perdi isso. Não posso sair porque se vejo comida fico louca para comer e não posso. Estou tomando Daforin para controlar a ansiedade. Consigo andar mas preciso carregar o suporte da sonda e tomar cuidado com o dreno. Estou com sonda desde janeiro deste ano. Estou presa a ela porque tenho de tomar a dieta proteica. Tomo seis por dia.

ÉPOCAVocê sente fome?
Daliana - Só vontade de comer.

ÉPOCAO que você tem feito?
Daliana - Vejo televisão, fico na internet (uso notebook), tento estudar. O que eu posso fazer, eu faço. Mas tenho que ter muito cuidado com o dreno colocado na saída do estômago. Não posso correr nem andar muito rápido. Andar devagar e com muito cuidado eu posso. Até porque o dreno não tem ponto. Se sair tenho de pegar um avião, ir correndo pra São Paulo, torcer pra não dar nenhuma infecção. Se der infecção, tenho de tomar antibiótico e nem sei qual. Tem de fazer punção, drenar, ver qual bactéria que eu tenho e qual antibiótico tenho que tomar. É uma novela. Tem dia que choro a noite toda.

ÉPOCAVocê sabe com quantos quilos, mais ou menos, você está hoje?
Daliana - Sei. Estou com 56 kg. A dieta é muito boa, não me deixa emagrecer. Preciso estar bem para a próxima cirurgia. O médico de São Paulo vai tentar fechar a fístula que eu tenho no estômago. Se não funcionar, ele vai ter de extrair o meu estômago. Vou rezar muito para dar certo.
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Asssita ao vídeo que a família de Daliana colocou na internet sobre o caso:

http://www.youtube.com/watch?v=IVD1vnuw1ds&feature=player_embedded
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http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI103113-15257,00-CONSELHO%20NACIONAL%20DE%20SAUDE%20CONSIDERA%20ILEGAL%20CIRURGIA%20DE%20DIABETES.html
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BRAS-ILHA [In:] "BRASIL, MOSTRA TUA CARA..." *

Brasil

A ética dos incomuns

O Supremo Tribunal Federal tomou o centro do palco político em Brasília ao
dar sinais de que pode punir exemplarmente o uso de caixa dois em campanhas.
Os oráculos da política fingem não ter entendido o recado da Justiça


Diego Escosteguy

Montagem sobre ilustração de Negreiros. Fotos de Lula Marques/Folha Imagem, Jamil Bittar/Reuters, Ed Ferreira/AE, Carlos Pupo/AE e Sergio Dutti/AE


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A dona de casa Francisca Gonçalves Lima tem 31 anos, quatro filhos e um teto na cidade de Recanto das Emas, na periferia de Brasília. Ela deve 200 reais de aluguel. Há uma semana, temendo ser despejada, Francisca sofreu um colapso nervoso - e, num ato de atroz desespero, pingou veneno de rato no suco dos filhos.

Em seguida, ingeriu a dose restante. Todos, felizmente, sobreviveram. Francisca está internada, sob escolta policial. Francisca é uma cidadã comum. Quando deixar o hospital, será presa. Pela lei de Deus, ela pecou. Pela lei dos homens, ela será punida. Esse é o mundo dos brasileiros sem privilégios.

A 30 quilômetros do barraco de Francisca, protegidos pelo confortável manto dos poderes da nação, há uma casta de homens e mulheres que não se submete às mesmas leis e aos mesmos costumes. São os políticos, ou os "incomuns" - aqueles que, como bem explicou o presidente Lula ao defender as ilegalidades cometidas pelo senador José Sarney, "não podem ser tratados como pessoas comuns". Sob o infalível perdão do presidente, eles continuam cometendo toda sorte de transgressões, algumas aparentemente pequenas em dolo, como enganar os idosos com promessas de reajuste de pensão, outras em escala, como a constante tentativa de afrontar as leis vigentes.

