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domingo, março 11, 2007

AMAZÔNIA: MEIO AMBIENTE vs. MEIOS ESCUSOS

UM BISPO MARCADO PARA MORRER

A Coordenação da Campanha da Fraternidade 2007, juntamente com a Comissão de Anúncio da Arquidiocese de Maringá promoveu no dia 3 de março p.p. a apresentação do Bispo da prelazia(*) do Xingu (PA), Dom Erwin Kräutler, que proferiu palestra no auditório Dona Guilhermina. Abaixo reproduzimos matéria publicada no jornal da Arquidiose de Maringá. (Fonte: Beatriz Camargo, O Xingu de Dom Erwin, Repórter Brasil, 18/01/2007, citado por Jornal Mensal da Arquidiose de Maringá, Ano IX, nº 98, março/2007, p. 11).
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Há mais de 40 anos na região, Kräutler se destaca por seu trabalho em defesa da população e do meio ambiente amazônico, dedicação que traz reconhecimento e ameaças de morte. Nascido na Áustria, chegou ao Pará pelo tio, missionário na região. Em 1981, já naturalizado brasileiro, foi ordenado bispo, em substituição ao tio, Dom Eurico Kräutler. Sua prelazia abrange municípios da fronteira agrícola oriental, como Altamira, Anapu, São Félix do Xingu, Tucumã e Ourilândia do Norte, entre outros.
Por defender o meio ambiente e lutar ao lado dos índios, trabalhadores rurais e comunicades extrativistas, há anos vem recebendo ameaças de morte. A última veio por telefone: um aviso de que morreria no dia 29 de dezembro de 2006, ao comparecer à festa de Gurupá (PA) no arquipélago de Marajó. Apesar do risco, escoltado por quatro policiais militares, cumpriu o compromisso anual de comparecer às comemerações de São Benedito, padroeiro da cidade. “Há muito tempo recebo ameaças, más é a primeira vez que são feitas diretamente a mim”, conta. A Polícia Federal de Altamira investiga.
As intimidações vinham de frases como: “O bispo de Xingu deve morrer”. Carta anônima que circulou em Altamira (PA), em outubro passado, dizia que Kräutler pretendia ser “um mártir” e só queria chamar a atenção da mídia. Tentava ainda mobilizar a população para pedir a transferência do religioso.
Três motivos principais levam madeireiros, grileiros, escravagistas e poderosos da região a hostilizar o bispo: a insistência no aprofundamento das investigações do assassinato da missionária Doroty Stang; a campanha contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu, e a denúncia contra a rede de exploração sexual de meninas no município de Altamira (PA). Este último, segundo Kräutler, representou a “gota d´água”.
JUSTIÇA. O prelado cita o envolvimento do poder local com atividades ilícitas (trabalho escravo, exploração sexual de adolescentes, desmatamento e grilagem de terras). “Só quebramos a corrente da impunidade com justiça”, diz. Entretanto, a justiça estadual, segundo ele, é debilitada e incompetente. Como exemplo, ele aponta o médico e ex-vereador Renato Martins envolvido na rede de exploração de adolescentes em Altamira (PA). “Ficou foragido e, quando resolveu se entregar à polícia, recebeu como ´prêmio´ a liberdade por ter ´colaborado com a justiça´”, revolta-se. Há ainda o assassinato da missionária Doroty, que atuava em Anapu, na prelazia. Quase dois anos depois, não se conhecem todas as pessoas envolvidas. “Sabemos que hã um consórcio de fazendeiros que programou a morte da irmã. E essas pessoas estão soltas. Ela foi realmente uma mártir, que dedicou sua vida à região e acabou pagando com a vida, literalmente, para que o mundo olhasse o Xingu como um ambiente a ser preservado”.
Por outro lado, cresce cada vez mais o reconhecimento pelo seu trabalho em defesa das populações locais e do meio ambiente. Em novembro de 2006, Kräutler foi eleito presidente do CIMI – Conselho Indigenista Missionário. Em 22 de dezembro, recebeu da OAB do Pará o prêmio José Carlos Castro de Direitos Humanos, por sua luta em defesa da vida na Amazônia. A mesma homenagem tinha sido concedida a irmã Dorothy Stang, três meses antes de seu assassinato. Foi ainda homenageado com diversos prêmios no exterior, cidadania emérita em muitas cidades do Pará e três doutorados honoríficos por seu trabalho em defesa dos direitos humanos. “Também tenho recebido muitas manifestações da população, que é muito carinhosa. Na rua, por e-mail e pelo telefone, as pessoas dizem que me apóiam e estão comigo”, lembra.
DESAFIOS. Para ele, a terra e o meio ambiente são os maiores problemas na região atualmente. “O Xingu é a última fronteira ao avanço da devastação provocada por madeireiras, grileiros e pecuaristas na Amazônia”. Além do prejuízo à natureza, o desmatamento produz outro mal: o trabalho escravo. O último relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre o tema no Brasil mostra que o a concentração das propriedades rurais com trabalho escravo está exatamente na faixa do arco do desflorestamento. São Félix do Xingu (PA) é campeã de desmatamento e de trabalho escravo. Nessa região, um dos grandes problemas enfrentados pelos auditores fiscais tem sido o deslocamento até o local das denúncias. Muitas fazendas ficam distantes do centro das cidades e têm acesso difícil, por estradas de terra. Na época das chuvas, vias se tornam intransitáveis.
O projeto de construção de uma usina hidrelétrica de Belo Monte vem se juntar aos problemas tradicionais da Amazônia. A crítica do bispo é a mesma de organizações, movimentos locais e especialistas em energia: a total falta de transparência na divulgação de informações por parte da Eletronorte, responsável pela obra. “Não se fala nas conseqüências para a população local de indígenas e ribeirinhos. A idéia de que apenas uma barragem no Xingu é suficiente para gerar o potencial que eles querem atingir é mentirosa”, denuncia o bispo. Frisa que os defensores da hidrelétrica – governo, empresários e comerciantes locais – falam apenas dos benefícios futuros, mas ainda não houve um debate franco sobre as possibilidades de o Rio Xingu abrigar o projeto, bem como sobre os prejuízos que o alagamento trará para as comunidades. “Não estou sozinho, não é o bispo que está contra a obra. Diversas organizações e movimentos estão brigando para que a hidrelétrica não seja construída”, reforça Kräutler.
ESPERANÇA. O bispo deposita grande expectativa na gestão da governadora Ana Júlia Carepa. “Conheço bem Ana Júlia, sou próximo ela e conheço seu trabalho. Como senadora, sempre foi muito atenciosa e sempre levou adiante as nossas reivindicações, inclusive leu no plenário minhas cartas. Espero que continue com esse pique, essa disponibilidade”. Dom Erwin deseja sobretudo que Ana Júlia traga melhorias para o povo de Xingu. E que proteja a natureza, “mãe de todos nós”.
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N.B.: (*) Prelazia: S. f. 1. Cargo, dignidade ou jurisdição de prelado; prelatura, preladia. Prelado: S. m. Ecles. 1. Título honorífico de dignitário eclesiástico. Eclesiástico: S. m. 3. Membro do clero (1); sacerdote, clérigo, padre. [Dicionário Aurélio, Século XXI].

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