Antônio Cruz/ABr

Dono de português esmerado, Michel Temer não é dado a declarações temerárias. Traz no lugar da língua uma fita métrica. Mede cada palmo de sua prosa. Eleito vice-presidente da República, injetou no discurso vocábulos que lhe deram a aparência de um político no condicional.

Em entrevista ao blog, soou peremptório apenas em relação a um ponto: empossado, vai “cumprir a missão constitucional”. Afora a certeza de substituir Dilma Rousseff “nas eventuais ausências temporárias” todo o resto são conjunções subordinativas que ligam Temer uma condição.

O novo vice condiciona os futuros gestos à vontade da titular. “Tudo dependerá muito da presidente”, disse Temer a certa altura. “Vou aguardar sempre um chamamento”, enfatizou noutro ponto. Apenas “se vier a ser acionado” por Dilma terá “uma presença política” no governo.

Articulador? “Vou depender muito das solicitações que a presidente me fizer”. Está no gabinete de transição, segundo disse, porque Dilma o acionou -como vice-presidente, não como mandachuva do PMDB.

Na sucessão de 2002, Temer acomodara o seu PMDB na coligação de José Serra, contra Lula. Fizera da deputada Rita Camata a vice do tucano. Perdeu. Decorridos oito anos, Temer ultrapassou as resistências de Lula e tornou-se vice de outra saia. Com Dilma, triunfou. Contra Serra.

Medido pelas palavras, será um vice mais discreto do que o outro lado da Lua. Pelos próximos quatro anos aguardará os “chamamentos” –da presidente ou do destino. Se não vierem, talvez seja compelido a aposentar a trena que esconde sob o céu da boca. Vai abaixo a entrevista:

- O Brasil já teve vices dados à crítica, como Itamar Franco, e vices como José Alencar, colaborativos. Que estilo terá o novo vice-presidente? Eu vou cumprir a missão constitucional. A Constituição diz que cabe ao vice-presidente substituir a presidente nas suas eventuais ausências temporárias.

- Imagina que pode ter algum outro papel? Tudo dependerá muito da presidente. Ela pode eventualmente me chamar, como chamou agora, nessa fase de transição de um governo para o outro. Então, dependerá muito do que ela demande do vice-presidente.

- Imagina que Dilma Rousseff o acionará? Como minha relação com ela é muito boa, é possível que chame. Mas eu vou aguardar sempre um chamamento, como aguardei agora no caso da transição.

- O fato de presidir o PMDB pode levá-lo a ter um papel político mais ativo? Minha posição é mais política do que administrativa. Meu histórico, sem embargo de ter ocupado cargos executivos no Estado de São Paulo, é muito ligado à atividade política. Então, creio que minha presença, se vier a ser acionado por ela, será uma presença política.

- Pode auxiliar na articulação política do governo? Vou depender muito das solicitações que a presidente me fizer.

- Há diferenças entre o PMDB sob Lula e o PMDB da gestão Dilma? Teremos agora uma participação de absoluta colaboração. Pelo seguinte: o PMDB estará mais no novo governo do que esteve na presente gestão, já que tem a vice-presidência. Será uma relação de colaboração muito efetiva, sem nenhum titubeio.

- Depois de tomar café com a presidente, nesta quarta, o sr. disse que a composição do novo ministério será uma sequência do atual. Significa dizer que o PMDB terá as mesmas seis pastas que tem hoje? Num regime presidencialista, tudo depende da vontade da presidente. Mas, na conversa que mantive com o [José Eduardo] Dutra, disse a ele que o ideal, para não gerar atritos, seria manter o quadro atual. Isso permitiria uma certa tranquilidade nessa transição. Foi uma consideração que eu fiz e não sei se será levada adiante ou não.

- O presidente do PT fez alguma consideração em contrário? Em sentido contrário, não. Ele achou que seria razoável, mas que nós todos precisávamos meditar sobre isso. Trata-se de algo coletivo e, evidentemente, terá de ser levado depois à consideração da presidente.

- Nesta fase, sua participação na coordenação de transição pressupõe a participação nas conversas com dirigentes de outros partidos? Pressupõe uma conversa coletiva. Na verdade, estou na transição como vice-presidente, ajudando em toda essa articulação, para que não haja nenhum trauma político.

- No café da manhã com a presidente já se esboçou o modelo de funcionamento da vice-presidência? Não. Ela apenas me pediu que colaborasse muito com ela. E pediu a minha atenção, nesta fase, como vice-presidente. Eu, claro, concordei imediatamente.

- Que relação imagina que o novo governo terá com a oposição? No discurso da presidente, feito depois da eleição, ela fez considerações a respeito disso. Considerei extramamente apropriadas as palavras dela. Creio que a oposição poderá ter uma função também colaboradora. Não significa que deixará a sua função fiscalizadora. Creio que não será uma oposição radical, mas de compreensão quando os atos do governo forem benéficos.

- O sr. deixará a presidência do PMDB? Não sou obrigado a deixar. Naturalmente, vou ficar até janeiro e, depois, vou examinar. Legalmente, não sou obrigado a deixar a presidência do partido.

- Seu mandato no comando do PMDB termina quando? Em março de 2012.

- Cogita, então, permanecer? Pode ser que sim. Vai depender dessa avaliação que farei em janeiro.

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