Ao contrário dos homens comuns, eles não creem que possam sofrer sanções morais, legais e muito menos políticas. Na Divina Comédia, o poeta Dante Alighieri percorre os círculos do Inferno para conhecer os pecados do mundo. Os gabinetes da Esplanada dos Ministérios oferecem excursão semelhante. Em Brasília, ele descobriria que tudo é permitido. A ilustração que abre esta reportagem, inspirada em uma obra do século XV, foi adaptada para exibir os sete pecados capitais de nossos homens públicos incomuns de nossa capital incomum. Na semana passada, esse sistema cínico, de cuja ética relativa apenas poucos e bons escapam, sofreu um choque de realidade. O Supremo Tribunal Federal (STF) começou o julgamento do chamado "mensalão mineiro", que tem como principal implicado o senador tucano Eduardo Azeredo. Ele é acusado de ter recorrido aos favores financeiros nunca desinteressados do hoje notório Marcos Valério, "o carequinha que fazia chover dinheiro" na expressão memorável do petebista Roberto Jefferson. O ministro Joaquim Barbosa, relator do caso, encontrou indícios suficientes para recomendar a abertura de processo criminal contra o senador.

Ricardo Stucker/PR
ORÁCULO
O presidente Lula e a rotina de transgressões em nome de interesses políticos: perdão infalível aos aliados


A decisão do STF, que ainda precisa ser confirmada pelos demais ministros, mostra que, ao contrário do que alguns políticos gostariam, nem tudo está controlado. Joaquim Barbosa, durante o julgamento, chegou a sugerir que o caso do senador tucano fosse analisado simultaneamente com seu similar mais famoso, o mensalão petista - esquema milionário de desvio de recursos públicos idêntico ao dos tucanos, mas ampliado pelo governo Lula para também subornar congressistas. Juridicamente, a ideia parece inexequível, mas sua simples proposição revela a disposição da Justiça em condenar e punir a gênese dos grandes escândalos de corrupção: o caixa dois dos políticos. Apesar dos sinais claros, há gente que ainda insiste em tentar trafegar na contramão. Na semana passada, o presidente do Congresso, o senador José Sarney, demonstrou que ainda não entendeu o recado. Ele decidiu ignorar uma decisão do Supremo, que determinara a cassação do senador Expedito Júnior, do PSDB de Rondônia, por compra de votos. Candidamente, quando o senador Cristovam Buarque subiu o tom e sugeriu que ele fosse preso por dar de ombros à mais alta corte do país, Sarney saiu-se com um gracejo: "Ah, é? Peço que não me levem cigarro na prisão porque não fumo, mas que me confortem". Um dia depois, voltou atrás, não por sua iniciativa, mas por decisão do próprio Expedito Júnior, que retirou um recurso impetrado com o único propósito de protelar seu afastamento. O caso foi resolvido, mas ficou o perigoso rastilho da intenção de afrontar a Justiça.

Pode-se argumentar que a ética sempre esteve, e talvez sempre estará, distante da política - ainda mais no Brasil. A história dá alguma razão a quem pensa assim. Na Grécia antiga, onde floresceu a experiência democrática, já havia severas restrições ao comportamento dos governantes. Na obra A República, o filósofo ateniense Platão comparou a praga dos políticos mal-intencionados a zangões: eles confiscavam os ricos por meio de altos impostos, serviam-se do que podiam e distribuíam os restos às massas.

Celso Junior/AE
MANOBRA
Manifestação de aposentados em Brasília: os idosos cobram o que lhes foi prometido e o governo faz de conta que vai atendê-los


O Brasil sempre conviveu com um enxame de gordos zangões, que, desde a redemocratização, assomaram na vida pública do país fazendo muito barulho. O imortal José Sarney, o primeiro presidente depois do período militar, estendeu por um ano o próprio mandato e ainda viu uma CPI no Congresso debruçar-se sobre as mutretas de seu governo. Eram tempos nos quais o então deputado Lula qualificava Sarney de "o maior ladrão da República". Seu substituto, o iracundo Fernando Collor, barbarizou tanto em dois anos de governo que o Congresso o derrubou, por meio de um inédito processo de impeachment. O tucano Fernando Henrique Cardoso, recorrendo à sua base de apoio no Parlamento, mudou a Constituição para poder se reeleger - e foi acusado de comprar votos para isso. O Congresso, o espaço de disputa política por excelência, criou CPIs, descobriu malfeitorias e cassou anões do Orçamento, deputados escroques, parlamentares enrolados com empreiteiras... Tempos em que havia reprimendas. Se não jurídicas, ao menos políticas. Queimava ainda uma réstia de decoro, representada, sobretudo, no chuço empunhado com vigor pelo PT, Quixote disposto a atacar os gigantes da política para demonstrar o valor de seus ideais.

Quando Lula e o PT assumiram o governo, logo ficaram amigos dos gigantes. Sobrevieram os pequenos escândalos, como quando a então ministra Benedita da Silva usou dinheiro público para ir rezar na Argentina. Em seguida apareceram escândalos como o do petista Waldomiro Diniz, assessor do ex-deputado José Dirceu, pilhado achacando um bicheiro. Era o prelúdio da mãe de todas as decepções éticas: a insólita odisseia do mensalão. Era inacreditável, mas era verdade: o PT havia comprado, com dinheiro sujo, o apoio de deputados dos partidos aliados. Lula saiu em defesa dos seus, dizendo que o "PT havia feito o que sempre se fez sistematicamente no Brasil". Encontra-se ali o ponto de inflexão na prática política do país, o momento no qual a tradicional cultura do favor e da transgressão na esfera pública perde seu único anteparo. Sobrou somente o trauma - e a ética dos incomuns. Diz o filósofo Renato Janine Ribeiro, da Universidade de São Paulo: "Desde então, a política ficou à deriva. O país ainda não se recuperou da perda do referencial ético simbolizado pelo PT".

Joedson Alves/AE e Roberto Stuckert Filho/Ag. O Globo
SUBORNO E CAIXA DOIS
O ex-ministro José Dirceu, o petista-chefe da quadrilha do mensalão, e o senador Eduardo Azeredo, o tucano que testou o protótipo da fraude em Minas


O triunfo do cinismo pôs em marcha o declínio inexorável da boa prática política. No Congresso, liberou geral. A Câmara absolveu mensaleiros, cassou outros e alguns destes foram eleitos novamente. Numa prova do profundo abismo que separa a ética dos cidadãos da ética dos incomuns, o deputado José Genoíno, que era presidente do PT na época do mensalão, subiu à tribuna da Câmara na semana passada para discursar contra o projeto que proí-be a candidatura dos políticos ficha-suja (aqueles que têm condenação criminal). Disse Genoíno: "Hoje, você é culpado até que prove a sua inocência". Antes do ocaso da ética na política, um discurso como esse, concorde-se ou não com seu conteúdo, seria impensável. Há abundância de exemplos. No mesmo dia em que Genoí-no perorou na tribuna, a Câmara absolveu dois deputados que vendiam as passagens aéreas de sua cota. Essa ética não é uma abstração. Ela produz efeitos reais e perversos para o cidadão comum. Ainda na semana passada, os aposentados descobriram isso amargamente. O governo se pronunciou a favor do projeto que vincula o reajuste de aposentadorias e pensões ao salário mínimo. Lula incentivou o projeto, mas, como a nova lei traria prejuízos aos cofres públicos, mandou que a base do governo impedisse a aprovação - no que foi docemente obedecido. Jogou para a plateia (veja o quadro).

O principal método empregado por Lula para afirmar a ética dos incomuns é sua prolífica língua. Dia sim, outro também, o presidente arenga diretamente às massas, num diálogo sem intermediários que lembra o populismo de Getúlio Vargas. Suas mais recentes investidas deram-se contra a imprensa e o Tribunal de Contas da União. Incomodado com as críticas que recebe nos jornais, Lula afirmou que "o dever da imprensa é informar, não fiscalizar". Engano. O dever da imprensa, numa democracia liberal, é também o de fiscalizar o governo. Na mesma linha, o presidente criticou duramente as auditorias do TCU, que tem determinado a paralisação de obras do governo com evidências de irregularidades. As declarações sugerem que a ética de Lula costuma contrariar o princípio democrático da crítica. Na obra A Sociedade Aberta e Seus Inimigos, o pensador Karl Popper, um dos maiores teóricos da democracia, escreveu: "Os democratas que não veem a diferença entre uma crítica amigável e uma hostil estão imbuídos de espírito totalitário. O totalitarismo, sem dúvida, não pode considerar qualquer crítica como amigável, uma vez que qualquer crítica de uma autoridade deve desafiar o próprio princípio da autoridade".

Essa nova plataforma ética dos incomuns deve muito ao presidente Lula. Ainda no século XIX, a república brasileira assentou-se sobre o presidencialismo, uma forma de governo que favorece o personalismo dos governantes e a emergência de líderes carismáticos. A tradição autoritária da cultura brasileira conduziu ao modelo político atual, no qual o poder se concentra inteiramente nas mãos do presidente. Diz o filósofo Roberto Romano, da Universidade Estadual de Campinas: "Nessas condições, o líder se torna um messias, os políticos próximos a ele tendem a imitar seu comportamento. Assim, ele vira um mito. Qualquer crítica ao líder carismático, portanto, vira blasfêmia". A influência moral de Lula é tamanha que até a oposição mimetiza suas atitudes. Eduardo Azeredo, no decorrer do julgamento, disse que não sabia sobre o esquema - como o presidente fizera no escândalo do mensalão. Quando enfrentar seu julgamento por tentativa de homicídio, Francisca, a cidadã comum que envenenou seus filhos num acesso de loucura, não terá como alegar que não sabia. Ela poderá pegar até trinta anos de prisão. Seus filhos crescerão sem mãe. É assim no mundo das pessoas comuns.

Com reportagem de Otávio Cabral


Dólares, reais e uísque

Luludi/Ag. Luz
PORRE COM DINHEIRO ALHEIO
Poleto, o homem dos dólares de Cuba, é indenizado


Comissão de Anistia, órgão subordinado ao Ministério da Justiça, foi criada há oito anos para tentar reparar os abusos perpetrados durante os 21 anos do regime militar. Desde então, já concedeu cerca de 30 000 indenizações, a um custo que ultrapassa os 4 bilhões de reais. É justo compensar pessoas que perderam o emprego ou tiveram a vida devassada por perseguição política de um estado ditatorial. As concessões sem critério, porém, estão desvirtuando a nobreza do propósito inicial. Na mamata do que está sendo chamado de Bolsa Ditadura, pegaram carona "perseguidos" de todos os tipos. Na semana passada, mais uma figura curiosa embarcou no trem. O economista Vladimir Poleto - aquele que admitiu ter transportado 1,4 milhão de dólares de Cuba, em 2002, para robustecer o cofre da campanha do presidente Lula, e que, em seguida, tentou anistiar a própria confissão alegando estar embriagado - também ganhou direito ao seu quinhão. Ex-assessor do ex-ministro Antonio Palocci, o economista revelou que apanhou o dinheiro clandestino de um funcionário da Embaixada de Cuba em Brasília, acondicionou-o em caixas de uísque e rum e transportou-o num avião Seneca para São Paulo, onde funcionava o comitê financeiro da campanha.

A indenização a Poleto é uma das mais esdrúxulas já concedidas pelo governo. No início do regime militar, o economista tinha 8 anos de idade. No fim, estava com 29. De acordo com a ata do julgamento que lhe concedeu indenização, Poleto sofreu perseguição no período de 7 de dezembro de 1984 a 14 de janeiro de 1985. No calendário do governo, 39 dias de perseguição viraram um ano. Mas que tipo de perseguição, afinal, teria sofrido Poleto? Ele argumentou que foi "obrigado" a pedir demissão do Banco do Brasil no fim de 1986, quando os generais já estavam de pijama havia mais de um ano, por ter liderado uma greve. Queria, por isso, receber uma pensão mensal vitalícia de 2 600 reais. A Comissão de Anistia entendeu que Poleto foi perseguido com base em um documento no qual é apontado como "concitador de movimento subversivo", mas negou-lhe o plano de aposentadoria. O relator do caso, cujo voto favorável à indenização foi acompanhado pelos de outros dois conselheiros, é Egmar Oliveira. Como Poleto, ele é ex-sindicalista. Como Poleto, ele é amigo do ex-caixa de campanha do PT Delúbio Soares. A indenização concedida ao economista com o dinheiro do contribuinte é de 13 950 reais - longe do que Poleto pretendia, mas suficiente para comprar ao menos 200 garrafas do seu uísque preferido.

Alexandre Oltramari

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http://veja.abril.com.br/111109/etica-dos-incomuns-p-088.shtml

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ENADE 2009: QUESTÕES E RESPOSTAS (GABARITO)

Confira o gabarito do Enade 2009

Jornal de Brasília - 09/11/2009

Mesmo depois de um dia de confusão com as provas do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) divulgou o gabarito das provas. Foram avaliadas 15 áreas de graduação e sete cursos superiores tecnológicos.


A prova era composta de 40 questões: 10 de formação geral e 30 de formação específica da área. As duas partes têm questões discursivas e de múltipla escolha. A parte de formação geral corresponde a 25% da nota e a parte específica, a 75%.

O exame é obrigatório. Quem não fez, não poderá reber o diploma.

Confira aqui os gabaritos do Enade.

Da redação do clicabrasilia.com.br, com agências